A Rua Maria Margarida da Cruz Vermelha e o Carlos Paredes do artista Samina

A Presidente da Secção Auxilar Feminina da Cruz Vermelha Maria Margarida Montenegro Fernandes Tomás de Morais, ainda subsiste como topónimo de uma artéria da freguesia do Lumiar, próxima da Avenida Carlos Paredes, bem como da Avenida David Mourão-Ferreira onde o artista Samina realizou um mural dedicado a esse guitarrista e compositor no âmbito da 3ª edição do Festival de Arte Urbana de Lisboa, que decorreu de 23 a 26 de maio último.

João Samina, nascido em 1989 em Setúbal, desde jovem que entrou no mundo das artes plásticas, atraído sobretudo pelo desenho e pela pintura. Aos 14 anos de idade iniciou-se no mundo da arte urbana, discretamente, espalhando pequenos quadros adesivos pelas ruas. Acompanhou a expansão do movimento da arte urbana e foi crescendo com ele, tendo iniciado a pintura com aerógrafo em 2010, a que depois juntou outros elementos das suas raízes artísticas como o design gráfico, a pintura e a arquitetura, com particular uso do preto e azul ou do preto e vermelho como as suas cores primordiais, para concretizar, sobretudo, retratos humanos. São obra sua o mural alusivo ao Mundial de Futebol de 2018 em Portimão, o Künstler da Praça do Comércio de Coimbra,  ou um Big Brother num painel da Mostra de Arte Urbana 2012, organizada pela Galeria de Arte Urbana na Calçada da Glória.

Maria Margarida na inauguração do Bairro da Cruz Vermelha
(Foto: Armando Serôdio, Arquivo Municipal de Lisboa)

A Rua Maria Margarida foi o topónimo atribuído pelo Edital municipal de 27 de outubro de 1966 à  Rua 1 do Bairro Municipal da Cruz Vermelha, para assim homenagear ainda em vida a Presidente da Secção Auxiliar Feminina da Cruz Vermelha, Maria Margarida Montenegro Fernandes Tomás de Morais. O arruamento foi acrescido ainda da Rua A e do Largo B do Bairro da Cruz Vermelha por determinação do Edital municipal de 25 de junho de 1985.

Ao contrário do que era hábito na toponímia de Lisboa desde a criação da Comissão Municipal de Toponímia no ano de 1943, os arruamentos do Bairro municipal da Cruz Vermelha, dados pelo Edital municipal de 27 de outubro de 1966, receberam o nome de pessoas ainda vivas, a saber, o de seis mulheres da Secção Auxiliar Feminina da Cruz Vermelha que naquela década haviam promovido uma campanha nacional de angariação de fundos para a construção do Bairro, tendo perante as câmaras da RTP solicitado um escudo  a cada telespetador – um escudo equivale a cerca de meio cêntimo dos nossos dias -, para se proceder ao realojamento das famílias cujas barracas na Quinta da Feiteira (à Charneca do Lumiar), tinham sido destruídas por um incêndio em 15 de julho de 1963.  As beneméritas ficaram identificadas exclusivamente pelos seus nomes próprios: Rua Maria Carlota (de Maria Carlota Saldanha Pinto Basto), Rua Maria Emília (de Maria Emília Moreira Sena Martins), Rua Maria Helena (de Maria Helena Monteiro de Barros Spínola, mulher de António de Spínola), Rua Maria Ribeiro (de Maria Ribeiro Espírito Santo Silva de Melo) e Rua Maria Teresa (de Maria Teresa Assis Palha Holstein Beck) e esta Rua Maria Margarida. Nos restantes arruamentos a edilidade lisboeta completou a toponímia necessária com a Rua das Duas Marias, a Rua das Três Marias, a Rua das Quatro Marias, a Rua das Cinco Marias e o Largo das Seis Marias.

Da toponímia inicial do Bairro municipal da Cruz Vermelha, popularmente conhecido como das Marias, hoje restam a Rua Maria Carlota e esta Rua Maria Margarida, assim como as outras «Marias» que se juntaram depois: a Rua Maria Albertina (Edital municipal de 25 de junho de 1985) e as Ruas Maria Alice, Maria do Carmo Torres e Maria José da Guia ( Edital municipal de 5 de julho de 2000).

