A Rua Augusta e a Praça do Comércio

A Rua Augusta e a Praça do Comércio antes de 1873
(Foto: © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

A Rua da Augusta Figura do Rei leva-nos a direito para a estátua do monarca que homenageia: D. José I, o soberano que inaugurou em Lisboa a prática da atribuição de nomes de ruas por decreto.

É dele a Portaria de 5 de novembro de 1760 no qual se estabelece a denominação dos arruamentos da Baixa lisboeta reconstruída sob o plano de Eugénio dos Santos e Carlos Mardel«entre as Praças do Comercio e a do Rocîo», ao mesmo tempo que se regulamenta a distribuição dos ofícios e ramos do comércio pelas diferentes 14 artérias: «Rua Nova d’El Rey  [hoje, Rua do Comércio], Rua Augusta, Rua Áurea, Rua Bella da Rainha  [hoje, Rua da Prata], Rua Nova da Princesa  [hoje Rua dos Fanqueiros], Rua dos Douradores, Rua dos Correeiros, Rua dos Sapateiros, Rua de S. Julião, Rua da Conceição, Rua de S. Nicolau, Rua da Victoria, Rua da Assumpção e Rua de Santa Justa».

Na Rua Augusta deviam alojar-se os mercadores da seda e da lã e, quinze anos depois, a 6 de Junho de 1775 foi colocada no enfiamento da artéria, na Praça do Comércio, a estátua equestre de D. José, feita por Machado de Castro. Quase um século mais tarde, em 1873, foi rematada a Rua Augusta com um Arco Triunfal, da autoria de Veríssimo José da Costa.

Esta rua, que faz a ligação entre as duas praças principais pré-terramoto, o Terreiro do Paço e o Rossio, ambas mantidas e realinhadas no plano de reconstrução da baixa da cidade, será o eixo central da malha urbana da Baixa que hierarquiza os arruamentos através da sua largura e tipologia dos edifícios e cujo rigor geométrico remete para a planificação e organização de estruturas militares. O planeamento, a racionalidade e o pragmatismo, valores intrínsecos ao Iluminismo, estão assim presentes como alicerces fundamentais da nova imagem que se pretendia para uma das mais movimentadas capitais europeias.

A visão perspética a partir do Rossio que conduz a uma Praça, a do Comércio, é fortemente cenográfica e ao gosto oitocentista que através desta tipologia definia espaços amplos de representação simbólica do poder. Classificada como Monumento Nacional em 1910 (Decreto n.º 136, de 23-06-1910), a nova Praça é considerada uma obra de referência do séc. XVIII na genealogia das suas congéneres europeias tendo um aspeto inovador: uma das suas faces é total e simbolicamente aberta sobre o rio Tejo.

O programa da Praça do Comércio, tipologicamente associado às “praças reais” francesas e à semelhança destas, previa desde o início a colocação de uma estátua do rei no centro geométrico de um triângulo equilátero no alinhamento da então Rua da Augusta Figura do Rei e que viria a ser a primeira estátua equestre realizada em Portugal. Cerca de 100 anos depois da sua inauguração, cujos festejos se adequaram à solenidade do momento, em 1873 foi terminado o Arco do Triunfo colocado a norte da Praça cuja construção estava prevista desde 1759 nos planos de reconstrução da baixa com desenho de Eugénio dos Santos e que enquadra cenograficamente a estátua. Ficava assim terminado um percurso de afirmação de poder expresso em diferentes momentos: a Rua Augusta e o Arco, a Praça do Comércio e Estátua do monarca D. José I.

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Jardim Botânico

O Jardim Botânico da Ajuda na planta de Silva Pinto de 1908
(Foto: © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O Jardim Botânico da Ajuda foi o primeiro de Lisboa, nascido no ano de 1768, e ficou registado na memória toponímica lisboeta 148 anos depois, na Rua do Jardim Botânico, que faz a ligação da Calçada da Ajuda à Calçada do Galvão, pelo Edital municipal de 26 de setembro de 1916 que oficializou 56 artérias da Ajuda.

O Jardim Botânico da Ajuda foi fundado em 1768, de acordo com o desenho do botânico italiano Domingos Vandelli (1735-1816), chamado de Pádua pelo rei D. José I, por influência de Miguel Franzini, mestre dos príncipes e com o intuito de servir para a educação destes. O espaço escolhido foram os terrenos arborizados que haviam sido da Quinta do Conde da Ponte e que D. José I em boa hora adquiriu para cultura de frutas e hortaliças necessárias ao palácio real, instalado na Ajuda após o terramoto de 1 de novembro de 1755. No Jardim se procurou estudar e colecionar o máximo de espécies do mundo vegetal, tendo tido 5000 espécies dispostas segundo o sistema sexual proposto por Lineu, que fora mestre de Vandelli.

Em 1765, Domingos Vandelli ficou com o encargo de delinear e dirigir as obras do Real Jardim Botânico da Ajuda enquanto o ministro da Marinha, Francisco Xavier de Carvalho, irmão do Marquês de Pombal, as devia fiscalizar. Domingos Vandelli dirigiu o então denominado Real Jardim Botânico da Ajuda de 1768 a 1774 e o 2º diretor foi o botânico Félix de Avelar Brotero, de 1811 a 1828, altura em que por ordem de D. João VI o Jardim foi aberto ao público às quintas-feiras. Por decreto de 27 de agosto de 1836,o Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda foi confiado à administração da Academia das Ciências de Lisboa mas passados dois anos, a partir de 1838-1839 o Jardim Botânico da Ajuda passou para a tutela da Escola Politécnica e a ser usado pelos seus alunos. Em 1874, o Jardim foi entregue à administração da Casa Real, altura em que decaiu progressivamente.

