A Rua Augusta e a Praça do Comércio

A Rua Augusta e a Praça do Comércio antes de 1873
(Foto: © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

A Rua da Augusta Figura do Rei leva-nos a direito para a estátua do monarca que homenageia: D. José I, o soberano que inaugurou em Lisboa a prática da atribuição de nomes de ruas por decreto.

É dele a Portaria de 5 de novembro de 1760 no qual se estabelece a denominação dos arruamentos da Baixa lisboeta reconstruída sob o plano de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel«entre as Praças do Comercio e a do Rocîo», ao mesmo tempo que se regulamenta a distribuição dos ofícios e ramos do comércio pelas diferentes 14 artérias: «Rua Nova d’El Rey  [hoje, Rua do Comércio], Rua Augusta, Rua Áurea, Rua Bella da Rainha  [hoje, Rua da Prata], Rua Nova da Princesa  [hoje Rua dos Fanqueiros], Rua dos Douradores, Rua dos Correeiros, Rua dos Sapateiros, Rua de S. Julião, Rua da Conceição, Rua de S. Nicolau, Rua da Victoria, Rua da Assumpção e Rua de Santa Justa».

Na Rua Augusta deviam alojar-se os mercadores da seda e da lã e, quinze anos depois, a 6 de Junho de 1775 foi colocada no enfiamento da artéria, na Praça do Comércio, a estátua equestre de D. José, feita por Machado de Castro. Quase um século mais tarde, em 1873, foi rematada a Rua Augusta com um Arco Triunfal, da autoria de Veríssimo José da Costa.

Esta rua, que faz a ligação entre as duas praças principais pré-terramoto, o Terreiro do Paço e o Rossio, ambas mantidas e realinhadas no plano de reconstrução da baixa da cidade, será o eixo central da malha urbana da Baixa que hierarquiza os arruamentos através da sua largura e tipologia dos edifícios e cujo rigor geométrico remete para a planificação e organização de estruturas militares. O planeamento, a racionalidade e o pragmatismo, valores intrínsecos ao Iluminismo, estão assim presentes como alicerces fundamentais da nova imagem que se pretendia para uma das mais movimentadas capitais europeias.

A visão perspética a partir do Rossio que conduz a uma Praça, a do Comércio, é fortemente cenográfica e ao gosto oitocentista que através desta tipologia definia espaços amplos de representação simbólica do poder. Classificada como Monumento Nacional em 1910 (Decreto n.º 136, de 23-06-1910), a nova Praça é considerada uma obra de referência do séc. XVIII na genealogia das suas congéneres europeias tendo um aspeto inovador: uma das suas faces é total e simbolicamente aberta sobre o rio Tejo.

O programa da Praça do Comércio, tipologicamente associado às “praças reais” francesas e à semelhança destas, previa desde o início a colocação de uma estátua do rei no centro geométrico de um triângulo equilátero no alinhamento da então Rua da Augusta Figura do Rei e que viria a ser a primeira estátua equestre realizada em Portugal. Cerca de 100 anos depois da sua inauguração, cujos festejos se adequaram à solenidade do momento, em 1873 foi terminado o Arco do Triunfo colocado a norte da Praça cuja construção estava prevista desde 1759 nos planos de reconstrução da baixa com desenho de Eugénio dos Santos e que enquadra cenograficamente a estátua. Ficava assim terminado um percurso de afirmação de poder expresso em diferentes momentos: a Rua Augusta e o Arco, a Praça do Comércio e Estátua do monarca D. José I.

© CML | DPC | NT | 2019

Dom João V

Busto de Dom João V no Palácio Fronteira
(Foto: Joshua Benoliel © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O Edital de 22 de junho de 1948 veio confirmar a proposta da Comissão de Toponímia datada de 8 de junho do mesmo ano, que atribuía os topónimos aos novos arruamentos à Rua das Amoreiras, homenagem que incidiu nas seguintes personalidades: Dom João V (Rua A), Custódio Vieira (Rua B), Dom Tomás de Melo Breyner (Rua C) e Cláudio Gorgel do Amaral (Rua D).