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A Rua Maria Carlota do Bairro da Cruz Vermelha e a cianotipia da Agência Calipo no MURO’19

(Foto: © Bruno Cunha| CML| DPC| 2019)

O pátio nas traseiras dos prédios da Rua Maria Carlota, no antigo Bairro da Cruz Vermelha ou das Marias,  junto à Associação dos Moradores do Bairro da Cruz Vermelha,  é o palco da Agência Calipo no MURO’19 para a realização de wokshops de cianotipia, que têm decorrido nos sábados e domingos deste mês e assim sucederá também nos próximos dias 18, 19, 25 e 26 de maio.

A Agência Calipo junta fotógrafos de distintas linguagens visuais e técnicas fotográficas, que partilham entre si o conhecimento, a discussão de ideias e sobretudo, a vontade de produzir trabalho de qualidade, desde 2014. São eles Alice Wr, Filipe Canário, João José Bica, José Vicente, Luís Vintém, Manuel Falcão Malzbender, Marcin Górski, Mário Tavares e Rui Cartaxo Rodrigues.

Já a Rua Maria Carlota, que foi antes da publicação do Edital identificada como Rua 10 do Bairro Municipal da Cruz Vermelha e hoje liga a Rua Maria do Carmo Torres à Rua Maria José da Guia,  homenageia Maria Carlota de Saldanha Pinto Basto, nascida em Lisboa, na então freguesia da Lapa, em 13 de junho de 1945, filha de Tomás Ferreira Pinto Basto e Maria Carlota da Câmara de Saldanha, sendo irmã de Maria Ana de Saldanha Pinto Basto e de Teresa de Jesus de Saldanha Pinto Basto. Era uma das senhoras da Cruz Vermelha que contribuíram para o nascimento do Bairro da Cruz Vermelha.

Por edital de 27 de outubro de 1966, ao contrário do que era hábito na toponímia da cidade, a Câmara Municipal de Lisboa atribuiu aos arruamentos do Bairro da Cruz Vermelha o nome de pessoas ainda vivas, sendo neste particular o de seis mulheres da Secção Auxiliar Feminina da Cruz Vermelha que naquela mesma década promoveram uma campanha nacional de angariação de fundos para a construção do Bairro, tendo até perante as câmaras da RTP solicitado um escudo  a cada telespetador – um escudo equivale a cerca de meio cêntimo dos nossos dias -, para se proceder ao realojamento das famílias cujas barracas na Quinta da Feiteira (à Charneca do Lumiar), tinham sido destruídas por um incêndio em 15 de julho de 1963.  As beneméritas ficaram identificadas apenas pelos seus nomes próprios: Rua Maria Carlota (de Maria Carlota Saldanha Pinto Basto), Rua Maria Emília (de Maria Emília Moreira Sena Martins), Rua Maria Helena (de Maria Helena Monteiro de Barros Spínola, mulher de António de Spínola), Rua Maria Margarida (de Maria Margarida Montenegro Fernandes Tomás de Morais, a presidente da Secção Feminina da Cruz Vermelha), Rua Maria Ribeiro (de Maria Ribeiro Espírito Santo Silva de Melo) e Rua Maria Teresa (de Maria Teresa Assis Palha Holstein Beck), acrescentando ainda nos arruamentos restantes do Bairro, a Rua das Duas Marias, a Rua das Três Marias, a Rua das Quatro Marias, a Rua das Cinco Marias e o Largo das Seis Marias, pelo que não é de estranhar que popularmente o Bairro também fosse conhecido como o «Bairro das Marias».

Desta toponímia inicial do Bairro hoje restam apenas esta Rua Maria Carlota e a Rua Maria Margarida. Nos anos oitenta do século passado, pelo Edital municipal de 25 de junho de 1985 foi acrescentada a Rua Maria Albertina, em homenagem a uma cantora de temas populares e de fado, pelo que quando o Bairro cresceu em mais três arruamentos, o Edital municipal de 5 de julho de 2000, colocou lá os nomes de mais três cantoras e fadistas, todas marianas: Maria Alice, Maria do Carmo Torres e Maria José da Guia.

