A Rua Augusta e a Praça do Comércio

A Rua Augusta e a Praça do Comércio antes de 1873
(Foto: © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

A Rua da Augusta Figura do Rei leva-nos a direito para a estátua do monarca que homenageia: D. José I, o soberano que inaugurou em Lisboa a prática da atribuição de nomes de ruas por decreto.

É dele a Portaria de 5 de novembro de 1760 no qual se estabelece a denominação dos arruamentos da Baixa lisboeta reconstruída sob o plano de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel«entre as Praças do Comercio e a do Rocîo», ao mesmo tempo que se regulamenta a distribuição dos ofícios e ramos do comércio pelas diferentes 14 artérias: «Rua Nova d’El Rey  [hoje, Rua do Comércio], Rua Augusta, Rua Áurea, Rua Bella da Rainha  [hoje, Rua da Prata], Rua Nova da Princesa  [hoje Rua dos Fanqueiros], Rua dos Douradores, Rua dos Correeiros, Rua dos Sapateiros, Rua de S. Julião, Rua da Conceição, Rua de S. Nicolau, Rua da Victoria, Rua da Assumpção e Rua de Santa Justa».

Na Rua Augusta deviam alojar-se os mercadores da seda e da lã e, quinze anos depois, a 6 de Junho de 1775 foi colocada no enfiamento da artéria, na Praça do Comércio, a estátua equestre de D. José, feita por Machado de Castro. Quase um século mais tarde, em 1873, foi rematada a Rua Augusta com um Arco Triunfal, da autoria de Veríssimo José da Costa.

Esta rua, que faz a ligação entre as duas praças principais pré-terramoto, o Terreiro do Paço e o Rossio, ambas mantidas e realinhadas no plano de reconstrução da baixa da cidade, será o eixo central da malha urbana da Baixa que hierarquiza os arruamentos através da sua largura e tipologia dos edifícios e cujo rigor geométrico remete para a planificação e organização de estruturas militares. O planeamento, a racionalidade e o pragmatismo, valores intrínsecos ao Iluminismo, estão assim presentes como alicerces fundamentais da nova imagem que se pretendia para uma das mais movimentadas capitais europeias.

A visão perspética a partir do Rossio que conduz a uma Praça, a do Comércio, é fortemente cenográfica e ao gosto oitocentista que através desta tipologia definia espaços amplos de representação simbólica do poder. Classificada como Monumento Nacional em 1910 (Decreto n.º 136, de 23-06-1910), a nova Praça é considerada uma obra de referência do séc. XVIII na genealogia das suas congéneres europeias tendo um aspeto inovador: uma das suas faces é total e simbolicamente aberta sobre o rio Tejo.

O programa da Praça do Comércio, tipologicamente associado às “praças reais” francesas e à semelhança destas, previa desde o início a colocação de uma estátua do rei no centro geométrico de um triângulo equilátero no alinhamento da então Rua da Augusta Figura do Rei e que viria a ser a primeira estátua equestre realizada em Portugal. Cerca de 100 anos depois da sua inauguração, cujos festejos se adequaram à solenidade do momento, em 1873 foi terminado o Arco do Triunfo colocado a norte da Praça cuja construção estava prevista desde 1759 nos planos de reconstrução da baixa com desenho de Eugénio dos Santos e que enquadra cenograficamente a estátua. Ficava assim terminado um percurso de afirmação de poder expresso em diferentes momentos: a Rua Augusta e o Arco, a Praça do Comércio e Estátua do monarca D. José I.

© CML | DPC | NT | 2019

Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de Pombal

Gravura de Sebastião José de Carvalho e Melo
(Foto: Alberto Carlos Lima © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

Sebastião José de Carvalho e Melo, 1.º conde de Oeiras e 1.º marquês de Pombal, nascido a 13 de maio de 1699, dá nome a uma artéria de Lisboa desde o centenário do seu falecimento e, a data do seu nascimento chegou a ser sugerida para feriado municipal na reunião de Câmara de 22 de março de 1926, considerada a importância histórica do estadista para a cidade de Lisboa.

A Praça Marquês de Pombal – hoje na confluência da Avenida da Liberdade, Avenida Fontes Pereira de Melo (então, Rua Fontes), Parque Eduardo VII (na época, Parque da Avenida da Liberdade) e Rua Braamcamp (só denominada como tal em 1888) – , popularmente chamada Rotunda, foi dada pela deliberação de câmara de 6 de maio de 1882, ou seja, no centenário do seu falecimento e quase no 183º aniversário do seu nascimento.

