O nascimento da Rua das Amoreiras em 1874

A Rua das Amoreiras no início do séc. XX
(Foto: José Leitão Bárcia © CML | DPC | Arquivo Municipal de Lisboa)

O Governador Civil de Lisboa Augusto César Cau da Costa tendo tido conhecimento da «conveniencia que resultará de se dar uma só denominação á Rua que vai desde o Largo do Rato até ás portas da Cidade que ficam em frente dos arcos das aguas livres, a qual, em todo o seu prolongamento tem três denominações diversas, que nenhuma razão justifica antes são causa de permanente confusão» determinou que a Rua do Arco das Águas Livres, a Rua de S. João dos Bem Casados e a Rua dos Arcos das Águas Livres passassem a ter a denominação única de Rua das Amoreiras, pelo seu Edital de 3 de fevereiro de 1874. Nasceu assim a Rua das Amoreiras, do Largo do Rato até às Portas da Cidade, assinaladas pelo Arco da autoria de Carlos Mardel, construído entre 1746 e 1748, para celebrar a entrada da água do Aqueduto das Águas Livres na cidade ao mesmo tempo que era um arco triunfal de entrada em Lisboa.

Hoje, a Rua das Amoreiras vai do Largo do Rato à Avenida Engenheiro Duarte Pacheco, sendo território das Freguesias de Santo António e de Campo de Ourique. Já as amoreiras que permitiram o topónimo desta Rua começaram a ser plantadas em 1761 na Praça das Amoreiras – que começou por ser Largo – e assim se ligam ao pombalino Bairro das Águas Livres de  1759.

Marquês de Pombal, no seu ímpeto de desenvolvimento das manufaturas nacionais, traçou em 1759 o plano do Bairro das Águas Livres que foi aprovado por Decreto de 14 de março. Este Bairro englobava mais uma Fábrica de Sedas, a pombalina, cujo epíteto de Real Colégio de Manufacturas Nacionais demonstrava que a Real Fábrica das Sedas para além de manufaturas de seda se dedicava a dar aulas aos aprendizes. Foi para esta fábrica que se plantaram 331 amoreiras na Praça das Amoreiras, de 1761 a 1771. E em volta desta Praça da fábrica – como a apelidava D. José I -,  ou Largo das Águas Livres, mas que pelo menos desde de 1807 é a Praça das Amoreiras –  conforme é designada na planta de Duarte Fava -, foram rasgadas diversas ruas, onde foram edificados prédios de estrutura pombalina, destinados a residências dos fabricantes que trabalhavam na fiação bem como aos aprendizes que trabalhavam com eles.

A Rua das Amoreiras, nascida em 3 de fevereiro de 1874, logo no ano seguinte  começou a ser alinhada e alargada com diversos terrenos comprados, trocados ou expropriados, situação que se manteve pelo menos até 1890, bem como mais tarde, em 1906 e 1908.

Nesta zona da cidade próxima do Arco triunfal das Águas Livres o topónimo Amoreiras começou com a plantação das amoreiras no Largo que viria a ser a Praça das Amoreiras no início do séc. XIX. Quase no início do último quartel desse século, em 1874 juntou-se a Rua das Amoreiras e em 1889, por Edital municipal de 8 de junho, a Travessa da Fábrica das Sedas às Amoreiras passou a ser a Travessa das Amoreiras.

Freguesias de  Santo António e de, Campo de Ourique

© CML | DPC | NT | 2019

Do Largo dos Tanques à Rua da Cruz a Alcântara e à Rua da Fábrica da Pólvora, em 1919

A Rua da Cruz e a Rua da Fábrica, provavelmente nos anos trinta ou quarenta do séc. XX
(Foto: Eduardo Portugal, Arquivo Municipal de Lisboa)

O Edital camarário de 3 de outubro de 1919 estipulou que «as portas com os nºs 142, 143, 144, 145, 146 e 147, situados num troço da via publica que antigamente o vulgo  dava o nome de Largo dos Tanques, pertencentes à propriedade que, pela citada numeração, faz indevidamente parte da Rua da Cruz, em Alcantara,  sejam desta via publica desanexadas e encorporadas [ incorporadas] na Rua da Fabrica da Polvora», conforme a Comissão Executiva da Câmara Municipal de Lisboa deliberou na sessão de 25 de setembro desse mesmo ano, iniciada «pelas 21 horas e meia».