Nos anos sessenta do séc. XX, a edilidade lisboeta adquiriu um terreno de seis hectares da Quinta da Feiteira para aí ser edificado o Bairro da Cruz Vermelha correspondendo à campanha então lançada. A inauguração oficial teve lugar em 13 de dezembro de 1966, com a entrega de chaves de 230 fogos, não só às famílias vítimas do incêndio que despoletou a contrução do Bairro, mas também a outras que a campanha «Dez Tostões para uma Casa» do jornal Diário de Notícias permitiu acrescentar. No ano seguinte, em janeiro, a CML adjudicou a construção do grupo escolar do Bairro a António Augusto Freire e a inauguração oficial teve lugar a 27 de outubro, com a presença do Presidente de então da edilidade, António Vitorino França Borges. Ainda em 1967, em outubro, foi também adjudicada a construção do edifício com  salão de festas e já em janeiro de 1968 foi adjudicada também a construção de uma creche, a  José Matias e em 1969, foi a vez da biblioteca.

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A Rua Possidónio da Silva na Fonte Santa

Em 1965
(Foto: Artur João Goulart, Arquivo Municipal de Lisboa)

Joaquim Possidónio Narciso da Silva, arquiteto e arqueólogo de quem o  olisipógrafo Júlio de Castilho foi biógrafo, ficou na memória das placas toponímicas de Lisboa desde o final do séc. XIX, logo no ano seguinte à sua morte (1897), na Rua da Fonte Santa, artéria onde em  1 julho de 1863 fundara o Albergue dos Inválidos do Trabalho e no mesmo ano em que com outros também fundara a Real Associação dos Arquitectos Civis e Arqueólogos Portugueses.

Foi por via da deliberação camarária de 6 de maio de 1897 e consequente Edital municipal de 17 de maio a Rua Possidónio da Silva nasceu no ano seguinte ao falecimento do homenageado, substituindo o topónimo Rua da Fonte Santa, por neste arruamento estar sediada a instituição que fundara seis anos antes para acolher operários idosos ou inválidos, o Albergue dos Inválidos do Trabalho que em 1978 foi incorporado na associação Inválidos do Comércio.

Boletim da Associação Portuguesa de Arqueólogos, nº 2 de 1913

Joaquim Possidónio Narciso da Silva  (Lisboa/07.05.1806 –  23.03.1896/Lisboa) distinguiu-se ao longo da sua vida como um defensor da preservação do património cultural português, quer através dos artigos que publicava nos jornais quer como precursor do ensino e da investigação arqueológica na salvaguarda e valorização do património histórico-artístico e monumental português. Aliás, Possidónio da Silva foi pioneiro em Portugal na utilização da fotografia como forma de defesa do património. A partir de 1861 editou a Revista Pittoresca e Descriptiva de Portugal, que incluiu fotografias de 26 elementos do património arquitétónico português.

Tendo participado em escavações, desde 1850 que se interessara pelos monumentos megalíticos em Portugal e escavou duas antas em Tomar. Depois, em 1858, D. Pedro V encarregou-o de fazer o primeiro levantamento dos monumentos nacionais. Em 1863 fundou a Real Associação dos Arquitectos Civis e Arqueólogos Portugueses, a que também presidiu até 1866 e novamente de 1871 até ao seu falecimento. É desta associação que vai nascer em 1866 um museu arqueológico, instalado nas ruínas do Convento do Carmo. Possidónio da Silva deu um curso gratuito de Arqueologia na sede da Associação e em 1878 publicou Noções Elementares de Archeologia, uma síntese dos métodos de escavação estratigráfica e setorial. Recorde-se que foi desta associação, da secção de Arqueologia Olissiponense, que nasceu o Museu da Cidade de Lisboa, instalado pela primeira vez na sede associativa em 1922.