Foi no mesmo ano da atribuição do topónimo em Lisboa que surgiu a ideia de erguer um monumento ao estadista e reedificador de Lisboa e o Parlamento até autorizou o Estado a ceder o bronze necessário. No entanto, a agitação política impediu a sua concretização pelo que a ideia só foi retomada em 1913 através da abertura de concurso público, em que foi escolhido o projeto assinado por Adães Bermudes, António Couto e Francisco Santos. A primeira pedra do monumento foi colocada duas vezes, uma em 15 de agosto de 1917 e outra, em 13 de maio de 1926 e só após mais uns quantos percalços, a estátua foi assente em 2 de dezembro de 1933 e inaugurada em 13 de maio de 1934, no 235º aniversário do Marquês.

Refira-se ainda que o alfacinha Sebastião José de Carvalho e Melo (Lisboa/13.05.1699 – 08.05.1782/Pombal) está presente em mais topónimos lisboetas, que derivam do seu apelido de família (Carvalho), em zonas da cidade onde ele e os seus irmãos detiveram propriedades: a Rua Nova do Carvalho e a Travessa do Carvalho, na zona pombalina do Cais Sodré – São Paulo reconstruída após o Terramoto de 1755, bem como o Alto do Carvalhão, a Rua do Arco do Carvalhão e a Rua do Meio ao Arco do Carvalhão.

Apesar de controverso pelas medidas que implantou e preconizou a nível político, económico, social e cultural, Marquês de Pombal é uma figura incontornável para o estudo do século XVIII, nomeadamente pela sua ligação ao despotismo iluminado. Ainda no reinado de D. João V, teve duas missões diplomáticas (Londres e Viena) entre 1738 e 1749. Porém, foi no reinado de D. José (1750-1777) e após o terramoto de 1755, que viria a tornar-se o homem forte do monarca.

O seu pragmatismo, capacidade de decisão e autoridade permitiram acionar uma resposta rápida e eficaz face à destruição de grande parte do centro de Lisboa. Manuel da Maia, engenheiro militar, dirigiu o plano de reconstrução da cidade que foi aprovado em 1758, delineado por Eugénio dos Santos e Carlos Mardel, ambos, também, engenheiros militares.

O plano geral, claramente inovador, segue de perto referências e modelos filosóficos e racionalistas iluministas sustentados em regulamentos de construção e planificado com ruas alinhadas e hierarquizadas, afirmando o seu pioneirismo face a outros exemplos europeus.

Sebastião José de Carvalho e Melo, ministro plenipotenciário do rei D. José, ficará para sempre associado à história da baixa de Lisboa reconstruída no século XVIII, como um dos principais impulsionadores da sua modernidade.

A estátua do Marquês de Pombal sobre a Baixa Pombalina em 1953
(Foto: Kurt Pinto © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

© CML | DPC | NT | 2019

A Praça de Luís de Camões de 1860

A Praça de Luís de Camões antes de 1893
(Foto: Francesco Rocchini, © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa )

A Praça de Luís de Camões nasceu por força do Edital do Governo Civil de Lisboa de 12 de outubro de 1860, no espaço formado pela demolição dos prédios e ruínas compreendidas entre o Largo das Duas Igrejas (hoje Largo do Chiado), Rua Larga de São Roque (hoje Rua da Misericórdia), Rua do Loreto, Travessa dos Gatos e Rua da Horta Seca, apontando esse Edital as seguintes razões da atribuição:

«Existindo o projecto de se erigir n’esta cidade um monumento á memoria de Luiz de Camões, que atteste o reconhecimento da nação ao cantor immortal dos feitos gloriosos dos portuguezes; e havendo a commissão central promotora da subscripção para esta obra patriotica, em requerimento que me dirigiu, manifestado o desejo de que ao largo já destinado para n’elle se elevar o projectado monumento se dê uma denominação indicativa de tão nobre objecto; accedendo a este louvavel pensamento, e depois de ouvir a Camara Municipal de Lisboa, que com elle se conformou; (…)»

De acordo com o olisipógrafo Norberto de Araújo, esta artéria foi ganhando a sua configuração entre 1859 e 1863, com a execução da terraplanagem, do empedrado e do erguer do monumento que nela foi inaugurado em 9 de outubro de 1867, da autoria do escultor Vítor Bastos. O modelo em gesso fora aprovado em 1860 por D. Pedro V e o lançamento da 1ª pedra ocorreu em 28 de junho de 1862. Mais tarde, no âmbito das comemorações do 3º Centenário da morte de Luís Vaz de Camões, a 10 de junho de 1880, foi na Praça de Luís de Camões que desfilou o grande cortejo cívico do Centenário do poeta.

