Do Beco à Travessa do Fala-Só

A Travessa do Fala-Só em 1944
(Foto: Eduardo Portugal © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O Beco do Fala-Só passou a ser a Travessa do Fala Só por Edital do Governo Civil de Lisboa de 29 de novembro de 1877, por sugestão de diversos proprietários de prédios desse arruamento, considerando «que ultimamente ali foram realisados melhoramentos de que resultou ficar uma espaçosa via de comunicação».

O olisipógrafo Luís Pastor de Macedo considera que  o topónimo «deve o seu nome, decerto, a algum morador que teria aquela alcunha» e aventa que antes de ter sido o Beco do Fala Só possa ter sido a «rua para cima da Glória». E tudo parece indicar que seja um topónimo oitocentista, uma vez que não surge no Sumário de 1551 de Cristóvão Rodrigues de Oliveira, nem na Memória Paroquial de São José de 1758, nem nas plantas da remodelação paroquial de 1770 onde a Rua das Taipas nasce na Calçada da Glória. Contudo, como regista o investigador olisiponense Gustavo de Matos Sequeira, o Beco surge em meados do séc. XIX.  Em 1857, na cartografia de Filipe Folque encontramos o Beco do Fala-Só a unir a Calçada da Glória à Travessa de Santo António (da Glória), em paralelo e abaixo da então denominada Rua de São Sebastião das Taipas ( que desde o Edital municipal de 17/10/1924 é a Rua das Taipas), bem como em diversos documentos municipais a partir de 1883, nomeadamente, um requerimento dos moradores de 31 de janeiro de 1883, a solicitar o isolamento do terreno em plano inclinado que na travessa fazia recanto, por servir de latrina pública e outras ações consideradas menos decentes.

Pastor de Macedo ainda menciona que nesta artéria morou e faleceu a atriz Virgínia Farrusca – referida por Sousa Bastos na sua Carteira do Artista – , viúva do ator Eduardo Augusto Farrusca.

Freguesia de Santo António

© CML | DPC | NT | 2019

Do Pátio à Rua do Cais da Alfândega Velha e o nascimento da Travessa da Alfândega Velha em 1874

A Rua do Cais da Alfândega Velha em 1967
(Foto: Vasco Gouveia de Figueiredo © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

A pedido da Câmara Municipal de Belém, o Governo Civil de Lisboa, pelo seu Edital de 7 de novembro de 1874, determinou que o Pátio da Alfândega Velha, também conhecido como Largo da Alfândega Velha, se designasse Rua do Cais da Alfândega Velha, bem assim como atribuiu o topónimo Travessa do Cais da Alfândega Velha.

Determinou esse Edital no seu artigo 3º que «O antigo caminho que dá serventia do largo das Cavallariças Reaes para o Largo do Marquez d’Angeja, conhecido pelas denominações de “Pateo” ou “Largo” da Alfandega Velha, pertencente á freguezia de Belem, será denominado “Rua do Caes da Alfandega Velha». No seu artigo 4º, deliberou também em conformidade que «considerando egualmente o pedido da Camara  Municipal de Belem para que se dê uma denominação á nova Travessa aberta da Rua da Junqueira para o lado do Tejo no sitio chamado “Alfandega Velha” e para que se fixe a denominação do caminho parallelo áquela Travessa, a que uns chamam Pateo e outros Largo da Alfandega Velha”.

O Pátio da Alfândega Velha, onde estavam as antigas cavalariças reais  já aparece assim mencionado na carta topográfica de Filipe Folque de 1858 e, onze anos depois, em julho de 1869, encontramos um ofício do estribeiro-mor da Repartição das Reais Cavalariças para o vice-presidente da Câmara Municipal de Belém, Joaquim José dos Anjos a comunicar que não autoriza o corte de parte de uma pequena casa ou barraca das reais cavalariças, no Pátio da Alfândega Velha, necessário ao alinhamento da nova travessa que vai do pátio à então Rua Direita da Junqueira, alegando que nessa pequena casa vive um criado dessas cavalariças, com a esperança de que quando o criado for para outra casa é que podem autorizar o corte, o que foi comunicado em março de 1871 ao presidente da Câmara Municipal de Belém, Pedro Augusto Franco.