Dom João V (Lisboa, 22 de outubro de 1689-Lisboa, 31 de julho de 1750), que recebeu o cognome de «O Magnânimo», foi o vigésimo quarto rei de Portugal e o seu reinado, de 1707 a 1750, foi um dos mais longos da História portuguesa.

Monarca absolutista e diplomata hábil, D. João V conseguiu impor no plano internacional a soberania de Portugal sobre o Brasil, garantindo deste modo o fluxo contínuo do ouro brasileiro para a metrópole que utilizou para financiar as grandes obras do seu reinado. É de destacar a construção do majestoso Palácio-Convento de Mafra, edificado para agradecer o nascimento do seu primeiro filho varão. Iniciado em 1717, deu origem à denominada escola de Mafra, ao ser referência e inspiração para outros edifícios.

O monarca marcou Lisboa com a construção do imponente Aqueduto das Águas Livres, obra que decorreu entre 1731 e 1799 e assegurou o abastecimento de água à cidade. A ele se deveu também a construção do Convento das Necessidades que integrava uma sumptuosa igreja, o edifício conventual, depois ocupado pela Ordem do Oratório, e um palácio real, obras realizadas entre 1743 e 1752. De traçado barroco, denota a influência de modelos italianos que então circulavam na Europa e que caracterizam a produção arquitetónica de iniciativa régia deste período.

Outra obra relevante, transversal a todo o seu reinado, foi a Basílica Patriarcal destruída pelo Terramoto de 1755 e instalada em 1716 na já existente Capela Real do Paço Real da Ribeira, cuja transformação e ampliação o monarca acompanhou de perto até à sua morte dado o seu valor simbólico enquanto afirmação do poder régia quer interna quer externamente.

João V também marcou culturalmente a capital. Por influência dos ideais iluministas, à semelhança do que ocorria na Europa também em Lisboa foram criadas por iniciativa régia algumas Academias estimulando a curiosidade científica emergente entre académicos e eruditos. Exemplo disso é a Academia Real da História Portuguesa que fundou por decreto de 8 de dezembro de 1720 e que se extinguiu em 1776. A Academia, para além da sua atividade cultural relevante e das suas publicações e tertúlias, tinha também por objetivo o reescrever a história de Portugal e das suas possessões ultramarinas agora refletida através do rigor da razão das Luzes. O monarca introduziu ainda, em 1731, a ópera italiana. Patrocinou trabalhos em talha, azulejo e ourivesaria, e trouxe vários pintores e escultores de Itália para trabalhar em Lisboa e Mafra.

Todas estas iniciativas beneficiaram do florescimento económico que ocorreu em Portugal no século XVIII que levaram a que muitos estrangeiros se fixassem ou passassem pelo país, nomeadamente ingleses, franceses, italianos, espanhóis e alemães. A magnanimidade de D. João V e o seu manifesto interesse pelas belas artes (pintura, escultura, arquitetura, música) e pela história da cultura permitiram a introdução dos ideais iluministas no país que influenciaram e incrementaram o desenvolvimento de estudos com base científica, como a cartografia ou com base técnica, como a engenharia ou, ainda, com base humanista, como o direito.

© CML | DPC | NT | 2019

Da Travessa do Pintor à Rua do Hospital de Dona Estefânia de 1871

Planta de 1879, do Engº Ressano Garcia, com a Rua do Hospital de Dona Estefânia
(Imagem: © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

A  edilidade lisboeta após proceder a melhoramentos na Travessa do Pintor, que a levaram a considerar essa «uma das melhores servidões de Lisboa», solicitou ao Governo Civil de Lisboa que lhe alterasse a denominação para Rua do Hospital de Dona Estefânia, o que sucedeu pelo Edital do Governo Civil de 25 de novembro de 1871, considerando a proximidade ao primeiro Hospital construído de raiz em Lisboa, especificamente para esse fim.

Em memória da rainha Dona Estefânia o rei Dom Pedro V iniciou a construção do Hospital da Bemposta em 1860 mas como faleceu no ano seguinte foi o seu irmão, o rei Dom Luís I, que assegurou a continuidade da obra e a inauguração do Hospital a 17 de julho de 1877, dia da morte de Dona Estefânia, vítima de angina diftérica. Este Hospital foi erguido na quinta do paço real da Bemposta, chamada Quinta Velha, então nos arredores da cidade.