O Largo dos Tanques surge mencionado na documentação municipal em 30 de outubro de 1837, numa vistoria a um quintal que fazia parte de um prédio no Largo dos Tanques e Rua da Fábrica da Pólvora n.ºs 5 a 9, o que mostra que o Largo era contíguo à artéria onde vai ser integrado em 1919. Com esta mesma denominação de Largo dos Tanques aparece também numa escritura pública de 23 de julho de 1858, entre a Câmara Municipal de Belém e Joaquim José Ferreira, um morador da freguesia de S. Pedro de Alcântara que aqui tinha um estabelecimento de tanques de lavadeiras. Na planta de 1857, de Filipe Folque, o espaço deste Largo aparece junto à Rua da Cruz e Rua da Fábrica da Pólvora mas sem denominação alguma.

Este Largo dos Tanques terá sido absorvido pelas obras para alargamento do Largo de Alcântara, que começaram a partir de 1891 e o que dele sobejou terá sido integrado na Rua da Cruz a Alcântara, denominação cujo acrescento de localização foi colocado pelo Edital municipal da CML de 8 de junho de 1889. Note-se que nas obras de regularização do pavimento do Largo de Alcântara, de 1895 a 1905, as plantas já não referem o Largo dos Tanques mas colocam nas proximidades a Estrada da Circunvalação, a Rua da Fábrica da Pólvora, a Rua da Cruz a Alcântara, a Rua de São Jerónimo (a partir de 21/06/1926 passou a ser a Rua Feliciano de Sousa), a Rua do Alvito, a estação dos caminhos de ferro de Alcântara-Terra, a Rua de Alcântara, o mercado, a Rua do Livramento e a Rua Vieira da Silva. Na planta de 1910 de Silva Pinto também já não aparece a designação de Largo dos Tanques, justificando que era uma denominação popular mas não oficial, ou como redige o Edital de 1919: «antigamente o vulgo  dava o nome de Largo dos Tanques

A partir de 1919 o troço do Largo dos Tanques que fora antes colocado na Rua da Cruz a Alcântara ficou na Rua da Fábrica da Pólvora e sete anos depois, a partir de 25 de março de 1926, começou-se a alargar a Rua da Cruz a Alcântara, expropriando terrenos a particulares como Francisco Inácio Bonito, António Lourenço Rodrigues, Ermelinda Alves Rêgo, Manuel Lopes e Raúl Silva, Francisco de Oliveira Margioche e Alfredo Caetano Dias, situados nas Quintas do Cabrinha, da Lamparina, da Água e nos terrenos da Empresa Cerâmica de Lisboa.

Freguesia de Alcântara
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Praça das Amoreiras de 1761 e da Mãe d’Água

Praça das Amoreiras no início do século XX
(Foto: Paulo Guedes, Arquivo Municipal de Lisboa)

As amoreiras que dão nome a esta Praça, que começou por ser Largo, datam de 1761 e ligam-se ao pombalino Bairro das Águas Livres de que o Reservatório da Mãe d’Água das Amoreiras no º 10 do arruamento ainda guarda a memória.

O Marquês de Pombal, no seu ímpeto de desenvolvimento das manufaturas nacionais, traçou em 1759 o plano do Bairro das Águas Livres, aprovado pelo Decreto de 14 de março. Este Bairro englobava mais uma Fábrica de Sedas, a pombalina, cujo epíteto de Real Colégio de Manufacturas Nacionais demonstrava que a Real Fábrica das Sedas para além de manufaturas de seda se dedicava a dar aulas aos aprendizes. Foi para esta fábrica que  de 1761 a 1771 se plantaram as  331 amoreiras, que mais tarde ficarão no topónimo Bairro das Amoreiras. Nas proximidades ficava  um conjunto de fábricas de outra natureza desde cartas de jogar a pentes, passando por botões, lençaria, chapéus, cutelaria, fundição de metais, relógios, serralharia, tapeçaria e louça. E em volta da Praça da fábrica – como a apelidava D. José I -,  ou Largo das Águas Livres mas que pelo menos desde de 1807 é a Praça das Amoreiras –  conforme é denominada na planta de Duarte Fava -, foram rasgadas diversas ruas, onde foram edificados prédios de estrutura pombalina, destinados a residências dos fabricantes que trabalhavam na fiação e aos aprendizes que trabalhavam com eles.