De 1879 a 1880, encontramos a Rua do Cais a Alfândega Velha mencionada em licenças para manter gado caprino no local. Após a transferência do território de Belém para o concelho de Lisboa em 1885,  temos em 1 de junho de 1888 melhoramentos aprovados em sessão de câmara para o local, que inclui a Rua do Cais da Alfândega Velha, a avenida Marginal, as antigas cavalariças reais, a Travessa da Alfândega Velha,  a Travessa de Santo António à Junqueira, a Travessa da Pimenteira, a Travessa do Pinto, a Travessa da Guarda, a Travessa da Praia, o Largo do Marquês de Angeja, a Travessa da Galé, a Rua da Praia da Junqueira, o antigo Cais de Belém, a Travessa dos Algarves, a Rua das Freiras Salésias [desde 12/08/1963 é a Rua Alexandre Sá Pinto], a Rua do Embaixador, o Boqueirão da Cordoaria e o Boqueirão do Porto Franco, onde se englobam os arruamentos projetados nos terrenos conquistados ao Tejo pelas obras do Porto de Lisboa. Na década seguinte também se encontram documentos do alinhamento da Rua do Cais da Alfândega Velha, tal como com data de 1 de outubro de 1910 se depara uma planta com melhoramentos projetados pela Câmara Municipal de Lisboa e pelo Porto de Lisboa para o alinhamento dessa artéria.

Pelo mesmo Edital do Governo Civil de 7 de novembro de 1874, foram também alterados os seguintes topónimos: o Beco da Linheira  passou a ser a Travessa do Ferragial, a Rua da Praga foi integrada na Rua do Cardal e ganhou o acrescento São José e a Travessa das Moças tornou-se a Travessa do Olival a Santos.

Freguesia de Belém

© CML | DPC | NT | 2019

Do Beco da Linheira à Travessa do Ferragial

A Travessa do Ferragial cerca de 1945
(Foto: Fernando Martinez Pozal, © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

Hoje na Freguesia de Santa Maria Maior e a ligar a Calçada do Ferragial à Rua Vítor Cordon, a Travessa do Ferragial  nasceu por Edital do Governo Civil de Lisboa de 7 de novembro de 1874 como novo topónimo do Beco da Linheira, na altura na freguesia dos Mártires e de São Julião do Bairro Central, por solicitação da Câmara Municipal de Lisboa, a partir de uma proposta do vereador Francisco Margiochi aprovada na edilidade lisboeta em 17 de agosto de 1874.

O quinhentista sítio do Ferragial é uma denominação que evoca uma planta de pasto e permaneceu no casco velho da cidade em três topónimos: a Calçada, a Rua e a Travessa, todos com a administração hoje repartida pelas freguesias de Santa Maria Maior e Misericórdia.

Ferragial provém do latim farrago e serve para designar o campo onde se cultivam cereais que ceifados verdes e antes de espigar servem de pasto para animais. De acordo com o olisipógrafo Luís Pastor de Macedo, « Já no “Sumário” encontramos, em 1551, na freguesia dos Mártires as ruas de Cima e do Ferregial. O “Itinerario lisbonense” descrimina bem: Ferregial de Baixo, a primeira à direita, subindo pela rua do Alecrim e termina na Calçada do Ferregial; Ferregial de Cima, a última à direita, entrando na rua de S. Francisco da Cidade, da parte do Chiado e termina ao tesouro velho.» Ainda segundo Luís Pastor de Macedo, a Travessa do Ferragial também terá sido chamada Calçadinha do Arroz.

Por este mesmo Edital do Governo Civil de 7 de novembro de 1874, foram também alterados os seguintes topónimos: a Travessa das Moças passou a Travessa do Olival a Santos, a Rua da Praga passou a integrar a Rua do Cardal de São José, o Pátio ou Largo da Alfândega Velha  mudou para Rua do Cais da Alfândega Velha, assim como uma nova travessa aberta na Rua da Junqueira ganhou a denominação de Travessa do Cais da Alfândega Velha.