A rainha Estefânia Frederica Guilhermina Antónia (Alemanha/1837 – 1859/Lisboa), que se casara com D. Pedro V em 1858, desejou muito fazer erguer um hospital para crianças, após ter ficado impressionada numa visita ao Hospital de São José, num período de epidemias de cólera e febre amarela, com a junção de adultos e crianças nas mesmas enfermarias. Dona Estefânia ofereceu o seu dote de casamento para que fosse criada uma enfermaria apenas pediátrica. O rei português pediu ajuda a diversas casas reais europeias  para cumprir esse desejo de criar em Lisboa um hospital pediátrico moderno e o traçado escolhido foi o desenhado por Humbert, arquiteto da casa real inglesa, numa decisão da comissão a que o rei presidia e constituíra com Bernardino António Gomes (médico real, lente da Escola Médico-Cirúrgica e presidente da Sociedade de Ciências Médicas), os médicos Barral, Kessler e Simas, o Conde da Ponte ( vedor da casa real portuguesa) e o militar e matemático Filipe Folque .

Em 1879, dois anos após a inauguração do Hospital de Dona Estefânia, a Câmara Municipal de Lisboa presidida por Rosa Araújo entendeu que a Rua do Hospital de Dona Estefânia com todo o seu prolongamento até às Portas da Cidade seria um único arruamento com o topónimo Rua de Dona Estefânia, conforme Edital municipal de 22 de agosto de 1879.

Mais tarde, também em Arroios,  por proximidade à Rua, foi atribuído o Largo de Dona Estefânia, através do Edital municipal de 19 de abril de 1893.

O Hospital de Dona Estefânia
(Foto: Ferreira da Cunha, sem data © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

© CML | DPC | NT | 2019

A Alameda do primeiro rei português, Dom Afonso Henriques e o 1º dia das Festas de Lisboa’19

Freguesias da Penha de França, de Arroios e, do Areeiro

Nos 120 metros de largura e cerca de 640 metros de comprimento da Alameda Dom Afonso Henriques vai decorrer hoje, a partir das 19:30, o espetáculo de abertura das Festas de Lisboa deste ano, com uma travessia na corda bamba, a 30 metros de altura: o Linhas Voadoras – Abertura Festas de Lisboa’19.

Esta ampla Alameda que homenageia o 1º Rei de Portugal, Afonso Henriques (Guimarães/25.06.1109 ou Viseu/05.08.1111-06.12.1185/Coimbra), já constava de um plano de urbanização aprovado em sessão de câmara de 7 de abril de 1928 mas só passou a topónimo pelo Edital municipal de 31 de março de 1932.

Pelo mesmo Edital e na mesma zona foi atribuída a Avenida Dom João I (na Avenida nº 21), a homenagear outro monarca, o primeiro rei escolhido pelo povo de Lisboa, no decorrer da crise de 1383-1385. Contudo, o Edital municipal de 29 de julho de 1948 transformou-a na que hoje conhecemos como Avenida Marconi, para perpetuar o Nobel da Física de 1909 e criador da Telegrafia Sem Fios, a TSF. Ainda no Edital de 1932 foram dados diversos topónimos de atores que ainda hoje lá encontramos – a  Rua Actor Isidoro (Rua nº 6-A), a Rua Lucinda do Carmo (Rua nº 10) e a Rua Actriz Virgínia (Rua nº 11)- , bem como a Rua Actor Epifânio (Rua nº 1) que nunca saiu da planta de papel e nunca foi construída, tal como aconteceu com a Rua Rui Chianca (Rua nº 22), que perpetuava um popular escritor falecido no ano anterior, em 1931.

A Alameda Dom Afonso Henriques está desde 1936 encimada pelos edifícios do Instituto Superior Técnico, da autoria de Pardal Monteiro. Depois desce num vale e ao subir novamente fecha com a Fonte Luminosa, uma das obras monumentais do Estado Novo, do traço dos irmãos arquitetos Carlos e Guilherme Rebelo de Andrade, concebida em 1938 e inaugurada em maio de 1948, ao mesmo tempo fornece um miradouro sobre a obra realizada. Entre os anos de 1936 e 1946, foram sendo erguidos ao longo desta Alameda  um conjunto de blocos de habitação.