Freguesia de Santo António
(Foto: Rui Mendes)

Foi o Aqueduto das Águas Livres que começou por dar o topónimo ao Bairro pombalino e à sua praça central como Largo das Águas Livres. Ainda por ordem de Marquês de Pombal será na segunda metade do século XVIII aqui colocado o reservatório da Mãe d’Água. Algures na passagem do séc. XVIII para o XIX, as amoreiras pombalinas tomaram conta da toponímia da zona.  Por exemplo, em  1867, a feira que se realizava no Príncipe Real denominava-se Feira das Amoreiras e em 1868, numa informação municipal sobre a posse da Ermida de Nossa Senhora de Monserrate, a artéria é denominada Praça da Fábrica da Seda no original da doação de D. José I e nas notas do séc. XIX tanto surge Largo das Amoreiras como Praça das Amoreiras .

Para além das amoreiras, o ajardinamento desta Praça das Amoreiras começou a ser executado a partir de 1886, a que em 1892 se juntou um chafariz com duas torneiras e tanque para o gado, um lavadouro, um telheiro, uma casa do capataz e uma casa de arrecadação anexa à do capataz.

Nos dias de hoje a Praça das Amoreiras encontra-se na confluência da Rua das Amoreiras, Rua João Penha e Travessa da Légua da Póvoa, e a partir deja surgiram mais topónimos locais semelhantes: a Rua das Amoreiras (Edital do  Governo Civil de Lisboa de 03/02/1874) e a Travessa das Amoreiras (Edital municipal de 08/06/1889).

Freguesia de Santo António
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

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A Rua da Fábrica de Estamparia da Gualdim Pais

Freguesia do Beato
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Rua da Fábrica de Estamparia, na freguesia do Beato,  guarda desde 2004 a memória de uma unidade fabril de estampagem da 2ª metade do século XIX, sediada numa importante concentração fabril de Xabregas dos séculos XIX e XX, a Estrada de Chelas , mas que mais tarde será registada como da Rua Gualdim Pais, no seu nº 57.

Este arruamento resulta da junção da Rua B e da Rua F à Rua Carlos Botelho sob o topónimo Rua da Fábrica de Estamparia através do Edital municipal de 10 de fevereiro de 2004. Pelo mesmo edital foram atribuídos nos restantes arruamentos do bairro outros topónimos relativos a fábricas, a saber, o Largo da Fábrica de Fiação de Xabregas, o Largo da Fábrica de Tecidos Oriental, a Rua da Fábrica de Tecidos Lisbonenses e a Rua da Fábrica das Moagens, assim perpetuando a edilidade lisboeta a memória da industrialização da zona do Beato e Xabregas desde meados do século XIX até quase ao final do século XX através de expoentes simbólicos dessa memória da zona oriental de Lisboa, industrialização que no pólo ocidental se centrou na Boavista, Alcântara e Belém.

Toda a zona de Xabregas esteve recheada de estamparias e as primeiras estabeleceram-se ali logo desde o século XVIII, como foram os casos das de António Ignácio de Almeida (1783 a 1834), de Bernardo José Pacheco na Quinta da Misericórdia (1786), de António Mercadé na Calçada de Chelas (1791), de João Gomes Loureiro e Paulo José Rocha (1795), de Joaquim José Vasques & Cª (anteriores a 1798) e de Manuel Lopes Pereira (referenciada em 1798). No século XIX ficaram arroladas as estamparias de Pedro Dias de Sousa (1822 a 1834), de Joaquim Pedro Xavier (anterior a 1813), de António José de Brito e a Vasques e Companhia. No início do século XX, já só existiam duas estamparias nesta zona,  que eram a de Ignácio de Magalhães Bastos & Cª e a de José Pedro de Mattos, ambas na então Estrada de Chelas, sendo que a primeira trabalhava materiais como o algodão e a lã, com um tipo de maquinaria moderna para a época e cerca de 80 operários, enquanto a segunda, com 150 trabalhadores, produzia peças como camisas ou lençóis para todo o país.