Freguesia da Misericórdia

© CML | DPC | NT | 2019

O 25 de Abril na Praça Dom Pedro IV

Às 12H00, uma companhia do RI 1, comandada pelo capitão Fernandes, tentou barrar o caminho para o Quartel do Carmo, à coluna da EPC, comandada pelo capitão Maia, mas este convenceu-os a aderirem ao Movimento.

A Praça Dom Pedro IV, vulgarmente conhecida como Rossio, cerca do meio-dia do dia 25 de abril de 1974 foi palco do encontro da companhia do Regimento de Infantaria 1 da Amadora, comandada pelo capitão Fernandes, ali estacionada, com a coluna da EPC – Escola Prática de Cavalaria, comandada pelo capitão Maia, para chegar ao Largo do Carmo. O RI1  tentou barrar a passagem à EPC mas após um curto diálogo entre os comandante das tropas, todos os militares passaram para o lado do MFA e as tropas do RI 1 vão seguir à retaguarda da coluna da EPC.

A coluna de Salgueiro Maia saíra da Praça do Comércio pela Rua Augusta, Praça Dom Pedro IV  e Rua do Carmo, para atingir o Largo do Carmo, recebendo  durante todo o trajeto o apoio e aclamação das muitas centenas de pessoas que na Baixa de Lisboa acompanhavam as movimentações militares. Desobedecendo às recomendações do MFA para permanecer em casa, a população saiu à rua em apoio aos militares revoltosos que vitoriava.

Ao longo de todo o dia 25 de abril de 1974, a placa central da Praça Dom Pedro IV foi local de aglomeração de populares e nos dias seguintes local de manifestações.

(Foto: Fernando Baião, O Século Ilustrado, 27 de abril de 1974)

© CML | DPC | NT e GEO | 2019

O 25 de Abril e a Praça do Comércio

Principal centro simbólico e real do poder político, no Estado Novo, aqui se situavam os Ministérios do Exército e da Marinha.

Foi ocupado por uma força da Escola Prática de Cavalaria de Santarém, com cerca de 220 militares, comandados pelo capitão Fernando Salgueiro Maia, capitão Mário Tavares de Almeida, tenente Alfredo Correia Assunção e tenente Rui Santos Silva.

Aquela que é por muitos denominada como a sala de visitas da cidade de Lisboa, a nova Praça do Comércio construída após o desaparecimento do Terreiro do Paço no Terramoto de 1 de novembro, graças ao finamento dos comerciantes de Lisboa, foi o 1º palco simbólico de mudança do poder no 25 de Abril, ao ser ocupada pelo movimento dos capitães – sendo as tropas comandadas pelo capitão Salgueiro Maia, capitão Tavares de Almeida, tenente Correia Assunção e tenente Santos Silva -, cerca das 5:45 da manhã do dia 25 de Abril, bem como ao ser  deste local que partiram os militares do MFA para o Largo do Carmo, onde se havia de consumar a queda do regime.

A Praça do Comércio foi traçada por Eugénio dos Santos e Carlos Mardel após o terramoto de 1755 –  integrada no plano maior da reconstrução da Baixa lisboeta -, numa planta retangular de disposição geométrica perfeita,  semelhante a uma place royale francesa e envolvida pelas construções de três blocos de edifícios iguais concebidas por Manuel da Maia. Cerca de vinte anos depois do terramoto de 1 de novembro, a 6 de junho de 1775, ficou concluída na Praça do Comércio a colocação da estátua equestre de D. José I, da autoria de Machado de Castro, seguindo um plano de Eugénio dos Santos, e colocada no pedestal de Reinaldo dos Santos, alinhada com a artéria que homenageia esse monarca: a Rua da Augusta Figura do Rei que no decorrer do tempo acabou por ficar com a denominação encurtada para Rua Augusta. Quase um século depois, em 1873, foi então colocado o Arco da Rua Augusta ou Arco Triunfal, do Arqº Veríssimo José da Costa, já após a arborização da Praça do Comércio em 1866.  O chão do local foi de terra batida até ao ano de 1900 e dez anos depois, pelo Decreto de 16 de junho de 1910, todo o conjunto da Praça foi considerado Monumento Nacional.