Já no século XX, em 1910, o Jardim Botânico da Ajuda passou a integrar o património nacional e em 1918 foi entregue ao Instituto Superior de Agronomia permitindo assim que em 1934, sob a direção do Prof. André Navarro, o Prof. Caldeira Cabral estabelecesse o traçado dos canteiros do tabuleiro superior, que se tinha perdido completamente. Entre 1993 e 1997, com o apoio do Prémio de Conservação do Património Europeu e do Fundo de Turismo, sob a orientação da Profª. Cristina Castel-Branco, foi restaurado o Jardim, com a recuperação da coleção botânica, do sistema de rega e a instalação do Jardim dos Aromas.

O outro Jardim Botânico de Lisboa pertence ao Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MUHNAC) e data de 1878. Foi por iniciativa do Conde de Ficalho que em 1873 se iniciaram os trabalhos deste novo jardim que esteve aberto ao público desde 1878 e está classificado como Monumento Nacional desde 2010, integrando todo o património artístico (esculturas) e edificado que nele se encontra: Observatório Astronómico da Escola Politécnica, Edifício dos Herbários, Estufas, Palmário e ainda, a antiga estufa em madeira.

Por definição, um jardim botânico é o local onde se colecionam plantas e onde estas são cultivadas e identificadas, sendo ao longo do tempo utilizados com diversas finalidades. Assim, os que surgiram na Europa no séc. XVI, então denominados «hortus medicus» (jardins de plantas medicinais), tinham como finalidade o fornecimento de plantas às boticas e serviam de apoio ao estudo da medicina. Já nos séculos seguintes, passaram sobretudo a ser utilizados como locais de plantação e estudo de novas espécies vegetais exóticas trazidas para o continente europeu.

O Jardim Botânico da Ajuda não foi exceção, acolhendo plantas e sementes vindas de outros jardins, mas sobretudo oriundas dos territórios portugueses na América, África e Ásia e das ilhas atlânticas, viabilizando a observação direta, a análise e interpretação da natureza, imperativo filosófico e científico que decorreu dos novos postulados do Iluminismo. Este espaço, ornamentado com esculturas e artes decorativas, construído na proximidade da Real Barraca, desde o seu início que foi pensado e criado em torno de várias premissas que se mantiveram até à atualidade: ser um espaço lúdico e de lazer; e, ser um espaço de aprendizagem e de produção de conhecimento.

O jardim Botânico da Ajuda em 1973
(Foto: Artur Pastor © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

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Escola Politécnica

A Escola Politécnica em inícios do séc. XX (Foto: Augusto Bobone © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

Rua da Escola Politécnica é o topónimo que consagra o estabelecimento de ensino superior que naquele arruamento foi fundada em 1837- a Escola Politécnica –, nas instalações que haviam sido do Colégio dos Nobres (1766) e ainda antes, do Noviciado da Companhia de Jesus (1619) na Cotovia.

A Rua da Escola Politécnica, que une a Praça do Príncipe Real ao Largo do Rato, nasceu do Edital do Governo Civil de Lisboa de 1 de setembro de 1859 que determinou que a Rua da Patriarcal Queimada e a Rua Direita da Fábrica das Sedas passassem a constituir um único arruamento com a denominação de Rua da Escola Politécnica.

Conta Norberto de Araújo nas suas Peregrinações que «Esta artéria, rasgada como larga serventia entre as quintas do Noviciado da Companhia de Jesus e a de D. Rodrigo, fazia a ligação do sítio da Cotovia com o de Campolide, que começava – já o disse – onde veio a ser o Rato. Antes do Terramoto a rua tinha duas designações para cada um dos seus troços: Rua Direita da Fábrica das Sedas até ao Palácio dos Soares (depois Imprensa Nacional), daí para diante até à actual Praça do Rio de Janeiro [desde 1948 corresponde à Praça do Príncipe Real] era Rua do Colégio dos Nobres, designação que sucedeu à de Rua Direita da Cotovia. Em Setembro de 1859 passou toda a artéria a ser Rua da Escola Politécnica». Em resumo, a Rua Direita da Cotovia passou a ser Rua do Colégio dos Nobres que mais tarde se torna Rua da Patriarcal Queimada e depois, 22 anos após a abertura da Escola Politécnica, se une com a Rua Direita da Fábrica das Sedas para dar lugar à Rua da Escola Politécnica.

A Casa do Noviciado da Cotovia, foi construída pelo arquiteto Baltazar Álvares na Quinta do Monte Olivete e estando concluída em 1616, começou três anos depois a ser o centro de formação dos Jesuítas, até à sua expulsão de Portugal em 1759. Depois de expulsar os Jesuítas, o Marquês de Pombal aproveitou o colégio deles para instalar, a partir de 7 de março de 1761, o Real Colégio dos Nobres, remodelado por Carlos Mardel, para ministrar uma formação inicial a jovens aristocratas, no quadro do Iluminismo.