Na Estrada de Chelas funcionavam ainda a Fábrica de Grude, também de Ignácio de Magalhães Basto & Cª bem como a Fábrica de Fiação e Tecidos de Lã, de José Lourenço  de Medely & Filhos (pelo menos até 1907). A Fábrica de Estamparia a que este  topónimo se reporta nasceu na 2ª metade do século XIX na artéria que hoje conhecemos como Rua Gualdim Pais (assim denominada desde o Edital de municipal de 19 de junho de 1933 uma parte da antiga Estrada de Chelas), no espaço que teve o 57 como numeração de polícia. O historiador Jorge Custódio realça que «Na cota menor do vale veio a implantar-se uma avenida – a Estrada de Chelas – , espécie de cordão umbilical da actividade industrial e comercial da vasta área, por onde saíram ainda os produtos hortícolas das quintas vizinhas.»

Na freguesia do Beato existiram ainda várias outras unidades fabris de relevo económico e social como a fábrica de João de Brito, mais tarde  conhecida como A Nacional; a fábrica de preparo de cortiça de José Viallonga; a fábrica de Licores de Moraes Ferrão & Irmãos; a Companhia Portuguesa de Fósforos; a Fábrica de Sabão Viúva Macieira & Filhos e a Fábrica de Sabão Sousa & Ca.

Freguesia do Beato
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

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A Rua da Quinta do Cabrinha e a Fábrica Cabrinha

Freguesia de Alcântara

A Quinta do Cabrinha, cujo topónimo radica num antepassado de D. Francisco Manuel de Melo, passou esse nome alguns séculos mais tarde à Fábrica Cabrinha da Companhia Lisbonense de Algodões  e ambas criaram no lugar a memória para fazer nascer a Rua da Quinta do Cabrinha em 1999, através do  Edital municipal de 9 de fevereiro, no arruamento situado entre a Avenida de Ceuta e a Rua da Fábrica da Pólvora.

Esta Rua da Quinta do Cabrinha foi um novo arruamento de Lisboa do final do séc. XX, a funcionar como um bairro, construído por iniciativa municipal entre 1998 e 1999, para realojamento de famílias oriundas do Casal Ventoso, num contexto de renovação e qualificação da cidade.

Mas indo ao século XVII vemos Alcântara, no Reguengo de Algés e próxima da cidade de Lisboa, a acolher a família real em 1605 e consequentemente, seguiram a instalação de várias quintas de nobres, como a dos Saldanhas, as de Diogo Mendonça e dos Caldas, a dos Carvalhos (depois chamada do Fiúza) e a Quinta do Cabrinha,  de D. Francisco Manuel de Melo (Lisboa/1608 – 1666/Alcântara – Lisboa), localizada na margem da ribeira de Alcântara,  na qual faleceu em 1666 este nobre, político e escritor, conhecido autor de Apólogos Dialogais ou de O Fidalgo Aprendiz.

O antepassado de Francisco Manuel de Melo de nome Antão Rodrigues da Câmara,  filho bastardo de Rui Gonçalves da Câmara e neto de João Gonçalves Zarco, era Cabrinha de alcunha, tal como sucedeu com Francisco de Mello Manuel da Câmara, que governou o Maranhão de 1806 a 1809,  por ser muito moreno e nestas alcunhas se originou o nome pela qual a Quinta de Alcântara acabou por ficar conhecida, segundo Edgar Prestage no seu D. Francisco Manuel de Mello – Esboço Biographico,  publicado em 1914 pela Universidade de Coimbra.

Em 1690, começou a ser construída próxima da Quinta do Cabrinha a Fábrica da Pólvora,  por iniciativa de Carlos de Sousa e Azevedo. A obra foi acabada em 1728 por António Cremer, que era então o Intendente da Pólvora do Reino. Esta indústria cessou as suas funções  após o Terramoto de 1755 passando a laboração para a Fábrica de Barcarena. Por outro lado, entre os séculos XVII e XVIII, nos terrenos da Quinta do Cabrinha foi criado o Páteo 149,  num edifício da Quinta, para acolher quem trabalhava na Fábrica.