Filho de Reinaldo José da Silva e de Maria Luísa Narcisa da Silva, Possidónio passou a sua juventude no Rio de Janeiro, para onde  partira bebé com a família por causa da invasão napoleónica de 1807, já que o seu pai era Mestre Geral dos Paços Reais. Regressou em 1821 e estudou com Domingos Sequeira, Maurício Sendim e Germano de Magalhães, seguindo aos dezoitos anos para Paris para estudar Arquitetura e cinco anos mais tarde, para Roma. Em 1831 regressou a Paris e trabalhou no Palais Royal e no Palácio das Tulherias. Dois anos depois regressou a Portugal e publicou O que foi e é a architectura, e o que aprendem os architectos fora de Portugal. A seguir, tornou-se o arquiteto da Casa Real, tendo adaptado o Palácio de São Bento para Parlamento (1833-1834) pelo que foi condecorado com o Colar da Torre e Espada. Foi também autor dos projetos não concretizados  do Palácio da Ajuda (1834) e de uns balneários públicos no Passeio Público (1835). Traçou também a remodelação do Palácio das Necessidades (1844-1846), do Palácio do Alfeite (antes de 1857), bem como do Teatro de São Carlos e do Palácio do Manteigueiro – na esquina da Rua da Horta Seca com a Rua da Emenda-, tendo ainda delineado muitos estabelecimentos comerciais da Baixa lisboeta dessa época e ainda, um bairro novo na quinta do Calvário.

Em 1882, o escultor francês Anatole Vasselot fez um busto de bronze de Possidónio da Silva mas este nunca permitiu a divulgação da sua imagem em nenhum meio até à sua morte e assim, este busto apenas foi  inaugurado em 5 de julho de 1968, colocado sobre um pedestal de pedra na Praceta da Rua Possidónio da Silva. Em 1916, passou também a ser o topónimo de uma Travessa próxima da Rua Possidónio da Silva e o seu nome faz também parte da toponímia dos concelhos de Mem Martins e do Seixal (em Fernão Ferro). Júlio de Castilho coligiu e organizou cronologicamente a  Correspondência artística e científica, nacional e estrangeira com J. Possidónio da Silva, documentação que encadernou e legou à Torre do Tombo em 8 de julho de 1915. O filho de Possidónio, Ernesto da Silva (1868 – 1913) também é topónimo de uma Rua e de um Largo lisboetas, na freguesia de Benfica.

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Freguesias da Estrela e de Campo de Ourique
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Rua Nogueira e Sousa, o benemérito morador do Coração de Jesus

Freguesia de Santo António
(Foto: Google Maps editada pelo NT do DPC)

Em 1919, Lisboa acolheu a Rua Nogueira e Sousa no Bairro Camões da Freguesia Camões, conforme determinação do Edital municipal de 18 de julho, para ligar a Rua Luciano Cordeiro à Travessa de Santa Marta, em cumprimento da deliberação de 10 de julho da Comissão Executiva da Câmara.

Este topónimo resultou de uma proposta do Vereador Augusto César de Magalhães Peixoto,  na reunião de 10 de julho de 1919 na Comissão Executiva da Câmara Municipal de Lisboa, em cuja ata se pode ler: «existindo no Bairro Camões, uma pequena via pública, sem denominação, que comunica a Rua Luciano Cordeiro com a Travessa de Santa Marta, e havendo, em sessão de 12 de Junho de 1901, o Vereador Sr. Francisco da Costa Brito, proposto que a tal via pública, então em construção, se desse a denominação de Rua Nogueira e Sousa, em homenagem aos actos de grande filantropia praticados por êste individuo, falecido há mais de dez anos, ainda hoje evidenciados pelos legados que deixou à Misericórdia de Lisboa, Hospital de S. José, Albergue dos Inválidos do Trabalho, etc., e Considerando que o aludido filantropo habitou sempre a Freguesia do Coração de Jesus (hoje Camões) e que os seus descendentes , continuam perpetuando a memória do falecido, continuando a sua obra cheia de benemerência e altruísmo».

Assim, o benemérito Nogueira e Sousa, falecido antes de 1891, que sempre foi morador na Freguesia do Coração de Jesus, viu a sua filantropia reconhecida pela edilidade que guardou a sua memória numa nova artéria da freguesia em que ele residira.