A Praça do Comércio tem também a particularidade de ser também o topónimo lisboeta que mais vezes vê o seu topónimo oficial trocado por um outro, um topónimo simbólico do poder do rei e do seu Paço Real da Ribeira (o Terreiro do Paço). Já o seu topónimo oficial de Praça do Comércio, uma homenagem aos comerciantes de Lisboa que voluntariamente cederam 4% sobre os direitos alfandegários de todas as mercadorias para a reconstrução da cidade, foi atribuído pelo 1º decreto de toponímia de Lisboa, assinado por D. José I, com a data de 5 de novembro de 1760, é simbólico de um novo poder mais participado por todos os habitantes da cidade.

© CML | DPC | NT e GEO | 2019

O fundeadouro romano da Praça D. Luís I

Espólio em exposição no parque de estacionamento da Praça Dom Luís I

A construção de um parque de estacionamento subterrâneo na Praça Dom Luís I, em 2013, evidenciou um fundeadouro romano, com uma cronologia entre o séc. I e o séc. V, época em que aquele local era uma baía no rio Tejo.

No decorrer das obras foi identificada uma antiga área de leito do rio, onde os barcos de época romana fundeavam. Debaixo
 de uma enorme estrutura de madeira dos inícios do século XVIII – utilizada como estaleiro naval-, foi encontrada uma quantidade imensa de restos de cerâmica romana, do século I a.C. até ao século V, entre os quais meia centena de ânforas para exportação do preparado de peixe produzido em tanques – como aconteceu na Rua dos BacalhoeirosCasa dos Bicos, na Rua dos CorreeirosNARC ou na Rua Bartolomeu Dias, em Belém -, bem como cerâmicas importadas de Espanha e de Itália. Ao longo de cinco séculos foi ali que os navios romanos estacionaram, para passarem as mercadorias para embarcações mais pequenas que as transportavam até à costa. Foi também encontrada uma grande peça, com cerca de 8,5 metros de comprimento, que se concluiu ser a a primeira madeira de navio inequivocamente romana encontrada em Lisboa.

Este fundeadouro estava fora dos limites da cidade, talvez servindo de apoio à indústria de preparados de peixe, também ela colocada na periferia de Felicitas Iulia Olisipo. Para visualizar com referências dos nossos dias existiria uma pequena baía entre o Jardim de Santos e a Rua do Alecrim, assim como estava presente um esteiro junto à Avenida Dom Carlos I, gerando uma zona de águas calmas, apropriada à fundeação de navios, excepto os de grande calado.

Mencione-se que estes vestígios teriam sido provavelmente destruídos, não fosse a estrutura de madeira que no séc. XVIII foi assente sobre eles e os protegeu do maremoto de 1775 e da implantação do Aterro da Boavista no século XIX.

O parque de estacionamento inaugurado em 2014, incluiu um programa museográfico que explica esta memória e que expõe alguns dos artefactos exumados, assim como reproduções, com textos explicativos, nos patamares das escadas de acesso aos pisos subterrâneos. À medida que se vai descendo mais se recua no tempo. Cada piso do parque distingue-se não só por uma cor específica, mas também por um símbolo gráfico, icónico, do período correspondente. Há pelo meio um piso em que é a própria atividade arqueológica que é comemorada.

© CML | DPC | NT e CAL – Centro de Arqueologia de Lisboa | 2019

Requiescat in pace: a necrópole noroeste de Olisipo na Praça da Figueira

Fases de ocupação da Necrópole Noroeste

No espaço que hoje identificamos como Praça da Figueira funcionou durante quase quatro séculos, do século I ao IV d.C., uma necrópole romana, a maior de Lisboa, que se entenderia até à Encosta de Santana e Elevador do Lavra, regularmente identificada como Necrópole Noroeste de Olisipo.

