A inclusão da Travessa da Praia na Travessa dos Brunos

A Travessa dos Brunos hoje – Freguesia da Estrela
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

O Edital municipal de 3 de outubro de 1919 estabelecia que «os prédios com os nºs 22 e 24 situados num troço da extinta via pública que se denominava Travessa da Praia sejam desta desanexados e encorporados [ incorporados] na Travessa dos Brunos» conforme a Comissão Executiva da Câmara deliberara na sua sessão de 28 de setembro.

Excerto da planta de Filipe Folque de 1857 (Arquivo Municipal de Lisboa)

Na planta de Filipe Folque, de 1857, a Travessa da Praia surge com uma extensão maior que a Travessa dos Brunos e bem junto a uma doca e ao Rio Tejo, fazendo jus ao seu nome. Mais de vinte anos depois, em 1879, na planta de Francisco e César Goulart, a Travessa da Praia aparece com uma extensão semelhante mas já longe do rio, com a Rua Vinte e Quatro de Julho ( mais tarde será a Avenida Vinte e Quatro de Julho) de permeio.

Excerto da planta de Francisco e César Goulart de 1879 (Arquivo Municipal de Lisboa)

Em outros documentos municipais ainda encontramos a Travessa da Praia no final do séc. XIX. Numa escritura com data de 28 de maio de 1884, de expropriação de terreno nessa artéria para abertura de novo arruamento entre a Rua do Sacramento e a Rua Vinte e Quatro de Julho.  Dois anos depois, em 22 de novembro de 1886, também num projeto e orçamento para a abertura da nova artéria, bem como em 7 de maio do ano seguinte na  expropriação de um prédio na Rua do Sacramento à Pampulha e Travessa da Praia e, finalmente, em 31 de agosto de 1889 na expropriação de mais terrenos.

As alterações urbanísticas da zona com o progressivo ganho de terreno ao Tejo conduzem a que a Travessa da Praia seja progressivamente diminuída, e considerada extinta em 1919, pegando então o que dela restava para ser integrado na Travessa dos Brunos,  memória dos frades cartuxos de São Bruno que nesta zona se instalaram no século XVII.  D. Jorge de Ataíde, bispo de Viseu e capelão-mor de Filipe II, propôs o estabelecimento da ordem de São Bruno de Colónia em Portugal e o prior D. Luís Telmo, da Cartuxa de Évora, aceitou umas casas na Pampulha, oferecidas pelo bispo, e assim ficarão na memória  desta Travessa.

A Rua da Galé do mar ou da prisão

Freguesia de Santa Maria Maior - Placa Tipo I (Foto: Mário Marzagão)

Freguesia de Santa Maria Maior – Placa Tipo I
(Foto: Mário Marzagão)

A Rua da Galé que liga a Rua de São Miguel ao Beco das Canas é um topónimo muito antigo, já referida no Sumário de Cristóvão Rodrigues de Oliveira, de 1551, como Rua da Galé com seus becos, hum d’estes becos se chama de João de Ribas.

De acordo com Gomes de Brito, poderá o topónimo derivar de uma embarcação ou por ter existido uma prisão no local. O topónimo marítimo faz sentido em Alfama que sempre manteve uma ligação ao Tejo e, tanto mais que logo desde 1428 os pescadores linhéus ou do largo (pesca à linha) se constituíram em Irmandade do Espírito Santo com sede na igreja de S. Miguel.

Nas proximidades existe também o Beco do Forno da Galé, a que o edital do Governo Civil de Lisboa de 1 de setembro de 1859 acrescentou «da Galé» por referência ao arruamento onde nasce e, o  Boqueirão da Praia da Galé.

Ainda  em Lisboa existe uma Travessa da Galé, na Freguesia de Alcântara e, no Parque das Nações, uma Rua das Galés, herdada da Expo 98.

Freguesia de Santa Maria Maior

Freguesia de Santa Maria Maior

Travessa dos Algarves

Freguesia de Belém (Foto: Sérgio Dias)

Freguesia de Belém
(Foto: Sérgio Dias)

A Travessa dos Algarves guarda na cidade a memória dos algarvios que vieram para Lisboa para serem tripulantes de embarcações e se abrigavam nas casas da malta que para esse efeito existiam nesta artéria.