Freguesias da Misericórdia e de Santa Maria Maior

© CML | DPC | NT | 2019

Da Travessa das Moças à Travessa do Olival a Santos

A Travessa do Olival a Santos em data entre 1898 e 1908
(Foto: Machado & Souza, © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

Hoje na Freguesia da Estrela, a ligar a Rua Presidente Arriaga à Rua do Olival, está a Travessa do Olival a Santos que nasceu por Edital do Governo Civil de Lisboa de 7 de novembro de 1874 como novo topónimo da Travessa das Moças. A proposta partira do vereador municipal Dr. Isidoro Viana que viu aprovada em Câmara a sua proposta para solicitar ao Governo Civil de Lisboa a alteração do topónimo Travessa das Moças para Travessa do Olival a Santos.

Luís Pastor de Macedo nas suas Peregrinações em Lisboa ( vol. IV) aponta que em 1705 esta seria a travessa da Rua do Olival, como é referida no Livro IV de óbitos de Santos. Este olisipógrafo, tal como Gomes de Brito no seu Ruas de Lisboa ( vol. II), concordam que depois a artéria passou a denominar-se Travessa das Moças, como aparece já referida em 1758, no Livro IX de óbitos de Santos e de igual forma consta no Itinerário lisbonense de 1818, na planta de Filipe Folque de 1856 e em documentos municipais de 1871 e 1872.

Por este mesmo Edital do Governo Civil, foram também alterados os seguintes topónimos: o Beco da Linheira passou a Travessa do Ferragial; a Rua da Praga passou a integrar a Rua do Cardal de São José; o Pátio ou Largo da Alfândega Velha  mudou para Rua do Cais da Alfândega Velha e também uma nova travessa aberta na Rua da Junqueira ganhou a denominação de Travessa do Cais da Alfândega Velha.

Travessa do Olival a Santos mapa

Freguesia da Estrela

© CML | DPC | NT | 2019

Do Beco do Conde de Sampaio à Travessa do Marquês de Sampaio

(Imagem: © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O Edital do Governo Civil de Lisboa de 10 de outubro de 1871 mudou o nome do Beco do Conde de Sampaio para Travessa do Marquês de Sampaio, mudando não só a categoria do arruamento como o título do nobre que lhe dava nome e que falecera 30 anos antes.

A Travessa do Marquês de Sampaio, que se estende no espaço que medeia de  junto ao nº 34 da Rua da Boavista até junto ao nº 96 da Rua da Boavista, hoje na Freguesia da Misericórdia, perpetua o 2.º conde de Sampaio e desde 1834 também 1.º Marquês de Sampaio, que no local possuía residência.

O homenageado é  Manuel Maria Baltasar (ou Manuel António em outras fontes) de Sampaio Melo e Castro Moniz e Torres de Lusignano (Lisboa/06.01.1762-29.09.1841/Lisboa), o 2º Conde de Sampaio que  por decreto da rainha D. Maria II de 1 de dezembro de 1834 recebeu o  título de Marquês de Sampaio, também grafado como Marquês de São Paio. Era filho de António José de Sampaio Melo e Castro, genro do Marquês de Pombal por casamento com Teresa Xavier Violante Eva Judite de Daun. Este 2º Conde e 1º Marquês de Sampaio casou em 1783 com D. Joaquina Maria Rita José Estáquio de Melo (1765 – 1785) e em segundas núpcias, em 1787, com Maria Inês de Albuquerque Mendonça Furtado (1763 – 1815).