Foi o Colégio dos Nobres extinto em 4 de janeiro de 1837 para dar lugar, pela publicação do Decreto de 11 de janeiro de 1837 à Escola Polytechnica de Lisboa, concebida para ministrar um ensino preparatório científico aos candidatos a oficiais do Exército e da Marinha, que seria completado nas escolas especializadas – Escola do Exército e Escola Naval – copiando o modelo da Escola Politécnica de Paris, sob a tutela dos ministérios da Guerra e da Marinha e Ultramar. Do antigo Colégio pombalino herdaram os Laboratórios de Física, de Química e de Ciências Naturais. Os cursos ministrados eram um curso geral, um curso preparatório para oficiais de artilharia, outro para oficiais de marinha e outro para oficiais de infantaria e cavalaria, um curso preparatório para oficiais de estado-maior e de engenharia militar para engenheiros civis bem como um curso preparatório para engenheiros construtores navais. Entretanto, o antigo edifício ficou totalmente destruído em virtude de um incêndio ocorrido em 22 de abril de 1843, pelo que a partir de 1857 foram sendo construídas novas instalações que já só virão a albergar a Escola Politécnica uma vez que a Escola do Exército havia sido deslocada em 1850 para o Palácio da Bemposta. Em 1859 a Escola passou a ter um estatuto civil uma vez que ficou sob a tutela do Ministério do Reino.

A partir de 19 de abril 1911, na sequência da criação da Universidade de Lisboa, passou a ser a Faculdade de Ciências que 74 anos depois, em 1985, se mudou para novas instalações na Cidade Universitária de Lisboa, no Campo Grande. Nas instalações da Rua da Escola Politécnica passou então a funcionar o Museu Nacional de História Natural e da Ciência (MUHNAC), onde se integra o Jardim Botânico (nascido em 1878), classificado como Monumento Nacional desde 2010, e que inclui o Observatório Astronómico da Escola Politécnica, o Edifício dos Herbários, as Estufas e o Palmário.

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Academia das Ciências, Rua

A Academia das Ciências de Lisboa em finais do séc. XIX ou inícios do séc. XX (Foto: © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O topónimo Rua da Academia das Ciências foi atribuído pela Câmara Municipal de Lisboa, por Edital de 17/10/1924, à antiga Rua do Arco a Jesus, para homenagear a instituição fundada com a aprovação dos seus estatutos pela rainha D. Maria I em 24/12/1779, e desde 1834 sediada nesta artéria, ocupando o edifício do Convento de Jesus da Ordem Terceira de São Francisco, que havia sido cedido à Academia por decreto de 27 de outubro desse ano. Sublinhe-se que se manteve na proximidade o topónimo Travessa do Arco a Jesus.

A instituição científica foi inicialmente denominada Academia Real das Ciências de Lisboa e surgiu por iniciativa do 2.º Duque de Lafões, D. João Carlos de Bragança e Sousa Tavares Mascarenhas da Silva e Ligne, com o apoio do Abade Correia da Serra e o Prof. Domingos Vandelli, ambos opositores da política do Marquês de Pombal. Teve a sua primeira sede no Paço das Necessidades e depois, num palácio do Poço Novo, no Palácio do Monteiro-Mor na Calçada do Combro, noutro edifício do Largo do Calhariz, no Colégio dos Monges Beneditinos na Praça da Estrela (1823- 1832) e no Palácio do Conde de Lumiares no Passeio Público.

Refira-se ainda que a toponímia de Lisboa integra também alguns dos Presidentes da Academia de Ciências de Lisboa, a saber, o 2º Duque de Lafões (Calçada do Duque de Lafões), D. Pedro V (Rua), D. Luís I (Praça e Rua), D. Carlos I (Avenida e Esplanada), Lopes de Mendonça (Rua), Braamcamp Freire (Rua), Cândido de Figueiredo (Rua), Dr. Júlio Dantas (Rua), José Maria Rodrigues (Rua), Professor Egas Moniz (Avenida), Aquiles Machado (Rua), Azevedo Neves (Rua), Professor Reinaldo dos Santos (Rua), Prof. Moisés Amzalak (Rua), Prof. Almeida Lima (Rua), Prof. Prado Coelho (Rua) e Professor Pinto Peixoto (Rua).

Ativa desde 1780, ano da realização da sua primeira sessão, com a implantação da República em 1910, passou novamente a denominar-se Academia das Ciências de Lisboa, designação que ainda mantém, deixando cair o título de “Real” conferido em 1783 ao ser reconhecida de “utilidade pública” e passando a ter proteção régia e outros privilégios associados a este novo estatuto. Desde o seu início que esta instituição, formada à semelhança de outras congéneres europeias e, por isso, também por influência do pensamento iluminista, adotou como lema uma citação de Fedro: “Se não for útil o que fizermos a glória será vã”.

Assim, a Academia, estimulando o contacto direto entre os cientistas, pretendia contribuir para aprofundar, desenvolver e divulgar o conhecimento nas áreas das Ciências, Humanidades, Tecnologia e Economia contribuindo deste modo para o desenvolvimento cultural e económico do país com particular incidência no domínio da educação. Organizando-se em três Classes (Ciências de Observação, Ciências de Cálculo e Belas Letras), promoveu congressos, colóquios, eventos com o envolvimento da comunidade científica internacional, criou prémios e editou obras de carácter científico e outras, como a Portugaliae Monumenta Historica, uma coletânea de textos da história de Portugal, publicadas entre 1856 e 1917, sendo os três primeiros volumes dirigidos por Alexandre Herculano, sócio efetivo da Academia desde 1852.