Esta artéria de Belém, que se abre junto à Rua da Junqueira, passou de Beco a Travessa por deliberação camarária de 23 de setembro de 1880, sendo o topónimo alfacinha mais antigo que se conhece para referir os tripulantes algarvios empregados nos escaleres e nas galeotas reais, que nesse arruamento se abrigavam nas casas da malta que aí existiam.

Freguesia de Belém

Freguesia de Belém

 

A Rua da afamada Praia de Pedrouços

Freguesia de Belém

Freguesia de Belém

A Rua da Praia de Pedrouços, que liga a Rua da Praia do Bom Sucesso à Rua de Pedrouços, foi um topónimo fixado na memória ribeirinha de Lisboa em data que se desconhece.

Sabe-se que nos finais do século XIX e princípios do século XX tiveram o seu apogeu as praias de Pedrouços, da Torre de Belém e da Cruz da Pedra, na zona ribeirinha do Tejo. O areal do limite sul do sítio de Pedrouços era o seu grande motivo de fama na 2ª metade do século XIX, já que depois de Belém era a praia dos arrabaldes de Lisboa mais procurada pela aristocracia, pela alta burguesia e até pela intelectualidade da época. Existem referências para o ano de 1873 da presença nesta praia da Viscondessa de Algés, do Conde de Casal Ribeiro, de Fortunato Chamiço e de Eça de Queirós, com as suas famílias.

Nesta rua foi fundada em 1898 a Academia Dramática Familiar e, no nº 97 faleceu José Agostinho de Macedo (1761 – 1831), pregador e polemista panfletário.

Lisboa exibe ainda mais 4 arruamentos evocativos das suas praias fluviais, a saber, o Boqueirão da Praia da Galé ( Santa Maria Maior ), as Escadinhas da Praia (Estrela), a Rua da Praia do Bom Sucesso (Belém) e, a Travessa da Praia (Alcântara).

Freguesia de Belém

Freguesia de Belém

A Rua da Praia do Bom Sucesso

(Foto: Eduardo Portugal, Arquivo Municipal de Lisboa)

(Foto: Eduardo Portugal, s/d, Arquivo Municipal de Lisboa)

A Rua da Praia do Bom Sucesso retira o seu nome desta praia que teve o seu apogeu nos finais do séc. XIX, por sua vez derivado do Sítio do Bom Sucesso, originado pela presença próxima do Convento de Nossa Senhora do Bom Sucesso, cuja 1ª pedra foi lançada em 1645.

A Rua da Praia do Bom Sucesso nasce junto ao nº 59 da Rua Bartolomeu Dias e termina na Rua da Praia de Pedrouços.  Nesta zona ribeirinha, as praias da Torre de Belém, da Cruz da Pedra, de Pedrouços e do Bom Sucesso eram populares nos finais do século XIX e princípios do século XX, tendo depois declinado em favor de outras praias da Linha do Estoril.

O Sítio do Bom Sucesso compreendia uma área ribeirinha e outrora rural, delimitada a este pela antiga Quinta da Praia (o espaço ocupado hoje pelo Centro Cultural de Belém), a oeste pela Quinta da Princesa (por referência à irmã de D. Maria I), a norte pela antiga cerca do Mosteiro dos Jerónimos e a sul pelo Rio Tejo.

Nesta artéria funcionou uma fábrica de farinhas, o antigo Diário da Manhã e depois o Orbis, assim como a empresa Gelmar de congelação de peixe e, o Sport Bom Sucesso aqui foi fundado em 1913.

Lisboa comporta mais 4 topónimos relativos a praias fluviais alfacinhas:  o Boqueirão da Praia da Galé (Santa Maria Maior), as Escadinhas da Praia (Estrela), a Rua da Praia de Pedrouços (Belém) e ainda, a Travessa da Praia (Alcântara).