Desconhecem-se mais elementos sobre o homenageado mas nos arquivos municipais encontramos um documento referente a alguém com os mesmos apelidos com data de 4 de fevereiro de 1884: um donativo de dois mil réis , de Maria das Dores Nogueira e Sousa, residente na Rua do Passadiço n.º 44 – 1.º ,  a favor das festas religiosas do Sagrado Lausperene e da Senhora da Fé, da Irmandade de São José dos Carpinteiros.

Falta dar uma pequena nota sobre a freguesia do Coração de Jesus que foi fundada a 11 de Fevereiro de 1770. É nela que a partir de 1878, nos terrenos da quinta do Conde de Redondo, que atravessava dificuldades financeiras, começou uma urbanização promovida pela Companhia Bairro de Camões, com a Rua Sociedade Farmacêutica a ser a primeira artéria aberta. A inauguração oficial do Bairro Camões ocorreu em 9 de junho de 1880, no âmbito das comemorações do tricentenário da morte de Luís Vaz de Camões, tendo sido armado um coreto-pavilhão nos jardins do Palácio do Conde de Redondo para o efeito.

Freguesia de Santo António
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

 

A Rua do dono da Fábrica Alves Gouveia

Freguesia dos Olivais
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

Francisco Alves Gouveia era o proprietário de uma estamparia que criou nos Olivais, assim como de um bairro para os seus operários, sito no arruamento entre a sua fábrica e a igreja, então denominado Rua das Casas Novas, mas que mais tarde virá a ser a Rua Alves Gouveia.

Tudo começa em 1874 quando o  industrial Francisco Alves Gouveia funda na antiga Quinta das Casas Novas, nos Olivais, a  Fábrica Francisco Alves Gouveia. Era uma  estamparia de tecidos, com tinturaria e branqueamento de algodões que gradualmente se foi expandindo para fora dos limites da primitiva quinta onde foi construída, sendo que  três anos depois do início da laboração, em 1877, empregava já mais de 200 operários.  Esta unidade fabril produzia chitas, zuartes (gangas azuis), lenços de cores e algodões branqueados, onde os processos manuais se mantiveram por mais de três décadas coexistindo com máquinas a vapor. O caminho-de-ferro nascera cerca de 20 anos antes, em 1856, a ligar Lisboa ao Carregado, tendo os Olivais uma estação própria que facilitava o escoamento de produtos.

Supomos que o industrial Alves Gouveia tenha falecido nos anos trinta do séc. XX, uma vez que a sua esposa  Maria José Marques Alves Gouveia comprou em 24 de agosto de 1932 um terreno no Cemitério do Alto de São João para a construção do jazigo (que ficou com o n.º 5618). Também porque a Fábrica mudou de nome em 1935 passando a designar-se União de Estamparia, Lda. e desde 1944 tornou-se a F. A. Gouveia Lda., denominação sob a qual solicitou à Câmara Municipal de Lisboa licença para demolição dos edifícios da fábrica de estamparia, na zona sul da Avenida de Berlim, em 18 de setembro de 1973, tendo assim esta empresa laborado quase cem anos.

Já o bairro operário disposto ao longo de um arruamento que virá a ser a Rua Alves Gouveia, surge oito depois do início da laboração da fábrica, em 1882, para as casas dos números pares, datando as dos  números ímpares de 1889. Francisco Alves Gouveia mandou construir  um bairro com habitações de renda económica para os seus trabalhadores,  no arruamento que se estendia desde a fábrica até à Igreja de Santa Maria e que nessa época se denominava Rua das Casas Novas. Alves Gouveia também mandou edificar um prédio no largo do rossio da Igreja, de maior volumetria e qualidade estética, provavelmente para os empregados técnicos e administrativos. Este bairro operário só ficou totalmente concluído em 1907 e a sua única artéria, que era também a principal via dos Olivais Velho, foi nomeada Rua Alves Gouveia, conforme aparece já na planta de Silva Pinto de março de 1907. Alves Gouveia também mandou construir no local uma escola primária para os operários e os filhos destes, bem como um clube de bairro, embora de todo o conjunto industrial e social edificado por este empresário hoje só sobrevivam as habitações operárias.