O 2.º Conde e 1.º Marquês de Sampaio, aluno do Colégio dos Nobres e militar, aos 45 anos ficou em Lisboa como membro do Conselho de Regência de 1807, para governar Portugal face à retirada da Corte para o Brasil. Aliás, com data de 4 de dezembro desse mesmo encontramos o registo do Aviso de Manuel António de Sampaio Melo e Castro Moniz e Torres de Lusignano, como secretário de Estado dos Negócios da Guerra, a informar que os governadores do reino determinaram que o Senado da Câmara de Lisboa suspendesse o acompanhamento da procissão proveniente da Sé de Lisboa. Mais tarde, foi vice-presidente da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino constituída na sequência da Revolução Liberal do Porto de 24 de agosto de 1820 e presidente da Secção de Convocação das Cortes da Junta Preparatória das Cortes. Após a eleição das Cortes foi escolhido para presidente do Conselho de Regência de 1821 pelas Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes para governar até à chegada a Portugal do rei D. João VI, cargo semelhante ao de Primeiro-Ministro nos nossos dias, que exerceu de 27 de janeiro a 5 de julho desse ano.

Participou na Belfastada de 1828 e foi obrigado a procurar asilo na emigração liberal em Inglaterra. Após a estabilização do regime liberal, foi eleito deputado, nomeado par do Reino e recebeu o título de Marquês.

Freguesia da Misericórdia

© CML | DPC | NT | 2019

Do Beco à Travessa da Silva do Diogo da Silva que ali aforou terras no séc. XVI

 

O Edital do Governo Civil de Lisboa de 5 de abril de 1867 que tornou o Beco em Travessa da Silva

Próximo da Sé de Lisboa e na entrada de Alfama,  um Beco passou a Travessa pelo Edital do Governo Civil de Lisboa de 5 de abril de 1867, a pedido de moradores locais. Foi o Beco da Silva que passou a Travessa da Silva, então na Freguesia de São João da Praça, que havia sido criada em 1209. Vinte e seis anos depois, em 1893, o Edital municipal de 6 de novembro tornou-a Travessa do Chafariz de El-Rei e é assim que hoje ainda a encontramos na Freguesia de Santa Maria Maior.

Este Beco do Silva que passou a Travessa da Silva tudo indica ser um topónimo referente a uma pessoa conhecida no lugar e não o arbusto silva. Os documentos  apontam para um Diogo da Silva que aforou terras naquele local no séc. XVI. Segundo Luís Pastor de Macedo, «nos meados do séc. XVI a travessa era a rua de Diogo da Silva» e é assim que aparece no Sumário de Lisboa de 1551 de Cristóvão Rodrigues de Oliveira. Norberto de Araújo afirma que «Esta Travessinha, em escadaria, do Chafariz de El-Rei foi chamada, no tempo velho, Beco da Silva;  a razão toponímica tradicional esteve no nome do dono da tal casa [Diogo da Silva], trocado que foi, por corruptela o ‘do’ em ‘da’» e esclarece também que « Estas casas, por trás do Chafariz, e as que se seguem à direita da Travessa do Chafariz de El-Rei, foram, na base primitiva desaparecida, as do Marquês de Angeja – a que atrás me referi – (primeira metade do século XVIII), mas no século XVI, uma parte delas havia pertencido a um Lopo de Albuquerque de cujos herdeiros a Câmara a houve um tanto forçadamente e outra parte a um tal Diogo da Silva, que acabou por tomar de fôro as da Câmara.»

Pastor de Macedo elucida ainda que «juntamente com a travessa de S. João da Praça, talvez se tivesse chamado em 1565 travessa do Chafariz de El-Rei. Em 1573 vêmo-la designar por ‘travessa que vem da porta de S. Pedro para o chafariz’ [e dá-nos como sua fonte para este efeitos os livros dos Prazos da freguesia de S. João da Praça, caixa 16/15]. Depois, não sabemos desde quando, foi a rua e o beco da Silva» e refere que assim surge no Livro I de baptismos de S. João da Praça dos anos de 1714 e 1717, sendo ainda como Beco da Silva que está registada na Freguesia de  São João da Praça nas memórias paroquiais de 1755, assim como nas plantas da remodelação paroquial de 1770. Depois, já no séc. XIX, o Edital do Governo Civil de Lisboa de 1867 tornou a artéria em Travessa da Silva e o Edital municipal de 1893 voltou a alterar a denominação, desta feita para Travessa do Chafariz de El-Rei.