Já em meados do século XIX, em 1874, foi instalada na Quinta a Fábrica de Chitas da Companhia Lisbonense de Estamparia e Tinturaria de Algodões, em dois edifícios imponentes, que foi designada Fábrica Cabrinha. Para os seus operários, que segundo o Inquérito Industrial de 1881 eram 65,  foi construído em 1878 um conjunto de habitações de três pisos, ao longo de 150 metros,  sob o nome de Vila Cabrinha. Esta situação foi também mencionada por Edgar Prestage: «Do lado esquerdo da estrada que vae de Alcântara a Sete-Rios encontramos uma quinta extensa plantada com oliveiras e chamada “do Cabrinha”, que é propriedade da Estamparia lá installada; foi comprada, ao que nos disseram, ao Sr. Joaquim José Anjos ha trinta e cinco annos [por volta de 1879] . » Mais tarde, esta Fábrica passará a ser propriedade da Sociedade Têxtil do Sul.

Freguesia de Alcântara
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

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A Fábrica das Sedas que saiu de duas Ruas e ficou numa Travessa de Lisboa

A Travessa da Fábrica das Sedas, hoje na Freguesia de Santo António
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Fábrica das Sedas, manufactura joanina, cujo processo de instalação começou cerca de 1730, com a chegada a Lisboa do francês Robert Godin, deu nome como Rua Direita da Fábrica das Sedas ao arruamento onde estava instalada até passar a ser uma parte da Rua da Escola Politécnica, ao mesmo tempo que estava como Rua da Fábrica das Sedas numa artéria paralela à Rua do Arco de São Mamede, bem como no Alto de São Francisco, próximo da Fábrica pombalina das Amoreiras numa Travessa que é a única via que ainda hoje preserva a memória da Fábrica na toponímia de Lisboa.

Entre 1727 e 1730, o tecelão francês Robert Godin, chegou a a Lisboa para estabelecer fábricas de seda. Com o também francês e especialista no fabrico de sedas Sibert fez um requerimento a D. João V em 1731 para a instalação de uma fábrica de sedas  saindo o  alvará real de fundação apenas em 13 de fevereiro de 1734, com privilégios concedidos por 20 anos, como a exclusividade da manufactura de tecidos de seda e a obrigação de instruir aprendizes portugueses na arte das sedas. Foi lavrada  em 5 de outubro desse mesmo ano a escritura da sociedade de capitais da fábrica e Godin que não havia entrado com capitais, tinha direito a  15% dos lucros e a um salário anual de 480$00. A Fábrica foi construída segundo o risco de Carlos Mardel, com uma planta  longitudinal em L, ocupando todo um quarteirão, o do topo do Largo do Rato e ficou concluída em 1741, nos terrenos da Quinta do Morgado dos Soares de Noronha à Cotovia. O Imóvel está classificado como de Interesse Público pelo Decreto n.º 5/2002, de 19 de fevereiro de 2002.

Troço da antiga Rua Direita da Fábrica das Sedas em 1898
(Foto: Machado & Souza, Arquivo Municipal de Lisboa)

Esta Real Fábrica das Sedas joanina tornou-se georreferência da toponímia local através da Rua Direita da Fábrica das Sedas. Ou seja, o topónimo é posterior a 1741  e durou até o Edital do Governo Civil de Lisboa de 1 de setembro de 1859 que determinou que esta artéria, tal como a Rua da Patriarcal Queimada, passassem a ser uma só sob a  denominação de Rua da Escola Politécnica, a nova referência forte da zona.

Esta Real Fábrica das Sedas permaneceu sob a administração privada, até 1750, ano da insolvência da Fábrica das Sedas e consequente passagem a propriedade do Estado, por Decreto de 14 de maio de 1750. Já com Pombal adquiriu a designação de Real Fábrica das Sedas do Rato a partir de 1757 e por Alvará de 22 de setembro de 1758, o fundador da Companhia da Fábrica das Sedas, Robert Godin, foi nomeado como quinto diretor.

Em data também posterior à instalação da Fábrica surgiu paralela à Rua do Arco a São Mamede, uma Rua da Fábrica das Sedas, no Bairro dos trabalhadores da Fábrica e assim ficou até 1968, ano em que o Edital municipal de 10 de maio a transformou em Rua Maestro Pedro de Freitas Branco, por ter sido a artéria de residência desse compositor.