Afonso Henriques (Guimarães/25.06.1109 ou Viseu/05.08.1111-06.12.1185/Coimbra), filho do Conde Dom Henrique e de Dona Teresa de Leão, que ficou na história portuguesa com o cognome de «O Conquistador», foi o primeiro rei de Portugal. Em 1139, após a vitória na batalha de Ourique proclamou-se Rei de Portugal, apoiado pelas suas tropas. Em 1143, o Tratado de Zamora reconhece a independência do território e Afonso Henriques passa a usar o título de Rei e declara vassalagem à Santa Sé, o que vem a ser confirmado em 1179 por bula papal que reconhece o reino de Portugal.

Freguesias da Penha de França, de Arroios e, do Areeiro

 

© CML | DPC | NT | 2019

O 25 de Abril na Praça Dom Pedro IV

Às 12H00, uma companhia do RI 1, comandada pelo capitão Fernandes, tentou barrar o caminho para o Quartel do Carmo, à coluna da EPC, comandada pelo capitão Maia, mas este convenceu-os a aderirem ao Movimento.

A Praça Dom Pedro IV, vulgarmente conhecida como Rossio, cerca do meio-dia do dia 25 de abril de 1974 foi palco do encontro da companhia do Regimento de Infantaria 1 da Amadora, comandada pelo capitão Fernandes, ali estacionada, com a coluna da EPC – Escola Prática de Cavalaria, comandada pelo capitão Maia, para chegar ao Largo do Carmo. O RI1  tentou barrar a passagem à EPC mas após um curto diálogo entre os comandante das tropas, todos os militares passaram para o lado do MFA e as tropas do RI 1 vão seguir à retaguarda da coluna da EPC.

A coluna de Salgueiro Maia saíra da Praça do Comércio pela Rua Augusta, Praça Dom Pedro IV  e Rua do Carmo, para atingir o Largo do Carmo, recebendo  durante todo o trajeto o apoio e aclamação das muitas centenas de pessoas que na Baixa de Lisboa acompanhavam as movimentações militares. Desobedecendo às recomendações do MFA para permanecer em casa, a população saiu à rua em apoio aos militares revoltosos que vitoriava.

Ao longo de todo o dia 25 de abril de 1974, a placa central da Praça Dom Pedro IV foi local de aglomeração de populares e nos dias seguintes local de manifestações.

(Foto: Fernando Baião, O Século Ilustrado, 27 de abril de 1974)

© CML | DPC | NT e GEO | 2019

A Travessa dos Fornos de 1917

Freguesia da Ajuda
(Foto: Google Maps editada pelo NT do DPC)

A Travessa dos Fornos, na Ajuda, foi atribuída pelo último Edital de toponímia de 1917, que explicitamente refere que este era o «nome porque vulgarmente éra conhecida».

Isto quer dizer que o arruamento que hoje vemos a ligar a Rua do Cruzeiro com a Rua Dom João de Castro, em resultado da deliberação da Comissão Executiva da CML de 15 de novembro de 1917 e consequente Edital de 14 de dezembro desse ano, foi uma oficialização do seu nome: Travessa dos Fornos.

Falta indagar porque seria assim conhecida como Travessa dos Fornos. E parece lícito supor que a denominação advém da proximidade desta artéria à Estrada dos Fornos d’El-Rei ou Estrada dos Fornos d’El-Rei no Rio Seco. A Estrada dos Fornos d’El-Rei, aparece numa planta de 1890, anexa a um ofício do engenheiro diretor-geral da CML, no  sítio do Rio Seco, assim como surge  da mesma forma designada na planta da cidade de 1896. Mais tarde, na planta de 1911, de Silva Pinto, a sua denominação passa a ser Estrada do Rio Seco e , ainda nesse ano, pelo Edital municipal de 7 de agosto de 1911 é atribuída a Rua Dom João de Castro como topónimo desta Estrada e assim chegou até aos dias de hoje. Por isso, a nossa hipótese é que esta artéria da Ajuda denominada Travessa do Fornos quis ser a Travessa dos Fornos d’El-Rei por estar junto à Estrada que hoje vemos como Rua Dom João de Castro .

