A Rua do cineasta neorrealista Manuel Guimarães

Freguesia do Lumiar
(Foto: Google Maps editada pelo NT do DPC)

O cineasta neorrealista  Manuel Guimarães passou a ser um topónimo da Freguesia do Lumiar, na Rua D à Avenida Maria Helena Vieira da Silva, 32 anos após o seu falecimento, por via da publicação do Edital municipal de 10 de abril de 200, ficando assim junto de artérias com os nomes de António Lopes Ribeiro e Manuel Costa e Silva, também eles cineastas.

Manuel Fernandes Pinheiro Guimarães (Vale Maior – Albergaria-a-Velha/19.08.1915 – 29.01.1975/Lisboa) estudou pintura na Escola de Belas Artes do Porto a partir de 1931 e foi como desenhador de cartazes de cinema que iniciou a sua ligação à 7ª arte, sendo também pintor, cenografista,  ilustrador e caricaturista. São seus os cartazes  de Aniki Bóbó (1942) de Manoel de Oliveira, bem como de O Costa do Castelo (1943), A Menina da Rádio (1944), e O Leão da Estrela (1947), todos estes filmes de Arthur Duarte. Começou como assistente de realização de Manoel de Oliveira e no ano seguinte, em 1943, mudou-se para Lisboa e passou a sê-lo também de cineastas como António Lopes Ribeiro, Armando de Miranda, Arthur Duarte, João Moreira ou Jorge Brum do Canto.

A sua obra como cineasta é considerada neorrealista. Começou com o documentário O Desterrado (1949) que foi premiado com o Prémio Paz dos Reis do SNI. Depois, adaptou Circo de Leão Penedo para o seu filme Saltimbancos (1951), e no ano seguinte filmou Nazaré (1952), com argumento de Alves Redol, obra que foi amputada em cerca de metade pela censura devido à crítica social que continha. Manuel Guimarães passou então para a realização de filmes de cariz comercial sobre eventos desportivos- de que são exemplo As Corridas Internacionais do Porto ou O Porto é Campeão (ambos de 1956), assim como documentários sobre Barcelos, o Porto e os vinhos da região duriense- Porto, Capital do TrabalhoBarcelos ou Vinhos Bisseculares (todos em 1961). Ao longo da sua vida, realizou também documentários sobre temas de arte, de que se destacam Fernando Namora e António Duarte (ambos em 1969) ou Carta a Mestre Dórdio Gomes (1971), sendo ainda de mencionar o seu Tráfego e Estiva (1968), que foi o primeiro filme português rodado em 70 mm.

Entre 1953 e 1956 rodou Vidas sem rumo , com argumento seu e diálogos de Alves Redol, sendo também alvo da Censura, a ponto de ficar quase ilegível relativamente ao plano inicial. Em 1959 foi a vez de A Costureirinha da Sé , onde se viu obrigado a incluir publicidade explícita para custear a sua produção. Nos anos sessenta, Manuel Guimarães voltou às adaptações de romances de autores portugueses, tendo António da Cunha Telles como produtor. Do livro homónimo de Bernardo Santareno realizou O Crime da Aldeia Velha (1964); da obra homónima de Fernando Namora filmou O Trigo e o Joio (1965). De 1968 é o seu documentário de 15 minutos sobre Famalicão, intitulado A Terra e o Homem, encontrado em 2016, e de 1972 a sua longa-metragem Lotação Esgotada, com argumento e diálogos de Mário Braga, a partir de uma ideia de Artur Semedo.

O seu último filme, em 35 mm e a cores, rodado entre 1974 e 1975, é Cântico Final, adaptação do romance homónimo de  Vergílio Ferreira, cuja  montagem foi concluída pelo seu filho, Dórdio Guimarães. Manuel Guimarães conhecia o escritor e esta obra, que passada a película funcionou também como o seu testamento de morte anunciada: o cineasta espelhou-se na personagem do  professor de liceu ameaçado de morte por um cancro, tendo mesmo numa entrevista televisiva em 1974 expressado a impossibilidade de concretizar o seu desejo de fazer também um filme com Alegria Breve, outro romance de Virgílio Ferreira.

Leonor Areal dedicou-lhe o filme Nasci com a Trovoada – Autobiografia póstuma de um cineasta(2017), e o nome de Manuel Guimarães, falecido com 59 anos de idade, está também presente na toponímia dos concelhos de Almada, Amadora e Sintra.