Finalmente, refira-se que nos Olivais de 1891 a 1896, foi erguido um chafariz, um coreto – onde então a Filarmónica Capricho Olivalense abrilhantava os bailes de domingo – e ainda, um urinol público em ferro, no Rossio dos Olivais delineado após o terramoto de 1755 (é a Praça da Viscondessa dos Olivais desde 22 de julho de 1892), que alguns estudiosos apontam ter sido Francisco Alves Gouveia o mecenas destes equipamentos.

Freguesia dos Olivais
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

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A Rua do Instituto Dona Amélia junto à Avenida 24 de Julho

Freguesia da Misericórdia
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

Junto ao então edifício da Assistência Nacional aos Tuberculosos nasceu em 1947 a Rua do Instituto Dona Amélia, a ligar a Avenida 24 de Julho à Rua da Ribeira Nova.

Nas suas visitas regulares a arruamentos de Lisboa para estudar a nomenclatura a atribuir-lhes, a Comissão Municipal de Toponímia de Lisboa decidiu em 22 de maio de 1946 propor «que o arruamento sem nome que começa na Avenida Vinte e Quatro de Julho e finda na Rua da Ribeira Nova, entre o Mercado Vinte e Quatro de Julho e o edifício da Assistência Nacional aos Tuberculosos, tenha a denominação de Rua do Instituto Dona Amélia», a que a edilidade respondeu favoravelmente atribuindo esse topónimo através do Edital municipal de 18 de dezembro de 1947.

Quando a tuberculose era uma doença temível,  com uma taxa de cerca de 297 a 396 mortes por 100 mil habitantes, a Rainha D. Amélia de Orleães e Bragança (1865 – 1951), fundou a Assistência Nacional aos Tuberculosos através da Lei de 17 de agosto de 1899, a primeira instituição oficial portuguesa de luta contra a tuberculose. A sede abriu em 1906 no Instituto Rainha D. Amélia, na então Rua 24 de Julho ( e Avenida depois de 1928). Começou por ser uma associação de beneficência, que recolheu à época uma enorme adesão e cuja lei potenciou a disseminação um pouco por todo o país de hospitais, sanatórios e dispensários para combater a tuberculose.

Em 1911 foi criada uma Comissão permanente incumbida de estudar a reorganização geral da Assistência Geral aos Tuberculosos e de propor acções profiláticas e de assistência, de carácter oficial ou privado. Todavia, a proliferação da tuberculose levou à criação em 1924, de um fundo de assistência aos tuberculosos ferroviários, para a construção e manutenção de sanatórios.

Em 1931 foi criado o lugar de diretor dos serviços gerais da Assistência Nacional aos Tuberculosos e uma Comissão encarregada de apresentar um projeto de reorganização dos serviços  tendo quatro anos depois sido aprovados novos estatutos. Em 7 de novembro de 1945 (Decreto-Lei n.º 35.108) foi criado o Instituto Nacional de Assistência aos Tuberculosos (IANT) que absorveu a Assistência Nacional aos Tuberculosos criada pela Rainha D. Amélia.

Em 1975 foi criado o SLAT – Serviço de Luta Anti-Tuberculosa (Decreto-Lei 260/75 de 26 de maio) que foi absorvendo progressivamente as atribuições do Instituto Nacional de Assistência aos Tuberculosos para na década de noventa tudo ficar na tutela da Administração Regional de Saúde de Lisboa.

Freguesia da Misericórdia
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

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As Escadinhas da Rocha e a Escadaria José António Marques

A Escadaria José António Marques – Freguesia da Estrela
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

A ligar a então Rua 24 de Julho (desde 1928 é a Avenida 24 de Julho) ao Jardim das Albertas (desde 1925 é o Jardim Nove de Abril) foi construída uma escadaria entre 1887 e 1892, vulgarmente conhecida por Escadinhas da Rocha ou Escadinhas da Rocha Conde de Óbidos.