Em 1759, o Decreto de 14 de março aprovou a edificação do Bairro das Águas Livres para o estabelecimento dos fabricantes de seda incorporados na Real Fábrica pombalina, cujo epíteto de Real Colégio de Manufacturas Nacionais demonstrava que a Real Fábrica das Sedas para além de manufaturas de seda se dedicava a dar aulas aos aprendizes. Registou-se ainda a instalação de um conjunto de Fábricas Anexas  de cartas de jogar, botões, lençaria, chapéus, cutelaria, fundição de metais, pentes, relógios, serralharia, tapeçaria, tecidos e louça. É neste conjunto que o Marquês idealiza o jardim de amoreiras, cuja arborização com 331 amoreiras junto à fábrica das sedas (hoje Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva), se conclui em 1771. Em volta da praça da fábrica, a   Praça das Amoreiras, foram rasgadas diversas ruas, onde foram edificados prédios de estrutura pombalina, destinados a residências dos fabricantes que trabalhavam na fiação e aos aprendizes que trabalhavam com eles.

A Fábrica de Tecidos de Seda na Praça das Amoreiras, em 1961
(Foto: Arnaldo Madureira, Arquivo Municipal de Lisboa)

É neste conjunto urbanístico que surge o bloco de edifícios da designada Travessa da Fábrica das Sedas, a unir a Rua de São Francisco de Sales à Travessa da Légua da Póvoa.  Esta Travessa da Fábrica das Sedas aparece depois mencionada  na planta de Filipe Folque de julho de 1857 e num requerimento de 22 de outubro de 1877, de diversos proprietários e moradores no Alto de S. Francisco e da Travessa da Fábrica das Sedas, solicitando  providências para melhorar aquele local, uma vez que não existia canalização e os despejos se faziam para a rua.

A retirada da família real e de parte da nobreza para o Brasil, devido às invasões francesas de 1807, a abertura dos portos brasileiros e a permissão de fabrico de sedas no Brasil em 1808,  bem como o tratado de comércio com a Inglaterra de 1810, conduziram à decadência da fábrica e à sua venda em hasta pública, decretada pela portaria de 27 de julho de 1835 e  na segunda metade do século XIX o edifício foi destinado pelos seus proprietários a novas utilizações, comerciais e particulares.

Refira-se que Cassiano Branco viveu no nº 7-7A desta Travessa da Fábrica das Sedas, numa moradia que ele próprio traçou.

A Travessa da Fábrica das Sedas, hoje na Freguesia de Santo António
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

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A Rua da Fábrica das Moagens Aliança na Rua de Xabregas

Freguesia do Beato                                                                      (Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Fábrica de Moagens a Vapor Aliança, nascida em 1870, na então Rua Direita de Xabregas, dá nome a uma artéria da Freguesia do Beato desde 2004, a Rua da Fábrica das Moagens, num conjunto de arruamentos em que a edilidade quis perpetuar a memória das fábricas desta zona oriental de Lisboa.

A Fábrica Aliança, como era conhecida, ficou perpetuada na Rua da Fábrica das Moagens,  topónimo dado à Rua A e à Rua C à Rua Carlos Botelho, pelo Edital de 10 de fevereiro de 2004, o mesmo que  atribuiu a Rua da Fábrica de Estamparia (Rua B e Rua F), o  Largo da Fábrica de Fiação de Xabregas (Rua D),  o Largo da Fábrica de Tecidos Oriental ( Rua E ) e a Rua da Fábrica de Tecidos Lisbonenses (Rua G).

A Rua de Xabregas em 1871, numa planta municipal

Propriedade de João Luiz de Sousa & Filho, a Fábrica de Moagens a Vapor Aliança estabeleceu-se em 1870 na Rua de Xabregas,  junto ao viaduto ferroviário,  num edifício de três andares expressamente construído para o efeito como um edifício-máquina, para permitir  a moagem de trigo austro-húngara, um processo mecanizado a vapor disposto em andares, de amplos salões travejados a ferro, com um mecanismo de rolos de porcelana, ferro fundido ou aço, produzindo uma fina e alva.  Este novo sistema de moagem terá sido inventado entre 1821 e 1832, ou na Suíça ou na Hungria, mas o seu nome deve-se a terem sido os húngaros e os austríacos os primeiros a usá-lo e a difundi-lo, por exemplo, nas Exposições Universais de Viena (1873) e Paris (1874). Em 1898, a Fábrica de Moagens a Vapor Aliança empregava 50 operários.

Os mesmos proprietários tinham desde 1877 mais uma fábrica, para produção de massas alimentícias, na Rua do Barão, próxima da Rua de São João da Praça. A Fábrica Aliança  acabará  por integrar-se na Nova Companhia Nacional de Moagem em 1908 e a partir de dezembro de 1919 na Companhia Industrial de Portugal e Colónias, SARL que comercializava as marcas Nacional e Napolitana.