Freguesia do Lumiar
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)

A Praça do arquiteto do Cine-Teatro Tivoli

Freguesia de Marvila
(Foto: Google Maps editada pelo NT do DPC)

Entre a Rua Luís Cristino da Silva e a Rua Keil do Amaral fica a Praça dedicada ao arquiteto que traçou o cinema Tivoli para a Avenida da Liberdade, a Praça  Raúl Lino, acolhida em Marvila desde  a publicação do Edital municipal de 20 de agosto de 1985.

Raúl Lino da Silva (Lisboa/21.11.1879-13.07.1974/Lisboa) foi estudar para a Grã-Bretanha desde os  10 anos de idade, por orientação de seu pai,  tendo seguido depois para Hannover, na Alemanha, a partir de 1893, onde trabalhou no atelier do historiador e arquiteto Albrecht Haupt (1852-1932). Regressado a Portugal em 1897, Raúl Lino desenhou numerosas obras ao longo da sua vida, cerca de 700, de que que se salientam as seguintes para Lisboa:

  • o modelo de Jardim-Escola João de Deus (1909) e o edifício  da Avenida Álvares Cabral, 69 (1918);
  • os arranjos das instalações dos animais no Jardim Zoológico de Lisboa (1912), na Quinta das Laranjeiras;
  • a loja Gardénia (1917) no nº 54 da Rua Garrett;
  • o Cine-Teatro Tivoli (1918 – 1924) que desde 2015 é  Monumento de Interesse Público;
  • a moradia na Rua Castilho nº 64 a 66, que foi Prémio Valmor  em 1930 (já demolida);
  • as alterações ao antigo Picadeiro Régio/Museu dos Coches (1940) e o Pavilhão do Brasil na Exposição do Mundo Português (1940).

A moradia na Rua Castilho nº 64 a 66 que foi Prémio Valmor  em 1930
(Foto: Paulo Guedes, Arquivo Municipal de Lisboa)

Fora da capital refira-se a sua autoria  na casa Montsalvat para o pianista Alexandre Rey Colaço (1901), no Monte Estoril; no Solar dos Patudos para José Relvas (1904); na Casa da Quinta da Comenda no Outão (1909); o Sanatório de Sousa Martins  (1907) na Guarda; na Casa do Cipreste (1907-1913), em Sintra, para si próprio; na Pérgola em Penacova (1918); na Casa de Santa Maria (1918) em Cascais; na Casa dos Penedos (1920) em Sintra;  no Cine-Teatro Curvo Semedo (1923) em Montemor-o-Novo; na Casa do Soar de Cima (1925) em Viseu; na Quinta das Romeiras em Câmara de Lobos (1933); ou nos Paços do Concelho de Setúbal (1938).

Raúl Lino foi ainda autor de numerosos textos teóricos sobre  arquitetura, como A Nossa Casa (1918), A casa portuguesa (1929), Casas portuguesas (1933) e L´évolution de l´ architecture domestique au Portugal (1937), neles revelando a sua principal preocupação de criar uma arquitetura integrada na paisagem, assente na  ideia de que só o conhecimento do terreno sobrevaloriza os valores tradicionais da pura arquitetura portuguesa, procurando assim conciliar a arquitetura erudita com a tradição popular.

Raúl Lino foi agraciado com o Prémio Valmor e Municipal de Arquitectura de 1930, o Prémio José de Figueiredo  de 1948 e a Comenda da Ordem Militar de Cristo (1941). Também integrou o júri do prémio Valmor em 1931, que premiou o edifício da Rua Infantaria 16, da autoria dos arquitetos Miguel Jacobethy Rosa e António Reis Camelo.

Para além do seu traço de arquiteto, Raúl Lino também desempenhou cargos como  Chefe da Repartição de Estudos e Obras em Monumentos da Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (entre 1936 e 1949),  Superintendente Artístico dos Palácios Nacionais a partir de 1938 e ainda, Diretor dos Monumentos Nacionais a partir de 1949.

Raúl Lino foi ainda membro fundador da Academia Nacional de Belas Artes em 1932 e seu presidente a partir de 1967. Refira-se também que a produção artística de Raúl Lino inclui o design de mobiliário, painéis, azulejos e porcelanas; a cenografia (sobretudo no São Carlos e com Almada Negreiros) e a programação cultural, principalmente para o cinema Tivoli onde exibiu, entre outros, filmes de Fritz Lang e de Chaplin, para além de colaborar em publicações como a Atlantida, Homens Livres, Ilustração ou a Revista Municipal de Lisboa.

Na vida pessoal, escolheu viver numa casa na Avenida António Augusto de Aguiar e teve duas filhas: Isolda Lino Norton de Matos e Maria Cristina Lino Pimentel . O seu espólio foi doado pela família, em 1989, à Fundação Calouste Gulbenkian.

Freguesia de Marvila
(Planta: Sérgio Dias| NT do DPC)