Toponomenclatura da água: os Cais, os Boqueirões e o Regueirão de Lisboa

Cais da Lingueta – Freguesia de Santa Maria Maior
(Foto: Artur Matos)

Lisboa, como cidade edificada frente ao Tejo, tem toponomenclatura ligada ao rio nas suas freguesias ribeirinhas: os Cais, os Boqueirões e os Regueirões.

A cidade tem ainda 6 Cais. Na freguesia da Misericórdia, temos o Cais do Sodré, sobre o qual os olisipógrafos divergem quanto à origem. Júlio de Castilho aponta uma família Sodré Pereira Tibau, da qual dois membros, António e Duarte, foram proprietários de prédios naquela zona. Silva Túlio defende ser de Vicente Sodré, descendente do inglês Fradique Sodré, que ali edificou grandes imóveis e ajudou a fazer a obra do cais, opinião que Gomes de Brito também segue. E Norberto de Araújo quer que António, Duarte e Vicente sejam descendentes de Fradique Sodré, um inglês que passara em Portugal no tempo de D. Afonso V.

Freguesia de Santa Maria Maior – Placa Tipo I
(Foto: Artur Matos)

Cais da Lingueta, na freguesia de Santa Maria Maior, liga a Rua do Jardim do Tabaco à Avenida Infante Dom Henrique e fixa na memória de Lisboa o antigo Cais do tempo em que o mar aqui chegava. Refira-se ainda que lingueta é o nome dado à ladeira ou rampa ao pé da qual se arrima a embarcação para receber ou despejar gente nos embarcadouros. Esta artéria teve vários topónimos e até diferentes toponomenclaturas: Boqueirão da Lingueta num parecer municipal sobre a remoção de obstáculos que pudessem impedir a Procissão do Triunfo de 6 de abril de 1875, Travessa do Cais da Lingueta numa planta de Augusto César dos Santos referente à zona do Largo do Chafariz de Dentro datada de 1894 e, nesse mesmo ano, como Rua Cais da Lingueta num documento da autoria do mesmo funcionário municipal para implantação de uma barraca de venda de refrescos. Com a criação da Comissão Municipal de Toponímia em 1943 que reviu todas as denominações toponímicas de Lisboa foi dado parecer favorável à fixação de Cais da Lingueta, na reunião de 17 de outubro de 1944.

Os outros quatro estão no Parque das Nações, herdados da Expo 98 e oficializados pelo Edital de 16/09/2009: o Cais das Naus  junto à Praça do Tejo, a evocar a denominação genérica dada a navios de grande porte, usados em viagens de grande percurso; o Cais do Olival junto ao Passeio dos Heróis do Mar; o Cais dos Argonautas, que vai do Passeio de Ulisses ao Cais Português e refere os tripulantes da nau Argo  que na mitologia grega foram até à Cólquida em busca do Velo de Ouro; e o Cais Português  que é o cais da doca que abre entre o Passeio das Tágides e o Passeio de Neptuno.

Lisboa comporta ainda mais 5 Ruas que fixaram Cais nos seus topónimos : a Rua do Cais da Alfândega Velha (Belém), a Rua do Cais de Alcântara ( Estrela ), a Rua do Cais do Tojo ( Estrela e Misericórdia), a Rua do Cais de Santarém ( Santa Maria Maior ) e a Rua do Cais das Naus ( Parque das Nações ).

Boqueirão da Ponta da Lama – Freguesia de Santa Maria Maior
(Foto: Artur Matos)

Um Boqueirão é uma rua virada ao mar ou ao rio e em Lisboa ainda permanecem 4 Boqueirões.

Na freguesia de Santa Maria Maior são dois: o Boqueirão da Ponte da Lama a ligar Rua do Jardim do Tabaco à Avenida Infante Dom Henrique e o Boqueirão da Praia da Galé que também une a Rua do Jardim do Tabaco à Avenida do Infante D. Henriques, guardando a memória da praia que então ali se faria no Tejo. Os outros dois pertencem à freguesia da Misericórdia: o Boqueirão do Duro que liga a Avenida 24 de Julho ao Largo do Conde Barão e que segundo Pastor de Macedo «Estende-se no chão vizinho ao antigo Cais do Tojo e no sítio da velha marinha da Boa Vista. Segundo verificámos em vários processos de emprazamentos, da freguesia de Santos, o boqueirão do Duro só aparece com este nome depois do incêncio que houve no Cais do Tojo em 1821»; e o Boqueirão dos Ferreiros, que liga a Avenida 24 de Julho à Rua da Boavista.

E o único Regueirão lisboeta é o dos Anjos, numa freguesia não ribeirinha, a de Arroios. Contudo, a ligação faz todo o sentido ao verificarmos que Regueirão é o aumentativo de regueiro ou regueira, logo é um rego grande ou um regato maior e Arroio significa uma pequena corrente de água, um regato, pelo que Arroios é a freguesia dos regatos. Segundo Norberto de Araújo, o Regueirão dos Anjos que liga a Avenida Almirante Reis à Rua Frei Francisco Foreiro, é anterior à própria Rua dos Anjos e «foi vale natural, onde depois de correr água, nos séculos velhos, correu o trânsito». Refira-se finalmente que nos anos oitenta, a escassez de arruamentos fez com se usasse o troço superior do Regueirão dos Anjos para homenagear uma personalidade de apelido Ribeiro: a Rua Francisco Ribeiro (Ribeirinho), atribuída pelo Edital de 24 de abril de 1986.

Freguesia de Arroios – Placa Tipo II
(Foto: Mário Marzagão)