Aliás, a cronologia do seu uso foi reforçada pelo estudo das 17 lucernas – candeias romanas – recuperadas no local. Esta necrópole era consideravelmente extensa, com uma  área que abrange desde a Praça da Figueira ao Largo de São Domingos, Calçada do Garcia e Encosta de Santana, sendo a Via Norte a sua linha estruturante.

As necrópoles acompanhavam os eixos viários de saída da cidade, como acontece neste caso. Foi ainda identificada uma via perpendicular à Via Norte,  via secundária que serviria mais tarde de acesso ao circo e a outras estruturas. Por outro lado, as necrópoles são também indicadoras dos limites da cidade já que estavam sempre situadas no exterior da área habitada (poemerium) , nas periferias da cidade (suburbia) e a área da Praça da Figueira, tem uma localização periférica face ao perímetro da cidade romana, em sentido estrito.

O arqueólogo Rodrigo Banha coloca a hipótese desta necrópole da Praça da Figueira ter substituído a necrópole encontrada na Rua dos Correeiros – no NARC – , pela razão prática e conforme a mentalidade romana da época de os seus terrenos terem sido entretanto necessários para instalar uma indústria de salga de pescado.

Uma das particularidades da escavação desta necrópole da Praça da Figueira foi a descoberta de um túmulo enterrado de tijolo e argamassa em forma de arca que Rodrigo Banha garante só ter paralelo em Portugal com um encontrado em Tróia, embora de menores dimensões. Foi também achada uma sepultura cujo esqueleto tinha uma moeda de bronze na boca, um ritual funerário comum na época, para permitir ao defunto que pagasse ao barqueiro do rio da morte, Caronte, a travessia para o outro lado. Ainda segundo este arqueólogo, apesar da inumação ser praticada em Olisipo nos finais do século I a.C. e primeiras décadas do I d.C. – como se observa na necrópole da Rua dos Correeiros e nesta Necrópole Noroeste-, aparentemente a prática da incineração era exclusiva no séc. I d.C. É ainda de referir a utilização constante de alguns edifícios funerários até ao século III d.C. Num segundo momento, entre os séculos II e III d.C., ocorre um período de acentuação desta monumentalidade na zona da Praça da Figueira, uma ocorrência que tem lugar nas cidades mais romanizadas do ocidente.

Esta necrópole teve os seus primeiros vestígios descobertos no decorrer das obras de implantação do Metropolitano de Lisboa, no início de fevereiro de 1961 e a partir daí, graças ao trabalho no local de Irisalva Moita, em fevereiro de 1962, depois continuado por Fernando Bandeira Ferreira, sob os auspícios da Junta Nacional da Educação, tendo ela publicado em 1968, na Revista Municipal, «Achados de época romana no sub-solo de Lisboa». Todavia, em abono da extensão desta necrópole, recordamos que já antes haviam surgido sepulturas e epígrafes no Largo de São Domingos (em 1898) e na Calçada do Garcia (em meados do século XIX). Entre 1999 e 2001, no âmbito da construção do parque de estacionamento subterrâneo da Praça da Figueira, é que se procedeu à escavação integral desta área, trabalhos a cargo do Museu da Cidade de Lisboa, dirigida por Rodrigo Banha,  coadjuvado pontualmente por Marina Carvalhinhos. Em 2002 e 2004 surgiram mais sepultadas na Encosta da Santana e, mais tarde, outros núcleos na Rua das Portas de Santo Antão e na Calçada do Lavra.

© CML | DPC | NT e CAL – Centro de Arqueologia de Lisboa | 2019

 

O Circo romano sob a Praça Dom Pedro IV

 

Na Praça Dom Pedro IV (vulgarmente conhecida como Rossio), estava localizado o Circo romano, edificado no século II ou, segundo outras opiniões, no princípio do século IV.

Na periferia da cidade de Felicitas Iulia Olisipo, fora dos limites definidos pela Muralha Romana Fundacional, ficariam as construções que aconselhavam uma localização isolada como a indústria conserveira, o circo ou as necrópoles. Aliás, o que se sabe até ao momento aponta para que a necrópole da Praça da Figueira tenha coexistido com o vizinho circo durante um certo período de tempo. De acordo com o arqueólogo Rodrigo Banha, entre o Circo e esta necrópole  – a da Praça da Figueira – passaria uma via de acesso ao edifício lúdico.