Superando os constrangimentos ao desenvolvimento dos seus projetos de investigação, divulgação e ensino, nomeadamente devido à indefinição das suas instalações e à conjuntura económica e política do país (invasões francesas, 1807-1811; implantação da República), a Academia de Ciências de Lisboa, manteve a sua atividade a partir de 1852 em torno de duas Classes – Ciências e Letras – em torno das quais continua atualmente a desenvolver o seu profícuo trabalho nos domínios científico e das letras.

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Colégio dos Nobres

A Cerca do Colégio dos Nobres
(Foto: Armando Serôdio © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O Colégio Real dos Nobres de Lisboa, instituído no reinado de D. José I por iniciativa do Marquês de Pombal, iniciou a sua atividade em 1766, embora os seus Estatutos tivessem sido aprovados cinco anos antes. Diversos acontecimentos contribuíram para a sua criação: o atentado contra o rei (1758), o processo dos Távoras que culminou com a sua execução pública em Belém em 1759, ano em que os jesuítas, que então dominavam o ensino, foram expulsos de Portugal.

Com capacidade para 100 alunos e um corpo docente essencialmente constituído por mestres estrangeiros, foi instalado num edifício pertencente à Companhia de Jesus, na Cotovia. No seu primeiro ano letivo abriu com 24 discípulos que tinham que ter entre 7 e 13 anos e, no mínimo, o foro de moço-fidalgo. Contrariando os princípios do ensino ministrado pelos jesuítas, o modelo pedagógico do Colégio refletia princípios de laicização do ensino, valorizando as Matemáticas e a Física Experimental e tendo no seu programa, para além das Ciências, as Humanidades e a atividade física, aproximando-se assim do ideário educativo da Europa das Luzes.

O funcionamento do Colégio dos Nobres, o seu sucesso formativo e a sua organização interna ficaram sempre aquém das expetativas, levando a que em 1771 a administração fosse transferida para a Real Mesa Censória. A partir do ano seguinte, prosseguia apenas com o ensino das Humanidades. Assim, uma vez abolido o ensino científico, o conjunto dos instrumentos científicos que integravam o Gabinete de Física do Colégio e que constituem atualmente um importante acervo do Museu de Física da Universidade de Coimbra, foi transferido para a Universidade de Coimbra, reformada nesse mesmo ano.

A derrota das forças absolutistas, lideradas por D. Miguel, pelos defensores do liberalismo aglutinados em torno de D. Pedro IV e a nova Constituição liberal de 1834, foram fatores determinantes para o encerramento do Colégio dos Nobres que não sobreviveu ao conflito ideológico que punha em confronto os interesses da nobreza tradicional com os da burguesia em ascensão.

O Colégio dos Nobres foi também um estabelecimento fixado como topónimo na memória de artérias próximas. A artéria no seguimento da Rua Direita da Fábrica das Sedas, desde o Palácio Soares (depois, Imprensa Nacional) até ao Príncipe Real foi a Rua Direita do Colégio dos Nobres (conforme planta da freguesia das Mercês da remodelação paroquial de 1770), depois Rua do Colégio dos Nobres e ainda mais tarde, Rua da Patriarcal Queimada até o Edital do Governo Civil de Lisboa de 1 de setembro de 1859 unir as duas artérias sob a denominação única de Rua da Escola Politécnica. Também fronteiro ao Colégio dos Nobres nasceu o Beco Colégio dos Nobres que hoje é o arruamento situado entre os nºs 87 e 89 da Rua da Escola Politécnica. Das escassas fontes para conhecer a malha urbana imediatamente anterior ao terramoto nesta zona da Cotovia apenas podemos supor que este Beco resulte de um pátio ou saguão posterior à remodelação pombalina executada na área, desde a abertura da Rua Nova de São Mamede até junto do então Colégio dos Nobres. Só na planta de 1857 de Filipe Folque  surge já registado o Beco do Colégio dos Nobres, onde 20 anos mais tarde foi construída uma escadaria empedrada, conforme documentação municipal.

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Frei Manuel do Cenáculo

Busto de Frei Manuel do Cenáculo na Academia das Ciências de Lisboa
(Foto: António da Silva Fernandes Duarte © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O primeiro topónimo atribuído pela Câmara Municipal de Lisboa no ano de 1916 foi a Rua Frei Manuel do Cenáculo, na Penha de França, através do Edital de 8 de janeiro de 1916.

O homenageado é Manuel de Villas-Boas Anes de Carvalho (Lisboa/01.03.1724- 26.01.1814/Évora), conhecido como Frei Manuel do Cenáculo, que se notabilizou enquanto arcebispo de Évora, pensador iluminista e criador de bibliotecas.

Enquanto jovem frequentou as lições do Padre João Baptista da Congregação do Oratório (1737-1740) e aos 16 anos vestiu o hábito de franciscano da Ordem Terceira. Depois teve também aulas com Frei Joaquim de São José, que lhe deu uma orientação mais moderna e coincidente com uma movimentação intelectual de crítica da Escolástica. Doutorou-se em Teologia na Universidade de Coimbra em 26 de maio de 1749 e foi nomeado lente de Artes do Colégio de São Pedro de Coimbra (1746-1749), vindo depois a reger uma cadeira de teologia (1751 a 1755) na Universidade, instituição onde mais tarde foi também mentor da Junta Reformadora (1772).