Freguesia de Belém

Freguesia de Belém

Freguesia de Belém (Planta: Sérgio Dias)

Freguesia de Belém
(Planta: Sérgio Dias)

A Travessa da Praia da Junqueira

Em 1973  (Foto: Vasco Gouveia de Figueiredo, Arquivo Municipal de Lisboa)

Em 1973 (Foto: Vasco Gouveia de Figueiredo, Arquivo Municipal de Lisboa)

A Travessa da Praia, que liga a Rua da Junqueira à Rua Manuel Maria Vieira, já aparece referida no Atlas da Carta Topográfica de Lisboa de Filipe Folque, de 1857-58, como travessa da Praia da Junqueira. Mais tarde, surge já sem Junqueira em documentos municipais de 1912 a 1915, sobre a cedência de terrenos entre a CML e o Conde de Burnay devido ao alargamento da Travessa da Praia e alinhamento da Rua da Junqueira. Contudo, as duas denominações devem ter coexistido, já que o Guia das Ruas de Lisboa da Tipografia Gonçalves de 1941 identifica o arruamento como Travessa da Praia da Junqueira.

A praia da Junqueira do séc. XVI corresponderá hoje ao espaço das ruas de Alcântara, 1º de Maio e da Junqueira. Refira-se também que em  Agosto de 1666 o jornal Mercúrio Português mencionava a praia da Junqueira como o local do desembarque do Rei para ir para o seu palácio real na área onde hoje é o Largo do Calvário.

Relacionados com as praias fluviais lisboetas de outrora existem mais 4 topónimos na nossa cidade: o Boqueirão da Praia da Galé (Santa Maria Maior), a Rua da Praia de Pedrouços e Rua da Praia do Bom Sucesso (ambos em Belém), e ainda as Escadinhas da Praia (Estrela).

Freguesia de Alcântara

Freguesia de Alcântara

As Escadinhas da Praia fluvial da Madragoa de Santos

Antes de 1945 (Foto: Fernando Pozal, Arquivo Municipal de Lisboa)

Antes de 1945 (Foto: Fernando Pozal,  Arquivo Municipal de Lisboa)

Este arruamento do século XIX que nos nossos dias liga a Avenida 24 de Julho à Calçada Ribeiro Santos, guarda nesta área ribeirinha a memória da praia fluvial da Madragoa.

No ano de 1501 começou a construção do Paço Real de Santos, no sítio das Comendadeiras de Santiago, no que era propriedade de Fernão Lourenço – que era feitor das Casas da Mina e da Índia -, e a vai ceder a D. Manuel I, sendo que então as águas do Tejo batiam no muro sul da cerca. O Paço ergueu-se sobre o rio e esteve ocupado pelos reis portugueses até à partida de D. Sebastião para Alcácer Quibir.

Em 1843 ainda o Tejo banhava  a muralha do jardim do Palácio dos Marqueses de Abrantes e é em 1850 que Lisboa vai conquistar terrenos ao Tejo. É a construção do aterro e da linha Lisboa-Belém, em 1886, que afasta a Madragoa do rio. A Calçada de Santos (hoje, Calçada Ribeiro Santos) só foi aberta em 1859 e o  quarteirão do Largo Vitorino Damásio foi construído entre 1875 e 1880.

Lisboa exibe ainda mais 4 arruamentos evocativos das suas praias fluviais, a saber, o Boqueirão da Praia da Galé ( Santa Maria Maior ), a Rua da Praia de Pedrouços e a Rua da Praia do Bom Sucesso (ambos em Belém) e, a Travessa da Praia (Alcântara).

Freguesia da Estrela (Planta: Sérgio Dias)

Freguesia da Estrela
(Planta: Sérgio Dias)

 

A Rua de Duarte Belo da Bica dos Olhos

na Freguesia de São Paulo - na futura Freguesia da Misericórdia

na Freguesia de São Paulo – na futura Freguesia da Misericórdia

A rua que liga a Travessa do Cabral ao Largo do Calhariz, conhecida pelo seu elevador, evoca Duarte Belo um armador e negociante da Lisboa Quinhentista, proprietário da Bica dos Olhos que curava maleitas dos olhos.