Esta estrutura  foi descoberta no decorrer das obras de implantação do Metropolitano de Lisboa, graças aos trabalhos realizados por Irisalva Moita em 1961. Nessa década, surgiu uma estrutura em opus signinum ladeada por um murete, com uma largura total de 6 metros (20 pés romanos) e um comprimento indeterminado uma vez que se prolongava pelo subsolo. Na época, julgou-se que seria uma estrutura viária ou portuária mas são as obras do metropolitano para a expansão da rede, em 1994, que permitiram concluir com rigor ser a spina – o elemento central de um circo romano, bem como nela descobrir um plinto, provavelmente de uma estátua, como era característico, para além de se ter exumado parte da arena.

Circo, via e necrópole, segundo Rodrigo Banha (2005)

© CML | DPC | NT e CAL – Centro de Arqueologia de Lisboa | 2019

 

A Rua do Arquitecto-chefe da Exposição do Mundo Português e d’ A Canção de Lisboa, Cottinelli Telmo

Freguesia dos Olivais
(Foto: Google Maps editada pelo NT do DPC)

O Arquiteto-Chefe da Exposição do Mundo Português de 1940 e também realizador do filme A Canção de Lisboa tem o seu nome perpetuado desde o ano de 1971 numa Praça dos Olivais.

Os impasses A1 e A1 – 1 do Plano de Urbanização da Quinta do Morgado passaram a constituir um único arruamento com a denominação de Praça Cottinelli Telmo, pelo Edital municipal de 14 de agosto de 1971, a cerca de um mês de se completarem 23 anos do falecimento deste arquiteto-cineasta. Refira-se ainda que 5 meses antes, o Edital municipal de 15 de março de 1971 colocara em praças próximas os nomes dos também  arquitetos Carlos Ramos e Faria da Costa.

Cottinelli Telmo ficou conhecido por ser o realizador de A Canção de Lisboa, rodada em 1933 nos estúdios da Tóbis Portuguesa, na Quinta das Conchas, no Lumiar, contando com um elenco composto por Beatriz Costa, António Silva,  Manoel de Oliveira (o cineasta), Teresa Gomes ou Vasco Santana.  Este filme estreou no Teatro São Luiz, no dia 7 de novembro de 1933  e tornou-se um modelo para o humor do cinema português das décadas de 30 e 40 do século XX. Diga-se que ainda no decorrer do seu curso de arquitetura, já Cottinelli Telmo havia colaborado  com a Lusitânia-Film, em 1918, na produção dos filmes Malmequer e Mal de Espanha, ambos de Leitão de Barros, e mais tarde, em 1932, em parceria com A.P. Richard, construiu o estúdio da Tóbis Portuguesa.

Animatógrafo, 8 de maio de 1933

O homenageado nesta Praça dos Olivais, de seu nome completo José Ângelo Cottinelli Telmo (Lisboa/13.11.1897 – 18.09.1948/Cascais), formado em Arquitetura pela Escola de Belas Artes de Lisboa no ano de 1920, assinou entre outras obras, o Pavilhão de Honra da Exposição do Rio de Janeiro (com Carlos Ramos e Luís da Cunha em 1922) e o Pavilhão Português da Exposição de Sevilha (1929), a Estação Fluvial do Sul e Sueste (1929-1931), a Standard Eléctrica (1945-1948), o Liceu D. João de Castro (1939), o projeto de construção do Jazigo Roque Gameiro no Cemitério dos Prazeres (1936) e, em 1940, foi o Arquiteto-chefe da Exposição do Mundo Português, tendo delineado o plano da Praça do Império, a sua Fonte Monumental, o Monumento dos Descobrimentos e a Porta da Fundação.

Cottinelli Telmo trabalhara para os Caminhos-de-Ferro (entre 1923 e 1943) e por isso, fora da cidade de Lisboa, foi o responsável pelos edifício de passageiros de Tomar (1932-34) e do Carregado (1933), da Colónia de Férias da CP na Praia das Maçãs (1943) e do Sanatório Ferroviário das Penhas da Saúde (1945). Por solicitação do  ministro Duarte Pacheco, integrou a Comissão das Construções Prisionais e foi assim autor das Cadeias de Alijó, Castelo Branco e Alcoentre (1937-1944), para além de outras obras como o Liceu de Lamego (1931), a Cidade Universitária de Coimbra (1943-1948) e o Plano de urbanização de Fátima. Ainda nesta área  refira-se que dirigiu a revista Arquitectos, no período de 1938 a 1942, e mais tarde, presidiu  ao Sindicato dos Arquitetos (1945-1948), onde foi responsável pela organização do I Congresso da classe, no ano de 1947.

