O Fado Português de José Régio e o Jardim Amália Rodrigues

Manuscrito do « Fado Português» de José Régio
(Imagem: © CER)

 

O «Fado Português» de José Régio foi musicado por Alain Oulman para ser interpretado por Amália Rodrigues que em Lisboa dá nome a um Jardim nas Avenidas Novas, no topo do Parque Eduardo VII.

José Régio publicara esse poema no seu Fado, obra de 173 páginas editadas em Coimbra em 1941, com desenhos do seu irmão Júlio. Alain Oulman musicou esse poema de Régio para a voz de Amália e juntou outros poetas portugueses para criar aquilo que se veio a denominar novo fado, do que resultou o disco Fado Português da fadista, editado internacionalmente em junho de 1965 e em Portugal, apenas em 1970, pela Valentim de Carvalho.

Amália nascida em Lisboa no mês de julho, oficialmente no dia 23 embora ela festejasse mais o dia 1 como seu aniversário, logo sete dias após o seu falecimento recebeu uma deliberação de Câmara para que o seu nome designasse uma via de Lisboa, o que se concretizou com a publicação do Edital de 18 de abril de 2000, que atribuiu o topónimo Jardim Amália Rodrigues a um espaço de 5,7 ha da autoria do arquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles, que é parte integrante do Corredor Verde, que une o Parque Eduardo VII a Monsanto.

Em 1958
(Foto: Amadeu Ferrari, Arquivo Municipal de Lisboa)

De seu nome completo Amália da Piedade Rebordão Rodrigues (Lisboa/23.07.1920 – 06.10.1999/Lisboa), por muitos considerada a maior voz portuguesa pela interpretação única e invulgar, nasceu na Rua de Martim Vaz, em casa dos seus avós maternos. Aos seis anos mudou-se com os avós para Alcântara, bairro onde viveria até aos 19 anos.

Como cantora profissional estreou-se em 1939, no Retiro da Severa, para rapidamente virar cabeça de cartaz  no Café Luso, com um cachet de valor nunca antes pago a uma fadista. Como nome artístico começara por usar Amália Rebordão mas, por  sugestão de Filipe Pinto, diretor artístico do Solar da Alegria, mudou para Amália Rodrigues. A carismática Amália também ousará a singularidade de reinventar a  postura da fadista, à frente e não atrás dos guitarristas, a que ainda somou um inovador estilo de vestidos e xailes negros.

Entre os seus inúmeros êxitos musicais, para além do novo fado musicado por Oulman, no período de 1962 a 1975, onde cantou José Régio, podem também destacar-se  Ai, Mouraria,  Barco negro, Casa portuguesaEstranha forma de vida, Nem às paredes confesso, Foi DeusGostava de ser quem eraPovo que lavas no rio ou Vou dar de beber à dor.  Ela própria acabou por escrever as letras de alguns dos seus temas como é o caso de Gostava de ser quem era e, estes poemas foram editados pela Cotovia, em 1997, com o título Versos. Amália foi também considerada a maior embaixatriz de Portugal no mundo, por ter levado o nome de Portugal ao resto do mundo, dada a sua permanente e constante exibição pelos cinco continentes, ao longo da sua carreira. Data de  1943 a sua primeira vez no estrangeiro, em Madrid, a que se seguiram por ordem cronológica Brasil, Paris, Londres, Berlim, Roma, Dublin, Moscovo, Nova Iorque, e depois muitas outras cidades e países.

Amália Rodrigues foi ainda a voz de fados e canções de sucesso no teatro, de 1940 a 1947, tendo começado no palco do Teatro Maria Vitória. Passou também pelo cinema, a partir do  filme Capas Negras (estreado no cinema Condes a 16 de maio de 1947), a que se seguiram Fado – História de Uma Cantadeira (1947), Sol e Toiros (1949), Vendaval Maravilhoso (1949), Os Amantes do Tejo (1955), April in Portugal (1955), Sangue Toureiro (1958), Fado Corrido (1964), As Ilhas Encantadas (1965), Via Macau (1965) e ainda, curtas-metragens de Augusto Fraga.