Quase um século depois, em 1985, foi atribuído ao espaço o topónimo Escadaria José António Marques pelo Edital municipal de 21/02/1985, para homenagear o fundador da Cruz Vermelha Portuguesa (Lisboa/29.01.1822 – 08.11.1884/Lisboa) no centenário do seu falecimento, junto da sede a instituição no Jardim Nove de Abril, instalada desde 1919 no palácio do primeiro Conde de Óbidos, D. Vasco de Mascarenhas, construído no segundo quartel do séc. XVII.

A edilidade lisboeta no programa das condições para fornecimento de uma grade de ferro para a parte superior da escadaria, de acordo com o desenho de Augusto César dos Santos, em 5 de setembro de 1891, denomina-a escadaria à Rocha do Conde de Óbidos enquanto os postais de 1910 a designam como Escadas da Rocha de Conde d’Óbidos e os de 1920 apenas com Rocha de Conde d’Óbidos. A coincidência de ambos os topónimos radicarem no mesmo palacete faz com que ainda hoje ambos os topónimos sejam usados para este arruamento.

As Escadinhas da Rocha, em construção, em 1891 (Foto: Arquivo Municipal de Lisboa)

 

A Rua do fadista humorístico Joaquim Cordeiro

Freguesia de Santa Clara
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

Cinco anos após o seu falecimento,  o fadista humorístico Joaquim Cordeiro passou a dar o seu nome a uma artéria do Bairro dos Sete Céus, na freguesia de Santa Clara, em 1987, a partir de uma sugestão de um munícipe.

O munícipe Manuel Cabaço, indicou vários nomes para se preencher a toponímia do Bairro dos Sete Céus e assim, o Impasse 4 do Bairro dos Sete Céus passou a ser a Rua Joaquim Cordeiro pelo Edital municipal de 30 de janeiro de 1987. Pelo mesmo edital a Câmara lisboeta atribuiu mais 5 topónimos nesse Bairro, sendo quatro provenientes da sugestão já referida: os dedicados ao poeta Vasco de Lima Couto (Impasse 3) cujos poemas serviram muitos fados, ao poeta popular Rua António Aleixo (Impasse 6), à cantora lírica Maria Júdice da Costa (Impasse 5) e ao músico setecentista João Lourenço Rebelo (Impasse 2). Somou-se ainda o poeta Ruy Cinatti (Impasse 1) para denominar o arruamento restante já que da sugestão inicial do munícipe não foi aproveitado o nome de Adriano Correia de Oliveira.

Joaquim dos Anjos Cordeiro (Lisboa/20.03.1903 ou 1904-18.11.1982/Faro), por alguns considerado o fadista mais popular de Lisboa, impôs-se no fado da década de quarenta do séc. XX ao mudar-se  do fado castiço para o fado humorístico e jocoso,  com um estilo próprio, por influência de Vasco Santana. Cantava fados como Belchior no JapãoBendito seja o descansoBom Conselho, Casa Bera (versão cómica de Uma Casa Portuguesa), Estranha Vida do Diabo (reformulação de Estranha Forma de Vida), Guitarra não os acordes,  O Homem que sabia demaisNão me falem da SeveraÓ Rita Volta p’ra Casa ( uma hilariante versão de O Tempo Volta para Trás), No Tasco do Zé Pinguinhas (versão da Casa da Mariquinhas), Reza-te a sina, Trabalho, vai-te embora ( a partir da Saudade vai-te embora de Tony de Matos),  O vinho mora em LisboaZé Caloteiro (uma versão jocosa do  Fado do Cacilheiro) ou Zé Vigarista.

Joaquim Cordeiro começou a cantar fado em retiros e tascas alfacinhas com 11 anos de idade, mas após a morte da mãe, foi viver com o seu tio Carlos Cordeiro, sapateiro e poeta popular, que lhe ensinou o ofício e lhe deu algumas das  letras que depois virá a cantar em fado. Cumprido o serviço militar no país e em Angola (1927-1929) começou a sua carreira profissional de fadista em 1929, no Bar Anjos e no Café Luso. Em 1931, mudou-se para Olhão embora em 1943 tenha regressado a Lisboa. Ganhou o epíteto de «Rei do Riso» e apresentou-se em várias casas de fado, como o Retiro dos Marialvas e o Café Latino, contando com António Chainho e Carlos Gonçalves entre os guitarristas que o acompanharam. Nos letristas, usou mais Aureliano Lima da Silva, Armando Coutinho Dias e Domingos Gonçalves Costa. Colaborou com a Emissora Nacional nos Serões para Trabalhadores, assim como com a RTP, tendo ainda integrado os agrupamentos Estrelas de Portugal e Caravana de Vedetas que promoveram espetáculos em Portugal, Angola e Moçambique.