Freguesia do Beato
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

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A Praceta CUF onde existiu a fábrica de Alcântara

Freguesia de Alcântara
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

Na Urbanização Alcântara Nascente, onde existiu a fábrica da CUF (Companhia União Fabril) a partir da segunda metade do séc. XIX e até a sua laboração ter sido transferida para o Barreiro, local onde hoje permanece uma das suas chaminés como  memória do lugar, também a edilidade lisboeta guardou este património industrial através do topónimo Praceta CUF.

Foi por  deliberação camarária de 10 de setembro e consequente Edital municipal de 23 de setembro de 2008 que o Jardim B à Rua das Fontaínhas, da Urbanização Alcântara Nascente, passou a denominar-se Praceta CUF, tal como o Jardim A passou a ser a Praceta Teófilo Ferreira.

Esta urbanização edificada junto à Rua das Fontaínhas, no terreno onde foi  outrora  a Fábrica da CUF, manteve no local uma chaminé da antiga indústria, razão para a Câmara Municipal de Lisboa manter a memória deste património no local também com a atribuição do topónimo.

A CUF em 1904
(clicar para ver imagem maior)

A Companhia União Fabril foi fundada em Lisboa, com um capital de 200 contos de réis,  recebendo em 1865 o alvará de licenciamento para a produção de sabões, de velas de estearina e óleos vegetais. Trinta e três anos depois, em 1898, Alfredo da Silva (1871 – 1942), administrador da Companhia Aliança Fabril (CEF), promoveu a fusão desta empresa com a CUF e avançou para a produção de adubos em grande escala. Também nesta data entrou para o património da CUF a Fábrica Sol, situada na Avenida 24 de Julho.

Alfredo da Silva continuou um forte ritmo de expansão da CUF e a 19 de setembro de 1908 inaugurou uma fábrica na pequena vila piscatória do Lavradio, onde iniciou a produção de ácidos, transformando óleo de bagaço de azeitona para o fabrico de sabões, começando aqui a sua incursão no Barreiro.

Na década de trinta, a CUF tinha fábricas em Lisboa, Barreiro, Alferrarede, Soure, Canas de Senhorim e Mirandela, de indústria ligeira e pesada, somando um  gigantesco conglomerado empresarial que no início de 1974 contava com A Tabaqueira do Poço do Bispo (desde 1927), o Banco Totta & Açores e mais um outro para Angola e outro para Moçambique, três Companhias de Seguros, várias sociedades financeiras e  empresas de construção, para além do Grupo Desportivo da CUF que competia nas principais divisões nacionais e no mais alto patamar do futebol português. A CUF foi o maior grupo empresarial privado em Portugal e em 1975, foi nacionalizado e extinto, sendo que em 1997, como pertença do Grupo José de Mello, voltou a usar o nome CUF.

Freguesia de Alcântara
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

 

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A Rua da Fábrica da Pólvora de Alcântara

Freguesia de Alcântara
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Fábrica de Pólvora que no local funcionou depois de 1690 – e sobre a qual mandou D. João V  construir outra maior – originou a fixação no local da Rua da Fábrica da Pólvora, que hoje une a Rua da Cruz a Alcântara à Avenida de Ceuta.

A Rua da Fábrica da Pólvora em 1856, na planta de Filipe Folque

Em 1653, um Decreto régio  de 19 de fevereiro, de D. Pedro II,  ordenava ao Senado da Câmara que não impedisse o fabrico de pólvora, necessária para as conquistas e naus da Índia e procurasse eleger lugares para a construção da fábrica. E de acordo com o olisipógrafo Norberto de Araújo, nesta rua que segue lateralmente o espaço que foi a Ribeira de Alcântara começou a ser construída em 1690, por Carlos Sousa e Azevedo, uma rudimentar fábrica de pólvora. Depois D. João V mandou construir outra maior no mesmo lugar, acabada em 1728 por António Cremer que era então o intendente da Pólvora do Reino. Após o Terramoto de 1755 cessou a sua atividade e o fabrico de pólvora foi transferido para a antiga Fábrica da Ribeira de Barcarena, que datava do século XVII e  abastecia o exército português, tanto mais que tinha sido reedificada entre 1725 e 1729, sendo depois alargada e remodelada com materiais da fábrica de Alcântara.