Freguesia da Ajuda
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

 

A Calçada da Memória do atentado a D. José I

A Calçada da Memória em 1969
(Foto: Arnaldo Madureira, Arquivo Municipal de Lisboa)

A memória das aventuras galantes de D. José I com D. Teresa de Távora, que terminaram com um atentado à integridade física do soberano, ficou registada no próprio local da agressão com a construção de uma Igreja dedicada a Nossa Senhora do Livramento – por ele ter saído ileso-, assim como a São José – por ser o nome do rei-, e essa lembrança estendeu-se depois a três topónimos locais: a  Calçada , o Largo e a Travessa da Memória.

Tanto a Calçada da Memória como a Travessa homónima, foram topónimos oficializados pela edilidade lisboeta através do Edital de  26 de setembro de 1916. Já o Largo da Memória não possui prova documental que ateste a sua data de fixação mas terá de ser posterior ao início  da construção nesta zona da Igreja da Memória , isto é, a partir de 1760. A partir dos documentos constantes no Arquivo Municipal de Lisboa podemos deduzir que todos os três topónimos serão do séc. XIX e que antes foram genericamente as Terras da Memória.

Com data de 27 de outubro de 1886, encontramos  um projeto de ruas a executar na zona da Memória e da Ajuda, no qual percebemos que a Igreja da Memória confrontava com o Caminho do Buraco, o Pátio das Vacas e o Largo do Chafariz. Também com a data de 8 de janeiro de  1891 deparamos com o projeto definitivo das ruas nas denominadas Terras da Memória, em terreno cedido pela Casa Real. E em 1892, descobrimos um requerimento de vários moradores a solicitar a demolição do muro na travessa do Pátio das Vacas para comunicação com as Terras da Memória e ainda uma solicitação de Rosa Gomes para construção de casa num dos arruamentos projetados na zona da Memória.

Da ligação de D. José I a D. Teresa de Távora, informa o olisipógrafo  Norberto de Araújo que o atentado ocorreu na noite de 3 de setembro de 1758, quando o monarca saído dos aposentos da jovem marquesa de Távora subia de Belém para Ajuda, na carruagem do seu criado e confidente Pedro Teixeira (também fixado como topónimo numa Estrada da Ajuda) e que ao passar no Pátio das Vacas foi D. José atacado a tiro. Os conjurados sumiram-se e o rei partiu à desfilada para a casa do Marquês de Angeja, na Junqueira, para tratar os seus ferimentos no braço. Saiu ileso o rei desta conspiração, tida como dos Távoras, e por tal bênção desta salvação foi erguida a Igreja da Memória. Depois, o Marquês de Pombal acusou os seus inimigos Távoras de conspiração e estes foram torturados e depois executados em janeiro de 1759. A morte dos Távoras foi celebrada com um pelourinho erguido no Beco do Chão Salgado, topónimo também relativo a essa ocasião e os restos mortais do Marquês de Pombal foram transladados em 1923 para a Igreja da Memória.

Freguesia da Ajuda
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Travessa do Tesouro das Necessidades

Freguesia da Estrela
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Travessa do Tesouro surge já com tal nome em 1857, no Atlas da Carta Topográfica de Lisboa de Filipe Folque, na época o mais completo levantamento dos arruamentos da cidade.

Norberto de Araújo dá-nos a explicação do topónimo quando nas suas Peregrinações em Lisboa afirma que «Depois da proclamação da República, o Palácio, com todas as suas preciosidades de ourivesaria, que ficaram constituindo o “Tesouro das Necessidades” – do qual quase todas as peças mais notáveis foram transportadas anos depois para o Museu Nacional de Arte Antiga – esteve encerrado (…).»