A primeira referência documental a este chafariz data de 1487, de acordo com Maria Calado, que todavia assinala que também se pode registar o seu funcionamento desde épocas mais recuadas. O Chafariz d’El-Rei surge ainda mencionado no Sumário de Lisboa de 1551. O Chafariz também foi topónimo para a Porta ou Postigo do Chafariz de El-Rei, que depois foi o  Beco das Moscas e ainda mais tarde a  Travessa de São João da Praça.

A Travessa do Chafariz de El-Rei em 1967
(Foto: Armando Serôdio, © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

 

© CML | DPC | NT | 2019

Da Rua dos Galegos à Rua do Duque e da Travessa dos Burros à da Boa Morte

A Rua dos Galegos na planta de 1858 de Filipe Folque

O Edital do Governo Civil de Lisboa da segunda-feira dia 5 de agosto de 1867, alterou a denominação de dois topónimos em dois locais diferentes da cidade: a Rua dos Galegos tornou-se a Rua do Duque e a Travessa dos Burros passou a ser Travessa da Boa Morte.

Da Rua dos Galegos à Rua do Duque

A Rua do Duque, hoje integrada na Freguesia de Santa Maria Maior, foi a Rua da Condessa de Cantanhade, a Rua de D. João Coutinho, a Rua do Galegos e  desde 1867, a Rua do Duque. O olisipógrafo Luís Pastor de Macedo, a este propósito refere que  «A Rua da Condessa de Cantanhede, freguesia do Sacramento, (…) é a actual Rua do Duque, depois de ter sido também designada Rua de D. João Coutinho e Rua dos Galegos: «Um fidalgo de primeira plano começa a aglomerar propriedades. É o Conde de Cantanhede, D. Pedro de Meneses, Alferes-mor de D. Manuel, senhor de Tancos e de Atalaia. Compra as casas que Rui de Sousa Cid adquirira a Leonardo Àlvares e, em breve o veremos adquirir outras propriedades próximas, na rua que ia do Postigo para o Carmo, e que veio a chamar-se mais tarde, pelo nome da sua terceira mulher, a Condessa de Cantanhede D. Guiomar. Foi assim que nasceu a rua, sucessivamente chamada de D. João Coutinho, dos Galegos, e do Duque». 

A título de exemplo para situar a época histórica de cada topónimo, recordamos que a Rua da Condessa de Cantanhede aparece num documento de 26 de novembro de 1596, como a morada do barbeiro Manuel Fernandes, enquanto fiador de Simão Lopes que tinha a obrigação de vender 500 carneiros no açougue. Em 1704, surge como Rua da Condessa ao Carmo, num plano de obras de uma casa. Em 13 de outubro de 1739 já deparamos com uma vistoria na Rua dos Galegos. De 1812 a 1848 aparece como Rua da Condessa em alguns documentos municipais,  mesmo se em 1836 e 1838 são apontadas demolições de prédios e de um pardieiro na Rua dos Galegos tal como em 1858, na planta de Filipe Folque, se regista a Rua dos Galegos.

Na data de 5 de agosto de 1867, para além de alterar a Rua dos Galegos para Rua do Duque, o Governo Civil de Lisboa também atribuiu o topónimo Calçada do Duque. Em ambos os casos, a homenagem é a um antigo proprietário local, o Duque de Cadaval.

A Travessa dos Burros na planta de 1856 de Filipe Folque

Da Travessa dos Burros à Travessa da Boa Morte

A Travessa dos Burros junto à Rua Direita da Boa Morte, está já assim registada em agosto de 1856 no levantamento cartográfico de Filipe Folque. Cerca de onze anos depois, em fevereiro de 1867, ainda deparamos com o topónimo Travessa dos Burros através do traçado de um prédio que José Bernardo Ferreira quis construir no n.º 7 e 8, nesta zona que ainda era amplamente rural. Nesse mesmo ano, em agosto, o Edital do Governo Civil de Lisboa de dia 5 alterou a denominação para Travessa da Boa Morte, por referência ao Convento da Congregação do Senhor da Boa Morte e Caridade, construído em 1736 e demolido em 1835.