O secretário de estado, Diogo de Mendonça Corte Real emitiu um aviso ao Senado municipal, com data de 23 de abril de  1735, para que fosse consertado um lanço da calçada que vai a ponte de Alcântara até à Fábrica da Pólvora, para que as carroças que a transportavam não corressem riscos devido aos grandes atoleiros aí existentes.

Após a remodelação paroquial de 1770, a Rua da Fábrica da Pólvora aparece na descrição e planta da nova freguesia de São Pedro em Alcântara, correspondendo ao aumento demográfico na zona após o Terramoto. E pelo Edital de 3 de outubro de 1919, as portas com os nºs 142  e seguintes até ao nº 147, situadas num troço da via pública a que antigamente o vulgo dava o nome de Largo dos Tanques, foram desanexadas da Rua da Cruz em Alcântara onde estavam indevidamente e foram incorporadas na Rua da Fábrica da Pólvora.

Esta Rua da Fábrica da Pólvora teve também durante alguns anos como morador, o escritor D. Francisco Manuel de Melo, na sua Quinta do Cabrinha, que nela faleceu em 13 de outubro de 1666. No séc. XIX, foi esta artéria também a morada da Fábrica de Chitas ou Fábrica da Cabrinha, instalação fabril ampliada em 1874.

Freguesia de Alcântara
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

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A Rua da Boavista da Fábrica do Gás

Freguesia da Misericórdia
(Foto: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Rua da Boavista, abaixo do Monte de Belver ou Alto da Boavista, dotada de um bica para melhoras dos olhos, que hoje encontramos a unir a Rua de São Paulo ao Largo do Conde Barão, albergou entre 1847 e 1914 a Fábrica do Gás da Boavista.

Fábrica de Gás da Boavista foi inaugurada em 1847 e segundo Norberto de Araújo, ainda cerca de 1860 se encontrava de frente para a Praia da Boavista e os Boqueirões da Moeda e dos Ferreiros, tendo assim sucedido ao antigo Quartel da Brigada Real da Marinha o edifício da Companhia Lisbonense de Iluminação a Gás, estando nos terrenos por detrás deste a primeira Fábrica de Gás, de Cláudio Adriano da Costa e do francês José Detry, que por privilégio concedido em 3 de maio de 1846 detinham o monopólio da produção e comercialização de gás. A  junção desta Fábrica do Gás com a Central Tejo, a partir de 1909, permitiu fornecer eletricidade a Lisboa e a toda a faixa costeira até ao Estoril.

O traçado de elevação da fachada da Fábrica do Gás na Rua da Boavista, aprovada pela CML em 16 de maio de 1850

Em 1887 foi fundada uma concorrente, a Companhia do Gás de Lisboa, com fábrica em Belém, junto à Torre, em terrenos cedidos pela CML e, em 1891, as duas companhias acabaram por se fundir. Em 1914, deu-se na Fábrica da Boavista uma formidável explosão que originou 19 mortos e um incêndio, tendo então o fabrico do gás passado, inteiramente, para o sítio do Bom Sucesso, na proximidade da Torre de Belém, tendo Norberto de Araújo adiantado mais tarde que «a fábrica deve estar instalada, no ano próximo, no ocidente da Cidade, na Quinta da Mantinha, ao Poço do Bispo (se a guerra, que rebentou em 3 de Setembro dêste ano de 1939, não vier impedir a realização do projecto).»

A Rua da Boavista já existia como topónimo antes do Terramoto de 1755 como o registam as memórias paroquiais de Lisboa.  Ao Alto de Santa Catarina com quem a Rua da Boavista se relaciona na toponímia semelhante, também se chamava Alto do Belver, ou Belveder ou Alto da Boavista. Contudo, o nome de Boavista está também especialmente relacionado com a Bica dos Olhos, a Bica de Duarte Belo, construída em 1675 e muito popular pela sua eficácia no tratamento de doenças dos olhos, tendo até um médico de D. João V referido a sua água como medicinal na sua obra  Aquilégio Medicinal de 1726. E assim, durante muito tempo, acorreram a esta bica muitas pessoas para lavar os olhos com o propósito de manter uma boa visão ou curar outros males dos olhos.

Freguesia da Misericórdia
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)