Grato à Senhora das Necessidades pelas melhoras da paralisia de que padecera, D. João V comprou este local  e resolveu ampliar a ermida que lhe era dedicada, bem como erguer para si próprio um palácio no local, para além de ter mandado construir um hospício e um convento que em 1744 doou à Congregação do Oratório: o Convento de Nossa Senhora das Necessidades. Com a extinção das ordens religiosas em 1834, o edifício do convento foi anexado para os serviços da Casa Real e tornou-se Paço Real a partir de D. Maria II (Rio de Janeiro/1815 – 1853/Lisboa) e até 1910, embora o seu filho D. Luís tenha usado antes o Palácio da Ajuda. Refira-se assim que o 2º marido de D. Maria II, desde 9 de abril de 1836, D. Fernando II (Viena/1816 – 1885/Lisboa), pai dos reis D. Pedro V e D. Luís I, reuniu no Palácio das Necessidades uma  grande coleção de arte, tanto mais ele que ele próprio pintava, o que lhe valeu o cognome de Rei Artista. D. Fernando também se dedicou à  proteção do património arquitectónico português edificado, nomeadamente com obras de restauração e manutenção na vila da Batalha, no Convento de Mafra, no Convento de Cristo e em Lisboa, no Mosteiro dos Jerónimos, na e  na Torre de Belém.

Após a implantação da República em 5 de outubro de 1910, com grande parte do Tesouro colocado no Museu de Arte Antiga, o Palácio das Necessidades ficou desocupado até em 1950 ser transformado em sede do Ministério dos Negócios Estrangeiros, sob o traçado do arqº Raúl Lino.

Freguesia da Estrela
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

 

#EuropeForCulture

O Rossio e o Dom Pedro

O Rossio no século XVI

Rossio é sinónimo de um espaço largo para fruição e convívio da população pelo que não se estranha que ainda hoje a Praça Dom Pedro IV seja conhecida como Rossio.

De acordo com José Pedro MachadoRossio é o «nome próprio dado a vários campos ou largos citadinos de Portugal, antigamente – como, por exemplo, ainda hoje, o de Évora –, fora das muralhas ou cerca urbana; neles se realizavam, e ainda realizam, feiras; o mesmo se deu com o Rossio (Praça D. Pedro IV) de Lisboa. Primitivamente, depois do terreno desbastado e preparado, serviam os rossios para semeadura de cereais, para hortas ou para pastagem de gados da comunidade. Assim se tornaram pontos de reunião dos moradores e centros comerciais. » Por isto, um pouco por tudo o país encontramos Rossios de que são ainda hoje exemplo os Largos do Rossio na Aguieira, em Aveiro,  na Gafanha da Nazaré, na Guia de Leiria, em Lagos, Mangualde, Mem Martins ou São João das Lampas do concelho de Sintra, para além da povoação Rossio ao Sul do Tejo do concelho de Abrantes. Em Lisboa também ainda temos hoje o antigo Rossio de Palma na freguesia de São Domingos de Benfica e por herança da Expo 98 ficaram o Rossio dos Olivais e o Rossio do Levante, na freguesia do Parque das Nações.

Rossio foi também a denominação original desta artéria lisboeta hoje contida na confluência da Rua da Betesga, Rua Augusta, Rua dos Sapateiros, Rua Áurea, Calçada do Carmo, Rua do Amparo e Praça Dom João da Câmara. Em 1419 já aparece referida numa postura em que o corregedor, os vereadores, o procurador e os homens bons da cidade de Lisboa proíbem o lançamento de esterco, terras e outras sujidades no Rossio da cidade. No séc. XVIII o espaço  já surge denominado como Praça do Rossio até que há pouco mais de 180 anos, por decreto governamental de 31 de outubro de 1836, passou a designar-se Praça de Dom Pedro, denominação que o Edital municipal de 26 de março de 1971 alterou para Praça Dom Pedro IV para evitar equívocos e que a Ata da reunião da Comissão Municipal de Toponímia de 19 de março de 1971 esclarece «Que a nomenclatura da Praça de D. Pedro seja alterada para: Praça de D. Pedro IV», pelo simples motivo de «Já que assim consta dos letreiros ali afixados há longo tempo e ainda porque dessa forma melhor se identifica a figura histórica homenageada».