Embora menos conhecido por essas facetas, Cottinelli Telmo foi também bailarino, autor de banda desenhada  – foi o criador do Pirilau, um dos primeiros heróis infantis portugueses, publicado no ABC – , fotógrafo (em campanhas pelo país com Mário Novais) e ainda, ilustrador em jornais e revistas nacionais.

A título póstumo, Cottineli Telmo foi agraciado em 1961 com a Medalha de Ouro da Cidade de Lisboa e o seu nome integra também a toponímia dos concelhos do Amadora, Cascais (Parede), Seixal (Fernão Ferro) e Sintra (Mem Martins).

Freguesia dos Olivais
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Praça António Baião que durante 40 anos dirigiu a Torre do Tombo

Freguesia de Benfica
(Foto: Ortofotomapa de Lisboa Interativa editado pelo NT do DPC)

O historiador António Baião, que durante 40 anos dirigiu a Torre do Tombo, está desde 2004 perpetuado na toponímia de Benfica, numa Praça, que antes era identificada como Praça B à Travessa Sargento Abílio. Aconteceu pelo Edital Municipal de 18 de novembro de 2004, que neste bairro também atribuiu o Largo Ernesto Soares (era o Largo A) e a Praça Laranjo Coelho (era a Praça C), tributo a outros dois historiadores.

De seu nome completo António Eduardo Simões Baião (Ferreira do Zêzere/10.10.1878 – 21.05.1961/Lisboa), dirigiu o Arquivo Nacional da Torre do Tombo, de 10 de março de 1908 até 1948, local onde trabalhava desde 18 de dezembro de 1902, como segundo conservador. É aqui que nasce enquanto investigador e erudito, servindo-se dos acervos da Torre do Tombo e da Academia das Ciências de Lisboa, tendo começado por publicar estudos sobre Herculano e sobre o Visconde de Santarém.

De forma complementar, evidenciou-se com os seus estudos sobre a inquisição como A Inquisição em Portugal e no Brasil (1906), os três volumes de Episódios Dramáticos da Inquisição Portuguesa (1919-1938) e os dois volumes de A Inquisição de Goa (1929-1930), bem como sobre os seus antecessores à frente da Torre do Tombo, especializando-se no que designou como A Infância da Academia (1788-1794) que publicou em 1934.

Refiram-se ainda as suas biografias O Matemático Pedro Nunes e a sua Família (1915) e a Biografia do Santo Condestável (1952) e com Pedro de AzevedoO Arquivo da Torre do Tombo (1905).

António Baião também acumulou durante alguns anos  as funções de diretor da Torre do Tombo com as de auditor administrativo do distrito de Lisboa e de professor do ensino técnico. Entre 1903 e 1905 foi director da Revista Pedagógica, dedicando-se a temas da área das ciências da educação, para além de ao longo da sua vida ter colaborado na revista Serões (1901-1911), nos Anais das bibliotecas, arquivo e museus municipais (1931-1936) e no Boletim cultural e estatístico (1937).

Foi sócio efetivo (1920) da Academia das Ciências de Lisboa, tendo chegado a vice-secretário geral e a diretor dos Portugaliae Monumenta Historica, para além de ter sido sócio fundador da Academia Portuguesa de História, na refundação de 1936, onde foi 2º vice-presidente, 1º vice-presidente e presidente interino.

Filho dos proprietários António Simões Baião e de Emília Cotrim de Carvalho Baião, formou-se Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra em 12 de junho de 1900, tendo sido contemporâneo de Emídio Navarro, de Afonso Lopes Vieira e de Laranjo Coelho e depois até 1902 foi professor do ensino secundário no Liceu de Santarém. Sobre a sua terra natal publicou ainda A Vila e Concelho de Ferreira do Zêzere (1918) e Dois altos funcionários da Casa do Infante D. Henrique no Concelho de Ferreira do Zêzere; um monteiro-mor e outro seu vedor (1960).

O seu nome foi dado à Biblioteca Municipal de Ferreira do Zêzere e está também na toponímia de Almada e de Ferreira do Zêzere.

Freguesia de Benfica
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)