Por último, o Edital municipal de 4 de dezembro de 1882 voltou a modificar o nome da Travessa da Boa Morte para Travessa do Possolo, tal como a Rua da Boa Morte ficou como Rua do Possolo, e esta denominação é a que ainda hoje se apresenta nesta artéria da Freguesia da Estrela.

© CML | DPC | NT | 2019

Do Beco do Cemitério à Travessa da igreja barroca da Pena

A Travessa da Pena em 1901
(Foto: Machado & Souza, © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

Na quarta-feira dia 7 de novembro de 1866 um Edital do Governo Civil de Lisboa mudou o topónimo Beco do Cemitério para Travessa da Pena, por solicitação de «alguns proprietarios , e outros indivíduos residentes no beco do Cemiterio, freguezia da Pena, districto do Bairro Alto».

Assim, «o beco denominado do Cemiterio, contiguo á calçada de Santa Anna» passou a fazer referência à Igreja paroquial de Nossa Senhora da Pena que foi também invocação da própria Freguesia até 2012. Hoje, este arruamento sem saída que encontramos a nascer junto ao nº 179 da Calçada de Santana, pertence à Freguesia de Arroios.

Entre 1564 e 1570, o cardeal D. Henrique, então Arcebispo de Lisboa, criou seis paróquias a partir da Paróquia de Santa Justa, entre elas a de Sant’Ana, com sede na igreja quinhentista do Mosteiro de Santa Ana das Religiosas da Ordem Terceira de São Francisco. Contudo, dissidências entre as religiosas do Mosteiro e os fregueses da Irmandade do Santíssimo Sacramento operaram a criação de uma nova igreja, no cimo da Calçada de Santana, para onde se mudaram em 25 de março de 1705, dia da Encarnação, dando depois à nova Igreja Paroquial a invocação de Nossa Senhora da Pena, benzida pelo bispo de Bona. Segundo Nuno Saldanha, no seu artigo sobre esta matéria no Dicionário da História de Lisboa , «É sobretudo a Manuel Antunes, ao mesmo tempo mestre pedreiro e tesoureiro da Irmandade, que se devem as obras de edificação da nova fábrica, que, a partir de 1703, contrai um empréstimo para a compra de um conjunto de casas situadas na Rua do Adro, local onde se ergueria a futura capela-mora da igreja».

Neste templo de estilo barroco joanino trabalharam nas suas talhas Claude Laprade, Manuel Quaresma, Domingos da Costa e Santos Pacheco; bem como Jerónimo da Silva, André Gonçalves, João Nunes de Abreu e António Lobo  nas suas telas e pinturas, para além de Luís Baptista e Pedro Alexandrino, após o sismo de 1755, que causou danos na frontaria e interior da igreja mas permitindo reedificação, obra que se prolongou até 1793. Contudo, o templo reabriu ao culto em 1763 e no período entre 1755 e 1763 a paróquia funcionou, sucessivamente, no Colégio de Santo Antão dos Jesuítas (hoje, Hospital de São José) e na Ermida dos Perdões do Palácio Mitelo.

Freguesia de Arroios

© CML | DPC | NT | 2019

Do Beco das Moscas à Travessa de São João da Praça e da Rua do Chinelo à Travessa Nova de Santos

O Beco das Moscas na planta de Filipe Folque de 1858 e a Travessa São João da Praça na planta de 1909 de Silva Pinto

O Edital do Governo Civil de Lisboa do sábado 17 de outubro de 1863, transformou o Beco das Moscas na Travessa de São João da Praça, assim como  a Rua do Chinelo na Travessa Nova de Santos, a pedido de «alguns proprietarios de predios, e outros individuos, residentes» nesses arruamentos, alterando os topónimos comuns por referências religiosas dos locais onde se inseriam.

