Complexo de preparado de peixe romano no Hotel do Governador da Torre de Belém, na Rua Bartolomeu Dias

Em Belém, no nº 117 da Rua Bartolomeu Dias, as obras na Casa do Governador da Torre de Belém para criar o Hotel NAU Palácio do Governador, conduziram à descoberta de uma grande unidade de preparação de conservas de peixe romana, provavelmente dos séculos I d.C. a V d.C.

O Hotel NAU – Palácio do Governador, unidade hoteleira de cinco estrelas, apresenta na sua entrada principal, ao nível do pavimento, um importante conjunto de cetárias de dimensões diversas. Aqui funcionou uma unidade romana de transformação de pescado, de grandes dimensões, presumindo-se que o restante complexo fabril permaneça oculto no subsolo. Supõe-se que na época da sua laboração produziria o suficiente para encher mais de 15 mil ânforas, que dali partiriam rumo aos mais diversos pontos da Europa.

Este complexo com uma área total de 1525,08 m2, numa área periférica à cidade de Olisipo, terá sido edificado em uma única fase de construção, numa planta retangular, com um pátio central em torno do qual se organizavam os tanques para a fermentação dos preparados de peixes (as cetárias, tendo sido identificadas 32 cetárias, mas seriam muitas mais) e entre o pátio e a fiada principal de tanques havia um corredor de circulação dos trabalhadores, no qual se identificaram tanques de menores dimensões, provavelmente usados  para armazenamento de alguns dos ingredientes principais, bem como estruturas circulares relacionadas com a limpeza da área de produção. Sabe-se também que a petinga representava 98% dos peixes usados neste complexo conserveiro.

A exploração dos recursos marinhos, a produção de preparados de peixe e sua exportação, seria uma das mais relevantes atividades económicas de Olisipo. Os preparados de peixe eram não só muito apreciados como fundamentais na dieta alimentar, particularmente para os contingentes militares espalhados pelo Império Romano.

A identificação do sítio resultou de trabalhos arqueológicos decorrentes da construção do hotel e em consequência da Casa do Governador da Torre de Belém ser um imóvel em vias de classificação, situado na Zona Especial de Proteção da Torre de Belém e do Mosteiro dos Jerónimos, decorrendo desse estatuto a necessidade de se realizarem sondagens de diagnóstico para determinar o potencial arqueológico da área.  Este edifício que servia de residência ao governador da Torre de Belém – quer fosse residência ou apenas residência-oficial – terá sido mandado construir em 1519 por D. Gaspar de Paiva, o primeiro capitão-governador da Torre de Belém, em terrenos aforados aos frades jerónimos e a sua construção aproveitou as estruturas do complexo conserveiro como alicerces do palácio.

(Foto: ERA no artigo de Carlos Fabião, Iola Filipe, Mª Isabel dias, Sónia Gabriel, Mª Manuela Coelho (2008) «Projecto A indústria de recursos haliêuticos no período romano: a fábrica da Casa do Governador da Torres de Belém, o estuário do Tejo e a fachada atlântica» In Apontamentos de Arqueologia e Património 1/2008)

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