Coimbra foi o ponto de encontro de Fernando Lopes Graça e José Régio, através do grupo da Presença, e assim permitiu que o primeiro compusesse para a peça Jacob e o Anjo do segundo, quando esteve a ser encenada pela Companhia Rey Colaço – Robles Monteiro, no Teatro Nacional D. Maria II.
Cinco anos mais novo que José Régio, Fernando Lopes Graça recebeu dele o epíteto de revolucionário, pela sua atitude modernista no conservador meio musical português, e musicou poemas do escritor vilacondense.
Lopes Graça chegou a Coimbra em 1932, onde foi professor no Instituto de Música e aí conviveu e colaborou com o grupo da Presença, de 1933 a 1936. Mais tarde, musicará vários poemas de presencistas como a Balada de Coimbra de José Régio ou outros de Adolfo Casais Monteiro. Matriculou-se na Faculdade de Letras em Histórico-Filosóficas, curso que iniciara em Lisboa, mas que não termina por ser novamente preso por razões políticas, desta vez em Caxias e depois de solto, em 1937, partiu para Paris. Mas manteve a ligação a Coimbra através do seu contributo para a Revista de Portugal, fundada e dirigida por Vitorino Nemésio, bem como pela correspondência que manteve desde os anos 30 até final dos anos 60 do século XX com José Régio, João Gaspar Simões, Branquinho da Fonseca, Adolfo Casais Monteiro, Miguel Torga e Albano Nogueira da revista Manifesto, Júlio, António de Sousa, Afonso Duarte ou Alberto de Serpa.
O compositor, maestro, pianista e professor de música que muito enriqueceu o património artístico português Fernando Lopes Graça (Tomar/17.12.1906 – 29.11.1994/Parede) recebeu uma Moção de Pesar da reunião de câmara da edilidade lisboeta logo no dia seguinte ao seu falecimento, o que originou que viesse a dar nome à Rua E da Urbanização do Paço do Lumiar, pelo Edital de 20 de março de 1995.
Na sua obra musical, Lopes Graça começou com a composição de canções com poemas dos maiores vultos da poesia nacional, onde além dos já referidos incluiu Fernando Pessoa e Antero de Quental. Regressado de Paris, faz estadias na casa de João José Cochofel, que o ligam ao grupo do Novo Cancioneiro e aí nascerão em 1945 as Marchas, as Danças e as Canções (Heróicas), com poemas de João José Cochofel, Joaquim Namorado, Carlos de Oliveira, Arquimedes da Silva Santos, Ferreira Monte e Edmundo de Bettencourt, bem como a duradoura colaboração com a revista conimbricense Vértice. Ainda na década de quarenta, Fernando Lopes Graça também compôs exclusivamente para a peça Jacob e o Anjo, partitura inédita até ser apresentada pelo contrabaixista Carlos Barreto em 16 de julho de 2013, no lançamento do livro Jacob e o Anjo – o drama intemporal da condição humana, da autoria de Isabel Cadete Novais, Presidente do Centro de Estudos Regianos.
Lopes Graça começou a trabalhar logo aos 14 anos, como pianista no Cine-Teatro de Tomar. Passados três anos abalou para Lisboa para estudar no Conservatório, onde foi aluno de Adriano Meira (Piano), Tomás Borba (Composição), Luís de Freitas Branco (Ciências Musicais) e, a partir de 1927, de Viana da Mota (Classe de Virtuosidade). De 1928 a 1931 também frequentou o curso de Ciências Históricas e Filosóficas da Faculdade de Letras de Lisboa, mas abandonou-o em protesto contra a repressão feita a uma greve académica.
Fernando Lopes Graça procurou uma linguagem estética portuguesa e definiu o conceito de «música portuguesa» como uma fórmula que exprime uma relação alicerçada na tradição musical do povo, sendo pioneiro no estudo e recolha do folclore nacional, assim como na criação de ciclos de canções com textos de grandes poetas portugueses. Em 1942, fundou a Sociedade de Concertos Sonata, que dirigiu até 1961, dedicada à divulgação da música contemporânea e que se tornou numa referência da vanguarda intelectual.
Como compositor apresentou-se pela primeira vez em 1929, com as Variações sobre um Tema Popular Português, para piano, e com Poemeto, para orquestra de cordas. Destacam-se depois La fièvre du temps (1937), Concerto para piano e orquestra nº1 (Prémio do Círculo de Cultura Musical, 1940), História Trágico-Marítima (Prémio CCM, 1942), Sinfonia per Orchestra (Prémio CCM, 1944), Sonata para piano nº 3 (Prémio CCM, 1952), Quarteto de cordas (Prémio Príncipe Rainier III do Mónaco, 1965), Sete Lembranças para Vieira da Silva (1966), Requiem pelas Vitimas do Fascismo em Portugal (1979), Melodias Rústicas (1979), Charneca em Flor (1981), Meu País de Marinheiros (1981) e Dez Novos Sonetos de Camões (1984).
Fernando Lopes Graça também publicou ensaios sobre música como Introdução à Música Moderna (1942) ou A Canção Popular Portuguesa (1953) e, em 1951 lançou a revista Gazeta Musical.
Finalmente, como cidadão opositor do regime salazarista, Lopes Graça integrou o MUD-Movimento de Unidade Democrática a partir de 1945 e nesse âmbito criou o Coro do Grupo Dramático Lisbonense, mais tarde Coro da Academia dos Amadores de Música, renomeado Coro Lopes-Graça após a sua morte, responsável pela divulgação em todo o país das Canções Regionais Portuguesas e das Canções Heróicas. Também conheceu a PIDE e a prisão política : preso em 1931 no Aljube e, mais tarde, desterrado para Alpiarça; em 1934, bolsa de estudo em Paris, na área da música anulada pela PIDE; nova prisão em Caxias e partida para Paris após ser libertado. Na década de quarenta do séc. XX aderiu ao Partido Comunista Português e, na década seguinte as orquestras nacionais foram proibidas de interpretar obras dele, anularam-lhe o diploma de professor do ensino particular e teve de abandonar a Academia dos Amadores de Música, à qual só regressou em 1972.
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