Frei Manuel do Cenáculo que chegou a desempenhar as funções de Superior provincial da Ordem Terceira de São Francisco, na sua viagem a Roma de 1750 conheceu bibliotecas que o influenciarão na sua dedicação a esta área, nomeadamente como dinamizador da reconstrução da Real Biblioteca Pública e da Biblioteca Pública de Évora (1775).

Foi uma  figura de relevo do iluminismo em Portugal, caracterizando-se o seu pensamento filosófico por matematismo, gosto do real e  crítica moderada da escolástica, de acordo com os seus estudiosos Hernâni Cidade e Francisco da Gama Caeiro. Tornou-se uma referência no círculo político e intelectual português que lhe valeram sucessivas nomeações por parte de D. José I e do Marquês de Pombal:  Presidente da Real Mesa Censória (1768) e consequentemente, participação na organização do ensino através da sua função neste organismo que lhe permitiu dinamizar a abertura de escolas em zonas rurais, sobretudo no Sul do País, em 1771; Bispo de Beja (1770 a 1795), instituindo um curso de humanidades e de teologia no seu paço episcopal onde também instalou uma biblioteca e um museu e em 1779  mandou escolher alguns rapazes das famílias pobres da zona entre Campo de Ourique e o Algarve para serem instruídos em Beja e depois instruírem aquela localidade da sua diocese de onde provinham, para além de ter fundado a Academia Eclesiástica de Beja (1793);  Presidente da Junta de Providência Literária criada para tratar da reforma dos estudos, Preceptor do Príncipe Herdeiro D. José, Príncipe da Beira (todos em 1770); e ainda, Presidente da Junta do Subsídio Literário (1772).

 

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Pascoal de Melo

Pascoal de Melo num medalhão do Salão Nobre dos Paços de Concelho de Lisboa
(Foto: Francisco Leite Pinto, Arquivo Municipal de Lisboa)

As ideias iluministas  de Cesare Beccaria (Génova/1738- 1794/Milão), difundidas na Europa a partir de 1764 com a publicação do seu Dos Delitos e das Penas, tiveram eco em Pascoal de Melo e nas suas aulas em Coimbra, tendo sido chamado a Lisboa em 1783  para elaborar um Novo Código Penal, que ele procurou humanizar sendo que 84 anos após o seu falecimento e 15 após a abolição da pena de morte em Portugal este vulto maior do direito português teve honra de dar o seu nome a uma rua de Lisboa.

A rainha D. Maria I encarregou em 1783 José Pascoal de Melo Freire de fazer um Novo Código Penal, que ele apresentou em 1789 através de um Novo Código de Direito Público  e de um Ensaio do Código Criminal a que mandou proceder a Rainha fidelissima D. Maria I (embora só seja publicado em 24 de junho de 1823), citando na introdução deste último Beccaria, Locke e Montesquieu e preconizando no seu conteúdo leis menos severas, a fim de evitar maiores tormentos aos condenados, assim como atenua penas, embora mantenha algumas infamantes. Daqui se atribui a Pascoal de Melo a posição de precursor do  moderno direito penal português, por fazer eco do pensamento iluminista e humanitário, mesmo que nenhum dos seus códigos tenha sido adotado. Aliás, no processo de revisão do Livro II das Ordenações, houve uma polémica famosa entre Pascoal de Melo e António Ribeiro Santos, em que o primeiro apodou o segundo de republicano.

Desde a Viradeira, período iniciado em 1777 com a subida ao trono de D. Maria I e a substituição do Marquês de Pombal, que os abolicionistas tentaram que nos códigos e nas leis houvesse menos motivos para a pena de morte ao contrário das Ordenações Filipinas em vigor desde o séc. XVII e que previam  uma longa listagem de razões para a aplicação da pena de morte. A outra estratégia seguida era tentar que o rei comutasse a pena, na maior parte das vezes em degredo para as colónias, o que na prática aconteceu frequentemente com D. Maria I, D. João VI , D. Maria II e D. Pedro V. Chegados ao séc. XIX, uma questão muito debatida na imprensa na época foi a necessidade de meios para substituir as execuções e foi nesse contexto que foram então construídas as penitenciárias de Lisboa e de Coimbra, sendo nos finais do século XIX, difundida a ideia de que as penitenciárias deviam também permitir aos presos aprender a trabalhar, tendo surgido as enxovias de sapateiro, carpinteiro, bordadeira.

A artéria que hoje identificamos como Rua Pascoal de Melo nasceu como Rua Pascoal José de Melo, por deliberação camarária de 5 de outubro de 1882 e edital de 13 de dezembro de 1882. Sete anos depois,  por edital de 8 de junho de 1889, passou a denominar-se Rua de Pascoal de Melo. E mais 62 anos passados, o Vice-Presidente da CML, Luís Pastor de Macedo, homologou o parecer da Comissão Municipal de Toponímia para que fosse suprimida a  partícula «de» uma vez que aqueles terrenos não haviam sido dele nem ele lá havia morado e ficou desde aí a designar-se como Rua Pascoal de Melo.