Como refere Norberto de Araújo (Peregrinações em Lisboa, vol. XIII), este Duarte Belo possuía na Boa Vista umas casas e um chão no qual existia uma bica, conhecida como a Bica dos Olhos, sendo também certo que, pelo menos desde 1554, o topónimo “Bica do Belo” existia como um sítio que podia até não ser regularmente urbanizado e se localizava à beira-rio. Em 1709, a Bica dos Olhos foi desviada para o alinhamento da Rua da Boavista, mas manteve a tradição de gerações alfacinhas de irem lavar as vistas antes do nascer do sol, para melhorar a visão ou curar outra maleita dos olhos.

O Sítio da Bica, na vertente das encostas entre Santa Catarina e as Chagas, foi cavado por efeito de um desmoronamento de terras restrito ao local, em 22 de Julho de 1597, e que se repetiu 25 anos mais tarde. Também Gomes de Brito, no seu  Ruas de Lisboa  publicado em 1935, relata que «Cristóvão Rodrigues de Oliveira menciona (1551) a “Bica do Bello” entre os sítios diversos, em seu termo sujeitos à jurisdição da freguesia dos Mártires. Esta freguesia, bem como outras mais, tinha nesse tempo uma área muito mais extensa do que hoje. S. Paulo não existia então, ao menos como paróquia, e Santa Catarina, à qual esta rua pertence, (…) data de 1557, e como paróquia, só começou a exercer as suas regalias, com o território desmembrado da freguesia dos Mártires, no 1º de Janeiro de 1560».

Rua da Boca Duarte Belo placa

A Regueira das boas águas

Placa Tipo I

Placa Tipo I

Alfama das boas águas tem na sua toponímia várias memórias desse recurso hídrico,  uma das quais é a Rua da Regueira.

Após a conquista de Lisboa pelo exército de D. Afonso Henriques, a população voltou a ocupar o arrabalde de Alfama, junto ao núcleo termal e à praia. Sabe-se que cerca de 1183 se tinha formado um pequeno povoado para além da regueira que passara a designar-se por Regueira do Salvador e que, de ambos os lados da Regueira existiam nascentes. O arrabalde de Alfama articulava-se entre 2 pólos ligados pela Regueira: o do núcleo termal e das fontes públicas e a norte, o do bosque de Alfungera.

Alfungera deriva provavelmente do árabe «al-fujrâ» que significa lugar por onde se escapa a água. Poderá ter derivado de uma pequena gruta que tenha existido no bosque, por onde brotaria a água que alimentava um pequeno rego de água: a regueira. Ainda hoje sob a Rua da Regueira murmura a água encanada por uma antiga conduta de pedra.

Na época dos Descobrimentos, a Rua da Regueira como as de S. Pedro, S. Miguel, da Adiça, o Largo do Salvador e as escadas da igreja de S. Miguel eram os espaços urbanos de Alfama mais vivenciados pela população local. A urbanização foi completando-se no séc. XVI com a construção sistemática de habitações ao longo das Ruas de S. Pedro, de S. Miguel, da Judiaria e da Regueira.

Nas descrições paroquiais anteriores ao terramoto o arruamento surge como «a Rigueira» ou «rua da Rigueira», nas freguesias de S. Estêvão de Alfama e do Salvador, sendo a característica rua de divisão de duas freguesias.

na freguesia de Tralala - futura freguesia de Santa Maria Maior

nas Freguesias de Santo Estevão e de São Miguel – na futura Freguesia de Santa Maria Maior

Boqueirão da Praia da Galé

Placa Tipo II

Placa Tipo II

Boqueirão é nome que designa uma Rua que dá para um rio ou canal, tal como este arruamento da zona ribeirinha de Alfama que começa na Rua do Jardim do Tabaco e finda na Avenida do Infante D. Henriques dá para o rio, mostrando por isso também que é um topónimo antigo, talvez seiscentista, nascido por referência à praia que então ali se faria no Tejo.

Essa mesma Praia da Galé também originou a «rua  da Praya, desde a Fundição até o Largo do Chafariz de Dentro» que surge nas descrições paroquiais de Santo Estêvão de Alfama anteriores ao Terramoto de 1755 e, no Atlas da Carta Topográfica de Lisboa de Filipe Folque, de 1858, este Boqueirão da Praia da Galé já aparece referido enquanto tal .

na Freguesia de Santo Estevão  - futura Freguesia de Santa Maria Maior

na Freguesia de Santo Estevão – futura Freguesia de Santa Maria Maior