A fadista foi agraciada com a Ordem de Santiago de Espada (Cavaleiro em 1958, Oficial em 1970 e  Grã-Cruz em 1990), a Grande Medalha de Prata da Cidade de Paris (1959), a Ordem do Infante D. Henrique (1980), a Medalha de Ouro da Cidade de Lisboa (1980), o Grau de Comendador da Ordem das Artes e Letras (1985), a Medalha de Ouro da Cidade do Porto (1986), a Legião de Honra francesa (1991),  uma homenagem pública num espetáculo na Expo’98 e, a 8 de julho de 2001, o seu corpo foi trasladado do Cemitério dos Prazeres para a Sala da Língua Portuguesa no Panteão Nacional.

Na toponímia portuguesa, o nome de Amália Rodrigues está presente em Abrantes, Alcabideche, Almada, Amadora, Arruda dos Vinhos, Beja, Bobadela, Braga, Bragança, Campo Maior, Carvoeiro-Lagoa, Cascais, Celorico de Basto, Celorico da Beira, Cuba, Entroncamento, Estoril, Fafe, Faro, Figueira da Foz, Fundão, Gaeiras, Gondomar, Ílhavo, Lagos, Leiria, Marco de Canaveses, Mem Martins, Mirandela, Moita, Montijo, Moura, Odemira, Odivelas, Olival Basto, Paço de Arcos, Palmela, Paredes, Pegões, Peniche, Queluz, Reguengos de Monsaraz, Salvaterra de Magos, Santa Iria de Azóia, São Domingos de Rana, Seixal, Setúbal, Sintra, Tavira, Trancoso, Unhos, Vendas Novas, Vila Franca de Xira, Vila Nova de Famalicão, Vila Nova de Poiares e Vizela.

Freguesia das Avenidas Novas

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Variações em rua lisboeta e em concerto de encerramento das Festas de Lisboa’19

Os jardins junto à Torre de Belém vão ser o palco do concerto de encerramento das Festas de Lisboa’19, a partir das 22 horas de sábado dia 29 de junho, este ano com um concerto de homenagem a António Variações, cuja memória vive num topónimo de Lisboa desde 1998.

António & Variações são Ana Bacalhau, Conan Osiris, Lena d’Água, Manuela Azevedo, Paulo Bragança e Selma Uamusse a cantar António Variações com a Orquestra Metropolitana de Lisboa, contando ainda com  o coro Gospel Collective, o acordeonista João Gentil e Filipe Melo, Filipe Raposo e Pedro Moreira na orquestração, sob a direção artística de Luís Varatojo.

António Variações, da música «entre Braga e Nova Iorque», falecido a 13 de junho, o dia do Santo Popular seu homónimo, desde a publicação do Edital municipal de 24 de junho de 1998 que tem o seu nome para memória futura numa rua do Bairro do Oriente, na freguesia do Parque das Nações, tendo sido inaugurada oficialmente no ano seguinte quando passavam 15 anos sobre a sua morte. Nas restantes artérias do bairro acompanham-no o compositor e cantor Carlos Paião, o compositor Jaime Mendes, os atores Mário Viegas e Carlos Daniel, o Palhaço Luciano e o desenhador Fernando Bento, atribuídos pelo mesmo Edital e também pelo de 19 de outubro de 1998.