Curioso também é saber que nessa época o topónimo foi atribuído antes da rua estar fisicamente concluída, já que por exemplo, em 29 de agosto de 1883, encontramos um documento municipal de expropriação de umas barracas e pátio situadas na Travessa da Cruz do Tabuado, necessárias para a conclusão da abertura da Rua de Pascoal José de Melo e, em 17 de outubro desse mesmo ano, deparamos com um requerimento de Teotónio d’Ornelas Bruges pedindo o arrendamento de um terreno que sobejou da expropriação realizada para a nova Rua de Pascoal José de Melo.  Já no séc. XX, pelo Edital camarário de 11 de agosto de 1916 foram incorporados troços de outros arruamentos na Rua Pascoal de Melo conferindo-lhe desde aí os limites que ainda hoje tem: foram-lhe acrescentados os troços de via pública compreendidos entre o viaduto de Arroios e a Avenida Almirante Reis, bem como o troço entre esta Avenida e a Rua Francisco Sanches, passando, assim a rua Rua Pascoal de Melo a ter começo na Rua Francisco Sanches e a findar do lado poente no Largo de Dona Estefânia. Em 1956 a edilidade também firmou um contrato de prestação de serviços com o Engº Edgar Cardoso para a a elaboração do prolongamento da Rua Pascoal de Melo, incluindo o túnel sob a Rua Heróis de Quionga e uma praceta.

Paschoal José de Mello Freire dos Reis (Ansião/06.04.1738 – 24.09.1798/Lisboa), foi um jurisconsulto que se formou com apenas 19 anos em Leis, na Universidade de Coimbra e aí ensinou. A sua obra fundamental –  Institutiones Juris Civilis Lusitani (1798) – foi escolhida para a cadeira de Direito Pátrio, sendo considerada uma das mais significativas expressões da ciência jurídica portuguesa da época. Foi também o responsável pelos manuais utilizados na Universidade de Coimbra durante muitos anos, sendo que muitos dos professores que lhe sucederam bem como as suas obras são ainda a continuação de Melo Freire.

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Brotero

Gravura de Félix de Avelar Brotero
(Foto: Eduardo Portugal © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

Félix de Avelar Brotero, médico que preferiu dedicar-se à botânica e assim dirigiu o Jardim Botânico da Ajuda, começou por ter Rua em Lisboa na freguesia de Alcântara no final do séc. XIX e em 1916, também passou a dar nome a uma artéria da Ajuda e depois, foi também o nome do Jardim do Alto de Santo Amaro em Alcântara.

Por deliberação camarária de 8 de julho de 1892 passou a existir em Alcântara, na Rua 6 do Bairro Rolão ou de Santo Amaro, a Rua Avelar Brotero. Já no séc. XX, o Edital municipal de 26 de setembro de 1916, alterou o topónimo Rua da Paz para Rua Brotero, considerando a localização desta entre o Largo da Paz e o Jardim Botânico que Brotero dirigira. Nos anos 80 do séc. XX, perante a manifesta escassez de novos arruamentos na cidade, a edilidade alterou pelo Edital de 7 de setembro de 1987 a Rua Avelar Brotero para Rua Pedro Calmon, passando a existir apenas uma rua dedica a Brotero em Lisboa, a da Ajuda, à qual em 1992 foi aditada a legenda «Félix de Avelar Brotero / Médico e Botânico/1744 – 1828», a partir da sugestão de um munícipe para se identificar convenientemente o antropónimo.

Ainda em Alcântara, no início do séc. XX, o Jardim do Alto de Santo Amaro, sito na Rua Filinto Elísio- que antes de 8 de julho de 1892 era a Rua 2 do Bairro Rolão ou de Santo Amaro-, foi denominado Jardim Avelar Brotero mas tal resolução nunca tornou oficial o topónimo do Jardim. A CML aumentou o número de bancos deste espaço verde nos anos 50, a pedido dos moradores da zona e a última remodelação do Jardim aconteceu no ano passado.

Nascido Félix da Silva de Avelar (Loures – Santo Antão do Tojal/25.11.1744 – 04.08.1828/Lisboa), pela forte amizade que o ligava a Filinto Elísio (Francisco Manuel do Nascimento) e pelo ardor com que se dedicava à ciência tornou-se suspeito para o Santo Ofício e para fugir à polícia de Pina Manique, emigrou para Paris em 1778, com Filinto Elísio. Durante os 12 anos de permanência em Paris, fez os principais estudos de história natural e doutorou-se na Escola de Medicina de Reims, assim como adotou o apelido de Brotero, que significa amante dos mortais (pela junção do grego brothos com eros). Publicou o Compêndio Botânico (Compendio de Botanica ou Noçoens Elementares desta Sciencia, segundo os melhores Escritores modernos, expostas na língua Portugueza) em 1788, em Paris.

Regressou a Lisboa no ano de 1790, tendo sido logo nomeado lente de Botânica e Agricultura na Universidade de Coimbra, em 1791 e que manteve até 1807, acumulando com a direção do Jardim Botânico da Universidade e publicou Flora Lusitanica (1804). As invasões francesas alcançaram Coimbra em 1807 e Brotero veio refugiar-se em Lisboa e só lá voltou para ser jubiliado, o que sucedeu por Carta Régia de 27 de abril e Decreto de 16 de agosto de 1811. Passou então a dirigir o Real Museu e Jardim Botânico da Ajuda (o primeiro jardim botânico português e o 15.º da Europa, desenhado em 1768 por Domingos Vandelli por ordem de D. José I), reabilitando o Jardim Botânico e elaborando o seu catálogo. Da sua investigação, resultaram também as suas obras Phytographia Lusitaniae selectior – em 2 tomos- 1816 e 1827 – e a História Natural dos Pinheiros, Larices, e Abetos (1827).