Numa outra faceta, Joaquim Cordeiro coordenava uma festa de beneficência da Associação Os Amigos do Minho, para angariar fundos para as crianças necessitadas, que se realizava anualmente no dia 8 de dezembro e em cujo elenco artístico costumava incluir Fernando Maurício, Amélia Maria, David José, Fernando Manuel, Joaquim Silveirinha, José Gomes e Tristão da Silva (pai). Sabe-se também que foi ele que em 1955 inscreveu Julieta Estrela no concurso Rainhas das Cantadeiras e Ases do Fado, organizado pelo jornal A Voz de Portugal, que ela ganhou (ex-aqueo com Florinda Maria) e assim também a carteira profissional.

Freguesia de Santa Clara
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Rua de Francisco Lourenço da Fonseca que enriqueceu no Brasil e foi vereador lisboeta

Freguesia de Alvalade

Desde 1956 que a Rua Francisco Lourenço da Fonseca homenageia, na freguesia de Alvalade, o comerciante que enriqueceu no Brasil e foi vereador da autarquia lisboeta no biénio de 1876 e 1877.

Foi através da publicação do Edital municipal de 26 de maio de 1956 que a Rua 37 A do Sítio de Alvalade passou a ter como topónimo oficial Rua Francisco Lourenço da Fonseca. O mesmo Edital colocou nas artérias circundantes os pintores do Grupo do Leão, António Ramalho, Cipriano Martins, João Vaz, Moura Girão e Ribeiro Cristino, o elemento dos Vencidos da Vida Carlos Mayer, o autor da letra do Hino Nacional Lopes de Mendonça e ainda, o Largo de Alvalade.

O comerciante Francisco Lourenço da Fonseca (Vila Nova de Gaia/10.08.1818 ou 1819– 09.03.1906/Dafundo) fez fortuna no Brasil, para onde emigrou,  e após regressar a Portugal em 1862, foi eleito vereador da Câmara Municipal de Lisboa, nos anos de 1876 e 1877, sob a presidência de Luís de Almeida e Albuquerque e a vice-presidência de Rosa Araújo. Nesse biénio, Francisco Lourenço da Fonseca deteve a responsabilidade das obras públicas municipais, tendo-se  destacado por produzir melhoramentos nos Jardins da Estrela e de São Pedro de Alcântara,  requisitar um arquiteto ao Ministério das Obras Públicas para as obras do município, reconstruir as Escadinhas da Barroca, bem como por  ter iniciado a expropriação de terrenos para a abertura de uma avenida a norte do Passeio Público, que viria a ser a Avenida da Liberdade mandada executar por Rosa Araújo. Francisco Lourenço da Fonseca foi ainda tesoureiro da Comissão Central 1° de Dezembro que promoveu a construção do Monumento aos Restauradores.

Francisco Lourenço da Fonseca, comendador  da Ordem de Cristo, foi ainda diretor do Asilo de Santa Catarina –  internato feminino instalado desde 1858 no complexo conventual de São João Nepomuceno, no Largo São João Nepomuceno  –, e casado com Maria José Oliveira Gaia ( Brasil- Rio Grande do Sul/19.02.1832 – 06.05.1912/Lisboa), de quem teve 4 filhos: Francisco Lourenço da Fonseca Júnior (Brasil – Rio Grande do Sul/06.06.1848 – 06.07.1902/Lisboa), Wenceslau da Fonseca (n. 1850), Álvaro da Fonseca (n. Brasil – Rio Grande do Sul/15.02.1855) e Alfredo da Fonseca (n. Lisboa – Freguesia de Santa Catarina/04.08.1862).

Freguesia de Alvalade
(Planta: Sérgio Dias)