No que era a antiga Rua B, que liga a Rua Carlos Daniel à Rua Mário Viegas, ficou o minhoto António Joaquim Rodrigues Ribeiro (Fiscal- Amares/03.12.1944 – 13.06.1984/Lisboa), filho de Jaime Ribeiro e Deolinda de Jesus, que todos guardamos na memória como António Variações.  O Tonito de sua mãe aprendeu em Amesterdão o oficio de cabeleireiro e tornou-se em Lisboa, a partir de 1977, barbeiro de profissão e pioneiro dos salões unissexo durante o dia  enquanto à noite se dedicava à sua paixão pela música. Abriu em Lisboa o primeiro salão unisexo no Centro Comercial Imaviz-  na Rua Tomás Ribeiro –  e mais tarde fixou a sua barbearia no nº 70 da Rua de São José. Começou por fazer espetáculos com um grupo de músicos sob o nome de Variações.  Em 1980, Luís Vitta com Rui Pêgo e António Duarte passam o seu «Toma o comprimido»  no programa de rádio Meia de Rock da Rádio Renascença. E em fevereiro do ano seguinte, Júlio Isidro coloca Variações nos ecrãs televisvos no Passeio dos Alegres, bem como em algumas emissões da Febre de Sábado de Manhã da Rádio Comercial. Com contrato assinado com a Valentim de Carvalho desde 1978 foi em 1982 que saiu o seu primeiro single, já como António Variações, com as faixas «Povo que Lavas no Rio» e «Estou Além». E em pouco mais de um ano, transformou-se num caso de popularidade na música portuguesa com uma inovadora exuberância em palco. Em 1983, foi editado o seu primeiro álbum intitulado Anjo da Guarda, com êxitos como «É P’ra Amanhã…» ou «O Corpo É que Paga», num estilo que ele próprio definiu como estando «entre Braga e Nova Iorque», ao reunir folclore, rock, pop, blues e fado. Em 1984 gravou o seu segundo e último álbum – Dar e Receber –, no qual se revelou como sucesso a «Canção do Engate». A sua música manteve até hoje novas recriações, de vários grupos, tendo sido destacada com o projeto Humanos, construído a partir de inéditos seus, lançado no 20º aniversário da  sua morte.

António Variações declarou ao jornal Sete (30 de março de 1983) que «O António Variações gosta de pôr as pessoas a cantar, gostava de não ser só um espectador. E tem vontade de ficar na história, nem que seja na história de uma parede de casa-de-banho» e aquilo de que gostava acabou por lhe dar um lugar da história da música portuguesa e na história da cidade de Lisboa, assim como neste ano em que completaria 75 anos se estivesse vivo ganha um lugar na história das Festas de Lisboa.

Freguesia do Parque das Nações

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A Rua Luís Piçarra e Costah no Alto do Lumiar

No Alto do Lumiar, o MURO’19- Festival de Arte Urbana de Lisboa que ligou a arte mural  à música presente na toponímia da zona foi também o ponto de encontro do cantor Luís Piçarra que é ali nome de rua e do portuense Costah, com a sua intervenção artística Há Sempre Música Entre Nós, próximo de uma grande superfície comercial da Avenida David Mourão-Ferreira.

Natural do Porto, Nuno Costah realizou os seus primeiros murais ainda na década de noventa, cerca de 1997. Em 2003, iniciou-se na técnica das colagens e stencil’s na sua cidade natal e quatro anos depois, em 2007, começou a assinar como Costah, ano em que também se passou a dedicar à tatuagem. Costah criou um novo estilo,  ilustrativo e versátil, que tanto usa na arte mural como em outros suportes, do papel à tela e até à pele.

Das suas diversas participações em exposições e festivais destaquem-se na Rua das Flores na EDP/Porto Lazer, GoodVibes do Porto, Inky Street Art Gallery do Porto, Maia Performance, A Mimosa da Lapa em Lisboa, Smed da Trofa, a Street art AXA, Traços Urbanos na Póvoa de Varzim, ou na Calçada da Glória da Galeria de Arte Urbana- GAU.

