Freguesia da Misericórdia
(Foto: Sérgio Dias)
Eduardo Coelho, o fundador do Diário de Notícias, foi perpetuado com o seu nome na artéria lisboeta em que viveu, no Bairro Alto de todos os jornais, e participou no Cozinheiro dos Cozinheiros (1870) de Paulo Plantier através do envio da receita de Ovos Verdes à Figueirense.
Foi quando o Conde Ottolini era Presidente da Câmara Municipal de Lisboa que por Edital municipal de 18/12/1893 a Rua dos Cardais de Jesus, onde o jornalista viveu, se passou a denominar Rua Eduardo Coelho, com a legenda «Fundador do Diário de Notícias / 1835 – 1889». Contudo, 32 anos depois, quando era Portugal Durão o Presidente da edilidade alfacinha, também um Edital de 15 de junho de 1925 da Comissão Executiva da Câmara registou que na sessão de 20 de fevereiro desse ano se havia deliberado que a alameda de São Pedro de Alcântara se passasse a denominar-se alameda Eduardo Coelho, tanto mais que era o local onde desde 29 de dezembro de 1904 se encontrava o monumento à memória do jornalista – com busto e estátua de Costa Mota (tio) e pedestal de Álvaro Machado – custeado por subscrição pública promovida pelo Diário de Notícias e porém, o espaço continuou a ser vulgarmente conhecido como Jardim de São Pedro de Alcântara.
Monumento a Eduardo Coelho, inaugurado a 29 de dezembro de 1904
(Foto: Rui Mendes)
José Eduardo Coelho (Coimbra/ 23.04.1835 – 14.05.1889/Lisboa) ficou órfão de pai aos 13 anos e a foi mãe mandou-o para Lisboa, para conseguir emprego, já que sozinha não conseguia sustentar a prole de onze filhos, onde se incluía Adolfo Coelho (também nome de rua na Freguesia da Penha de França, desde a publicação do Edital de 13/05/1949). Na capital, Eduardo Coelho começou por trabalhar no comércio mas depois, a exemplo de seu pai, foi aprender o ofício de tipógrafo e mais tarde, em 1857, até ingressou na Imprensa Nacional.
A partir de 1858, Eduardo Coelho viveu principalmente do jornalismo, escrevendo notícias, editando correspondência dos leitores e matérias de correspondentes da província e ainda como crítico de teatro, em jornais como O Conservador, Gazeta de Portugal e Revolução de Setembro, sendo que neste último foi durante 3 anos o responsável pelo noticiário e que António Rodrigues Sampaio, o diretor do jornal, nem sequer depois da fundação do Diário de Notícias quis exonerar Eduardo Coelho do cargo de noticiarista do jornal, pelo que teve de acumular os dois cargos durante algum tempo. Foi também redator principal e diretor da Crónica dos Teatros (1861) e em 29 de dezembro de 1864, com Quintino Antunes, fundou o Diário de Notícias, tendo também sido o primeiro diretor do jornal, cargo que exerceu até ao seu falecimento. Procurou fazer um jornal segundo o modelo de sucesso surgido noutros países, como o Petit Journal parisiense, um jornal popular dirigido a todos os públicos, e não apenas às elites, que por isso alargou as notícias do mundo também para a vida social quotidiana, através do relato de crimes, de incêndios, de casos pessoais ou competições desportivas, para além de diminuir o preço do jornal, contrabalançando esse custo com grandes tiragens e captação de publicidade.
Também algum rendimento conseguia como escritor de peças teatrais, romances e folhetins. Quando ainda trabalhava no comércio lisboeta estreara-se na literatura com a publicação dos versos sarcásticos O Livrinho dos Caixeiros (1852) e continuou essa vocação ao longo da sua vida com obras como Opressão e Liberdade (1862-1871), Amor aos Bofetões (1865) ou Portugal Cativo (1884).
Eduardo Coelho fez ainda assessoria política, nomeadamente como secretário dos políticos José Estêvão e António Feliciano de Castilho e foi um dos fundadores da Sociedade de Geografia de Lisboa.
Para remate de artigo servimos Ovos Verdes à Figueirense, como Eduardo Coelho os fez para Paulo Plantier:
(declaração prévia) – Não me condecoro com a glória de inventar uma receita. declara-o para descanso das cinzas venerandas de Vatel, e tranquilidade de alguns cozinheiros meus amigos, que, aliás, não tinham de que assustar-se com a minha concorrência. cada qual no seu ofício. Homero, segundo a afirmação preciosa de um escritor francês, foi o primeiro que no mundo coligiu os preceitos da arte culinária; Sócrates ensinou os gregos a comer, temperando as comidas como o mais apetitoso dos sais, o sal ático, o sal do espírito com que Platão também adubava as suas ceias; Nereo de Chio soube preparar um congro digno dos deuses; o grande , e imortal Apício, que sucumbiu à pavorosa ideia de poder morrer de fome, tendo as algibeiras recheadas de de ouro, inventou numerosos pratos e tentadores molhos que legaram o seu nome a esta sua remotíssima posteridade de cozinheiros e comilões. Até Lamprias, o próprio Lamprias, o predecessor feliz do inventor de Nabob, compôs um molho, cujo cheiro chegou até nós. Eu, mísero de mim, sem poder ganhar prestígio destes eleitos da mesa e da cozinha, de quem Desaugiers dizia: “Un cuisiner, quand je dine, /Me semble un être divin./Qui du fond de sa cuisine/Gouverne le genre humain.”
Limito-me a contar como se fazem os Ovos verdes à figueirense, pitéu delicioso, que os leitores saborearão com ditíssima explicação. Mãos ao tacho!
Tome-se uma dúzia de ovos e cozam-se. Depois de cozidos cortem-se ao meio e tirem-se-lhes as gemas, conservando inteiras as metades das claras. Pique-se muito miúdo uma cebola, e uma porção equivalente de salsa, deitando-se-lhe uma ou duas colheres de pão ralado, pimenta e algumas pedras de sal. Aloure-se isto num tacho ou frigideira com manteiga de vaca. Amasse-se depois com as gemas dos ovos e com esta massa encham-se as claras. Descanse-se um momento, já que Deus também descansou ao sétimo dia, e respire-se, não de modo que se sopre e espalhe a farinha de trigo que deve estar já preparada, para se dissolver em gema de ovo, a fim de passar as claras recheadas por essa dissolução, para as pôr a corar na frigideira com manteiga de vaca, deitando-as com a face do recheio para baixo. Tiram-se apenas estiverem coradas, e profira-se o “eureka!”, que estão prontos os ovos verdes. Deitem-se estes então num prato coberto, ou numa travessa, e derrame-se-lhe por cima um molho de vinagre destemperado com água, ligeiramente engrossado ao lume com algumas pitadas de farinha e temperado com uma folha de louro. Enfeite-se o prato com vários raminhos de salsa, e… comam-se.
Freguesia da Misericórdia
(Planta: Sérgio Dias)