Em 1821, Félix Avelar Brotero foi eleito deputado às Cortes Constituintes pela Estremadura, tendo participado na discussão da lei dos cereais, onde exortou os agricultores a cultivarem centeio e trigo, para que fosse possível produzir pão para toda a população e a um preço acessível à bolsa de todos mas 4 meses depois pediu dispensa, pela idade avançada (77 anos) e foi-lhe concedida. Faleceu aos 83 anos de idade na sua casa, na Calçada do Galvão, em Alcolena, em Belém.

Brotero foi homenageado com a atribuição do seu nome a várias plantas, como é o caso da Brotera ovata e da Brotera trinervata e está também na toponímia de Coimbra, do seu concelho natal – em Loures, Santo António dos Cavaleiros e Santo Antão do Tojal-, da Amadora, do Barreiro, Carnaxide, Custóias, Mafra, Matosinhos, Montijo, Odivelas (em Ramada e em Caneças), do Porto, Santa Maria da Feira, Seixal e Setúbal.

Também os seus pares, perpetuando a sua memória e sua importância decisiva para o desenvolvimento da Botânica em Portugal fundaram em Coimbra, em 1880, a agremiação científica “Sociedade Broteriana”. O seu prestígio internacional de Brotero é confirmado pelas várias Sociedades e Academias a que pertenceu, entre outras, a Sociedade de Horticultura e a de Linnean, ambas de Londres, a Academia de História Natural e Filomática de Paris, a Sociedade Fisiográfica de Lunden na Suécia, a Sociedade de História Natural de Rostock e a Academia Cesarea de Bona (Alemanha). Em Portugal, pertenceu à Academia Real das Ciências de Lisboa.

O sucesso dos seus trabalhos de registo, inventariação e compilação de espécies botânicas, traduz na prática o enquadramento do novo espírito científico e filocientífico de oitocentos, bem como o prestígio crescente das ciências naturais que decorreu dos novos paradigmas do pensamento Iluminista.

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Filinto Elísio

 

Filinto Elísio, pintado por António Nunes Júnior nos Paços do Concelho de Lisboa

O sacerdote Francisco Manuel do Nascimento que enquanto poeta neoclássico usou o pseudónimo de Filinto Elísio, é o topónimo de uma Rua da freguesia de Alcântara desde o final do séc. XIX.

A Rua Filinto Elísio nasceu na Rua nº 2 do Bairro Rolão pela deliberação camarária de 8 de julho de 1892, na presidência do Conde de Ottolini na edilidade lisboeta. E nessa mesma deliberação mais artérias do Bairro Rolão tiveram também topónimos de escritores atribuídos: João de Barros ficou na Rua n.º 1, Soares dos Passos na Rua n.º 4, Bocage nas Ruas n.º 7 e 8 (que é a Rua Amadeu de Sousa Cardoso desde os anos oitenta do séc. XX, pelo Edital municipal de 29/02/1988), Gil Vicente na Rua n.º 9, e o botânico Avelar Brotero ficou na Rua n.º 6 (que é a Rua Pedro Calmon desde os anos oitenta do séc. XX, pelo Edital municipal de 07/09/1987).

Na década de trinta do século XX a Rua Rua A, situada no prolongamento da Rua Filinto Elísio passou também a ser parte integrante da primeira, conforme Edital municipal em 20 de junho de 1938 e este arruamento dedicado ao poeta arcádico, com dimensão aumentada passou assim a ligar a Rua da Indústria à Rua Soares de Passos.

O homenageado Filinto Elísio é Francisco Manuel do Nascimento (Lisboa/23.12.1734 – 25.02.1819/Paris) de seu nome. Nasceu na freguesia de São Julião, como filho de um casal de Ílhavo, um fragateiro e uma peixeira, que sempre viveram com João Manuel, um Mestre das Fragatas Reais e depois, Patrão-mor da Ribeira das Naus, que Filinto sempre considerou seu pai.

Francisco Manuel do Nascimento tornou-se sacerdote ordenado em 1754 e o Filinto Elísio poeta arcádico. Quando Leonor de Almeida Portugal, a futura Marquesa de Alorna, estava presa no Mosteiro de São Félix, em Chelas, com a sua irmã Maria, antes da Viradeira, ele começou a ser visita do local e também como era moda na época começou a cortejar uma das reclusas, Maria, a quem deu o nome árcade Daphne e à sua irmã, Leonor, o de Alcípe. Leonor retribuiu-lhe esse gesto dando-lhe o nome de Filinto Elísio, para substituir o pseudónimo de Niceno que usara até então no círculo poético do Grupo da Ribeira das Naus.

Este poeta neoclássico compôs odes, epístolas, epigramas e sátiras, tendo as suas poesias sido publicadas ainda em vida, em Paris, em 11 volumes, entre 1817 e 1819, mas só após a sua morte foram editadas em Lisboa as suas Obras Completas, num total de 22 tomos, entre 1836 e 1840, sendo a sua obra considerada precursora do Romantismo. Também os seus restos mortais foram transladados do Père Lachaise para o claustro da Sé de Lisboa em 1843, e mais tarde, para o cemitério do Alto de São João.