O cantor Luís Piçarra, ainda hoje reconhecido por dar a sua voz ao Hino do Sport Lisboa e Benfica, tem desde a publicação do Edital municipal de 15 de dezembro de 2003 o seu nome gravado nas placas toponímicas do Lumiar, por sugestão da Casa do Artista. Este arruamento liga a Rua José Cardoso Pires à Rua Helena Vaz da Silva e significativamente foi inaugurado no Dia Mundial da Música de 2004, junto com mais 6 arruamentos próximos, com nomes de cantores, instrumentistas e maestros – Arminda Correia, Adriana de Vecchi, Tomás Del Negro, Nóbrega e Sousa, Shegundo Galarza e Belo Marques –, que em conjunto com a Alameda da Música permitiu criar um Bairro da Música no Alto do Lumiar através da toponímia.

luis-picarra

Luís Raul Janeiro Caeiro de Aguilar Barbosa Piçarra Valdeterazzo y Ribadenayra (Moura/23.06.1917 – 22.09.1999/Lisboa)  deixou gravadas 999 canções, tendo ele próprio escrito dezenas delas e a sua voz é reconhecida por todos na interpretação do segundo e atual hino do Sport Lisboa e Benfica –  intitulado Ser Benfiquista-, para além de ter sido ele o criador da famosa Granada, que lhe foi oferecida pelo compositor mexicano Agustin Lara.

Filho do produtor de vinho Luís da Costa de Aguilar Barbosa Piçarra e de Luísa Maria Caeiro, frequentou os dois primeiros anos de Arquitetura da Escola Superior de Belas Artes de Lisboa mas interrompeu o curso em 1937 para se dedicar a uma carreira musical. Estudou  canto com Fernando de Almeida e Hermínia de Alargim e estreou-se na ópera O Barbeiro de Sevilha levada a cena na Academia dos Amadores de Música de Lisboa. A partir daqui  fez uma carreira de sucesso, cantando pelo mundo inteiro, com espetáculos no Brasil, Argentina, México, Egito, Chipre, Líbano, Síria, Grécia, Turquia, Itália ou Paris. Refira-se especialmente que foi cantor privativo no palácio do rei Faruk (1947/48), parceiro de Edith Piaf numa série de programas do show This is Europe organizado pela ECA (agência encarregada de aplicar o Plano Marshall), tenor da Orquestra de Paul Durand e membro da digressão ao Brasil de A Rosa Cantadeira, com Amália Rodrigues. Na rádio e televisão francesas ficou conhecido como Lou Pizarra e aí estreou nos anos 50 do séc. XX temas como Avril au PortugalGranada ou Luna Lunera. Na década seguinte também gravou programas para diversas televisões incluindo a NBC norte–americana.

Em Portugal, Luís Piçarra distinguiu-se  como tenor oficial da Emissora Nacional, bem como interpretando ópera, opereta e teatro de revista. No cinema, também cantou pela primeira vez O Meu Alentejo no filme Pão Nosso (1940)  de Armando Miranda. Depois da morte da sua primeira esposa em 1968, Luís Piçarra escolheu viver em Angola até 1975, onde foi diretor do Centro de Preparação de Artistas da Rádio e professor de canto teatral na Academia de Música. Após o regresso a Portugal, publicou  em edição de autor Luís Piçarra instantâneos da minha vida (1987) e em 1996 foi lançada uma compilação de temas seus com GranadaAvril Au PortugalCanção do RibatejoCaminho ErradoAnda CáAninhasBatalhaGuitarra da MourariaMorena da RaiaSanta Maria dos MaresSer Benfiquista e  O Meu Alentejo.

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Maria do Carmo Torres e Glam unidas pelo Fado nas ruas do Lumiar

(Foto: © Bruno Cunha, 2019 |DPC |DMC |CML )

Maria do Carmo Torres e Catarina Glam,  são duas mulheres unidas pelo Fado e pelo  Festival de Arte Urbana de Lisboa, no Lumiar. Maria do Carmo Torres, voz fadista perpetuada em topónimo numa rua desta zona e Catarina Glam pela sua intervenção mural  centrada na figura de uma fadista.

Glam é o nome artístico de Catarina Monteiro, nascida em 1985, cuja paixão pelas cores e formas a fez enveredar desde o ano 2000 pelo graffiti e pintura de murais. Esta licenciada em Design de Comunicação  pela Faculdade de Belas Artes de Lisboa que já participou no MURO’16 também transitou, gradualmente, para a execução de  esculturas em papel e madeira, peças e personagens que desenvolveu para várias entidades e inúmeras exposições e festivais. A sua estética assenta na geometria e no seu interesse pela carpintaria criando assim criar personagens em sólidos geométricos, para além de trabalhar também a  reciclar materiais.