Este Rei  também surge na toponímia de Felgueiras, Queluz e Valongo como D. Pedro IV enquanto no Brasil aparece como D. Pedro I na toponímia da Baía, de Goiânia, Minas Gerais, Paraíba ou Rio de Janeiro o que não se estranha já que reinou em ambos os países.  O homenageado é D. Pedro I do Brasil e IV de Portugal, que recebeu os cognomes de O Libertador e Rei Soldado, de seu nome completo Pedro de Alcântara Francisco António João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Serafim de Bragança e Bourbon (Palácio de Queluz/12.10.1798 – 14.09.1834/Queluz), filho de D. João VI e da sua esposa, D. Carlota Joaquina. Tendo a coroa portuguesa fugido das invasões francesas residiu no Brasil entre 1807 e 1831. Por força da Revolução Liberal de 1820 no Porto os seus pais regressaram a Portugal e foi nomeado regente em 1821. No ano seguinte, declarou a independência do Brasil, face ao domínio português. Assim, foi D. Pedro I, o primeiro imperador do Brasil, no período de 7 de setembro de 1822 (O grito do Ipiranga) a 7 de abril de 1831, ano em que abdicou para assumir a coroa portuguesa, como D. Pedro IV, em defesa dos direitos da sua filha, D. Maria da Glória, que virá a ser a rainha D. Maria II (Rio de Janeiro/04.04.1819 – 15.11.1853/Lisboa), e que significativamente dá nome ao Teatro instalado na Praça D. Pedro IV, tendo este aberto as suas portas em 13 de abril de 1846, durante as comemorações do 27.º aniversário da rainha D. Maria II.

Praça Dom Pedro IV hoje (Freguesia de Santa Maria Maior)

 

O Terreiro do Paço antes do Terramoto e a nova Praça do Comércio após

O Terreiro do Paço antes do Paço da Ribeira de D. Manuel I

O Terreiro do Paço desapareceu com o Terramoto de 1 de novembro de 1755 e nesse espaço nasceu a nova Praça do Comércio, construída graças ao finamento dos comerciantes de Lisboa para a reconstrução da Baixa, de tal forma que se justificou que fossem homenageados como topónimo dessa Praça central da Baixa toda construída de novo.

Todavia, a Praça do Comércio deve ser o topónimo lisboeta que mais vezes vê o seu topónimo oficial trocado por um topónimo tradicional – Terreiro do Paço -, mesmo que já estejam passados mais de 250 anos sobre a sua atribuição feita pelo 1º decreto de toponímia de Lisboa, assinado por D. José I, com a data de 5 de novembro de 1760, materializando a homenagem aos comerciantes de Lisboa que voluntariamente cederam 4% sobre os direitos alfandegários de todas as mercadorias para a reconstrução da cidade.

Antes do Terramoto é que existiu  o Terreiro do Paço, topónimo feito por referência ao Paço Real da Ribeira, mandado erguer por D. Manuel entre 1500 e 1505, que formava conjunto com a Alfândega, a Casa da Índia, a Casa da Moeda, o Arsenal, e o Teatro da Ópera do Tejo, sendo de notar que apesar de ser no mesmo local onde depois nascerá a geométrica Praça do Comércio, o espaço tinha uma configuração menor e diferente da Praça que lhe sucedeu.

A Praça do Comércio foi traçada por Eugénio dos Santos e Carlos Mardel após o terramoto de 1755,  integrada no plano maior da reconstrução da Baixa lisboeta, numa planta rectangular de disposição geométrica perfeita,  ao género da place royale francesa, envolvida pelas construções de três blocos de edifícios iguais concebidas por Manuel da Maia. Cerca de vinte anos depois do terramoto de 1 de novembro, a 6 de junho de 1775, ficou concluída na Praça do Comércio a estátua equestre de D. José, da autoria de Machado de Castro seguindo um plano de Eugénio dos Santos e para colocar no pedestal de Reinaldo dos Santos, em linha direita com a artéria que homenageia esse monarca: a Rua da Augusta Figura do Rei que no decorrer do tempo acabou por ficar encurtada para Rua Augusta. Quase um século depois, em 1873, foi então colocado o Arco da Rua Augusta, ou Arco Triunfal, do arqº Veríssimo José da Costa, após a arborização da Praça do Comércio em 1866.  O chão foi de terra batida até ao ano de 1900 e todo o conjunto da Praça é Monumento Nacional desde 1910 (Decreto de 16 de junho), tendo Norberto de Araújo já na década de trinta do séc. XX descrito a Praça do Comércio como a «Praça principal de Lisboa, sala de visitas da Cidade».

Projeto para a Praça do Comércio após 1775