Refira-se que a partir de 1778 se refugiou em França, com Avelar Brotero, e foi lá que acabou por falecer, tendo nesses 41 anos conhecido o poeta Lamartine, que até lhe dedicou um poema. As suas ideias enciclopedistas e liberais levaram a que fosse denunciado à Inquisição em 22 de junho de 1778, por leituras heréticas proibidas e afirmações blasfemas, o que somado a uma forte amizade que o ligava a Félix da Silva de Avelar tornou-os a ambos suspeitos para o Santo Ofício, pelo que exilaram em Paris. E para sobreviver na capital francesa fez trabalhos de tradução: Os Mártires de Chateaubriand, As Fábulas de La Fontaine, Púnica de Sílio Itálico e o Elogio do Doutor António Nunes Ribeiro Sanches de M. Vicq-d’Azyr para português e verteu as Cartas de Mariana Alcoforado para francês como Lettres Portugaises de Mariana Alcoforado. A ida para França de Filinto Elísio permitiu-lhe contactar com personalidades relevantes da cultura francesa o que foi decisivo para a obra e para a sua defesa dos ideais enciclopedistas e iluministas e, também, das revoluções francesa e americana.

Filinto Elísio está também como topónimo nos concelhos de Ílhavo, Almada, Barreiro, Caldas da Rainha, Gondomar, Odivelas, Oeiras, assim como Francisco Manuel do Nascimento surge em dois topónimos da Charneca da Caparica, no concelho de Almada.

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Poeta Bocage

Litogravura de Bocage
(Foto: José Leitão Bárcia © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

Manuel Maria Barbosa du Bocage, conhecido pelo seu espírito irónico e satírico, tem na sua relação com a toponímia de Lisboa também uma histórica algo jocosa que o fez migrar de Alcântara para a zona de Carnide-Lumiar.

Em 8 de julho de 1892 a Câmara Municipal de Lisboa deliberou na sua sessão de câmara a atribuição do topónimo Rua Bocage às Ruas nºs 7 e 8 do Bairro do Casal do Rolão. Na mesma deliberação e no mesmo bairro de Alcântara decidiram também fixar Gil Vicente (na Rua nº 9) e Filinto Elísio (Rua nº 2 ). Todavia, no final dos anos 80 supôs-se que a Rua Bocage e a Avenida Barbosa du Bocage, dedicada a um primo em segundo grau do poeta sadino, se referiam à mesma pessoa e resolveu-se eliminar do mapa alfacinha a Rua Bocage transformando-a pelo Edital de 29/02/1988 em Rua Amadeu de Sousa Cardoso.

E assim ficou Lisboa sem o seu Bocage mais de 8 anos, até o Edital de 24/09/1996 o recolocar no Impasse FG da Quinta dos Inglesinhos, à Avenida das Nações Unidas, desta feita para evitar equívocos e, por proposta de Appio Sottomayor na Comissão Municipal de Toponímia, como Rua Poeta Bocage/1765 – 1805.

Manuel Maria Barbosa du Bocage (Setúbal/15.09.1765 – 21.12.1805/Lisboa), «Magro, de olhos azuis, carão moreno», também conhecido como Elmano Sadino da Nova Arcádia (Academia literária fundada em 1790), viveu em Goa, Damão e Macau, até regressar a Lisboa em 1790, frequentar o Café Nicola no Rossio da cidade e, viver a partir de 1801 no n.º 25 da Travessa André Valente, ao Bairro Alto.

Bocage publicou apenas os três volumes das suas Rimas, de 1791 a 1804, embora os seus versos eróticos e burlescos tenham circulado abundantemente em edições clandestinas. As suas temáticas predominantes fixaram-se na desilusão amorosa e nas dificuldades materiais e pode Bocage ser considerado o maior poeta português do séc. XVIII.

Não é também menor a sua obra como tradutor, mesmo que menos conhecida. As suas versões de textos clássicos latinos, de autores como Virgílio e Ovídio, caracterizam-se por rigor e originalidade, o que também sucedeu nas suas traduções da língua francesa de escritores da época, como Voltaire, La Fontaine, Lesage, Florian, Lacroix, d’Arnaud, Delille e Castel.

Em 7 de agosto de 1797, o Intendente Pina Manique mandou-o prendê-lo por desrespeito ao rei e à Igreja, primeiro no Limoeiro (até 14 de novembro), depois nos calabouços da Inquisição no Rossio e a partir de 17 de fevereiro de 1798 no Real Hospício das Necessidades, a cargo dos Oratorianos, de onde só saiu em liberdade no último dia desse ano.

Autor unanimemente considerado como um vulto maior do arcadismo em Portugal, a produção literária de Bocage foi influenciada pelos ideais Iluministas, sobretudo de influência francesa, com os quais tomou contacto quando, com 18 anos, chegou a Lisboa. Integrou, assim, o Arcadismo, escola literária que reagiu aos excessos estilísticos e ao virtuosismo do barroco, trazendo novos temas (mais simples e acessíveis), redigidos numa linguagem mais clara e significativa, adequada ao público leitor a que se pretende dirigir, nomeadamente à burguesia urbana. Tal como em outros domínios, também a literatura foi permeável às “Luzes” e, influenciada pela razão, pela experiência e pelo espírito científico, contribuiu para perspectivar uma nova visão do mundo.

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