O Beco das Moscas já aparece em 1858 no levantamento cartográfico de Lisboa executado por Filipe Folque e  de acordo com o Edital do Governo Civil de 1863 «dá serventia do Caes de Santarem para o largo da egreja parochial de S. João da Praça», pelo que se entende que o novo topónimo faça referência à essa igreja e à artéria próxima que é a Rua de São João da Praça., que já em 1551 era a Rua Direita de São João, conforme o Sumário de Cristóvão Rodrigues de Oliveira. A Travessa de São João da Praça, hoje na Freguesia Santa Maria Maior, passou a fazer menção ao templo medieval que de acordo com Norberto de Araújo   «data do princípio do século XIV, pelo menos, e teve como orago S. João Degolado, ou seja S. João Baptista», embora tenha sido completamente destruído com o terramoto de 1755 surgindo no seu lugar um novo construído em 1789.

Já a Travessa Nova de Santos resulta de uma segunda intervenção do Governo Civil de Lisboa naquele arruamento. A artéria denominada Rua do Noronha,  «na Freguezia de Santos o velho», passou pelo primeiro Edital do Governo Civil de Lisboa, de 1 de setembro de 1859, a designar-se  Rua do Chinelo como era vulgarmente conhecida, mas quatro anos volvidos, mudou novamente o seu nome, desta feita para referir a invocação local desde logo presente no topónimo da freguesia: Santos, dos Santos Mártires Veríssimo, Máxima e Júlia.

Esta Travessa Nova de Santos que é hoje território sob a administração da Freguesia da Estrela, teve o seu calcetamento reparado em junho de 1886; assim como sabemos que pelo menos em junho de 1910 acolheu Festejos dos Santos Populares com a artéria ornamentada para esse efeito bem como em 1919 teve o seu traçado de via alinhado.

Travessa Nova de Santos na Freguesia da Estrela

© CML | DPC | NT | 2019

A quinhentista Travessa da Queimada e a novela regiana «Davam grandes passeios aos domingos»

Capa da 1ª edição de Davam grandes passeios aos domingos, na Editorial Inquérito, o nº 40 da Coleção Novelas, em 1941
(Imagem:  © CER)

No 1º andar direito do nº 23 da Travessa da Queimada esteve instalada a Editorial Inquérito responsável pelas primeiras edições de quatro obras de José Régio: o ensaio Em torno da expressão artística (1940), a novela  Davam Grandes Passeios aos Domingos (1941), o romance O Príncipe com Orelhas de Burro (1942), e a peça A Salvação do Mundo (1954).

Nessa época, a Editorial Inquérito imprimia as suas edições na tipografia Libanio da Silva, sediada ali próximo, na Travessa do Fala Só, junto à Calçada da Glória.  Já o nº 23 da Travessa da Queimda é o Palácio Rebelo Palhares, do séc. XVII, que pertenceu ao 1º. Conde Almeida Araújo e onde, para além da Editorial Inquérito, se albergaram os jornais Diário Ilustrado (1872-1910), Correio da Europa (1902) e A Bola, a partir de 1945.

A Travessa da Queimada, que se alonga desde o antigo Largo de São Roque, hoje Largo Trindade Coelho, até à Rua da Atalaia é um arruamento quinhentista que marca o limite da 1ª fase de urbanização da Vila Nova de Andrade, futuro Bairro Alto de São Roque, que decorreu de 1513 a 1518, partindo das Portas de Santa Catarina para poente e subindo até esta Travessa da Queimada, que primitivamente foi qualificada como rua, mas também terá sido designada como Travessa dos Poiais. Salienta-se que a modernidade da urbanização do Bairro Alto aqui se revelou por ser construída em quadrícula, com um traçado de ruas ortogonal, antes de Lisboa sequer pensar vir a ter  a Baixa pombalina.

Sobre a origem deste topónimo a explicação mais verosímil é a do olisipógrafo Vieira da Silva que o faz derivar do nome de uma certa fidalga, Ana Queimada, que em meados do séc. XVI tinha  naquele local  aforado um chão aos frades de São Roque, para construir moradias nobres.

 

O nº 23 da Travessa da Queimada
(Foto: Cláudia Michele Damas e Sousa, 2012, Arquivo Municipal de Lisboa)

© CML | DPC | NT | 2019

com o apoio de