Da sua obra, destaquem- se os seus trabalhos em festivais como o MS Artville de Hamburgo e o Iminente Festival em Lisboa ( ambos em 2017), assim como desde 2015 no Walk&Talk dos Açores,  International From Waste To Art Exhibition de Baku, Ruelles de Lyon, Loures Arte Pública, Sm’arte Festival de Bragança,  UPFest de Bristol,  Tons de Primavera de Viseu, Trashplant Festival e Festival Boreal (ambos em Tenerife), Putrica de Freamunde, Super Bock Super Rock, Poesia na Rua  da Amadora, Festival Pitoresco de Vila Real e o Arte Pública de Leiria. Refiram-se também as suas exposições Silver Kings & Paper Toys (2014) e Glam Baby Show(er) (2016), em Lisboa, bem como a sua participação na Amarte no Mercado do Bairro Alto, Meeting Art [Point] nos Armazéns do Chiado, Garagem – Centro Difusor de Artes na Cervejaria Ramiro, The Exhibitionists na Funarte Gallery, Merc’Art no Timeout Market e no Lx Factory, ou Super Bock Coruja no Timeout Market, para além de fora de Lisboa ter marcado presença na Lá Vai Ela de Mala Posta no Centro Cultural Malaposta, na Movie Posters da Incrível Almadense, na Marias dos Tamancos  de Estarreja, na 100 Dollar Bills Y’all na Circus Gallery do Porto ou na Mar Motto em Sesimbra.

Maria do Carmo Alves Torres foi uma cantadeira de fado nascida na piscatória vila algarvia da Fuzeta (Olhão), no dia 8 de janeiro de um dos primeiros anos do século XX,  que ainda em bebé foi morar para Setúbal e seguiu o percurso de trabalhar numa fábrica de conservas de peixe. Em paralelo, fazia teatro amador e foi assim que aos 19 anos ( supõe-se que seja à roda de 1926) se estreou como intérprete  do garoto das filhoses numa revista de amadores levada à cena no Salão Recreio do Povo, em Setúbal, de onde seguiu para outra revista no Casino de Setúbal, onde imitou o conhecido pescador António Gouga, tendo sido obrigada pelos aplausos a cantar 7 vezes seguidas e daí passou para uma revista no Casino Estoril.

Após o suicídio do seu filho de 16 anos a castiça intérprete acabou por fixar-se em Lisboa, no 2º andar do n.º 119 da Travessa dos Fiéis de Deus. Teve depois uma filha a que chamou Maria Carolina. Na capital, trabalhava como empregada de balcão no Café-Restaurante Sul-América e um dia em que acabou por substituir a cantadeira Maria Virgínia, o diretor Mendes Leal e Alfredo Madeira proporcionaram-lhe a aquisição do carteira profissional e a partir daí, cantou o fado nas esperas de touros do Campo Pequeno, nos teatros e salões de festas dos cinemas, em festas de caridade e nas particulares como as da Condessa de Ficalho, bem como até na então denominada Emissora Nacional. Do seu reportório foram sucessos O SonhoMaria da Graça,  Não Me PersigasMaria da EsperançaCarta em Verso, Fado da Amora, Os beijos são como as rosas e O Que é de Mais Faz Mal, sendo Adriano Reis o seu letrista favorito. A partir de 1934, integrou a Embaixada do Fado, organizada por Maria do Carmo Alta e dirigida por Alberto Reis, que se exibiu no Porto e fez uma digressão pelo Brasil, Argentina e Uruguai, incluindo o guitarrista ArmandinhoBerta Cardoso, Branca Saldanha, Lina Duval, Filipe Pinto, Joaquim Pimentel e Eugénio Salvador, entre outros.

Cantou nas diversas casas especializadas de fado lisboetas como o Retiro da Severa (Rua António Maria Cardoso, n.º 5), o Solar da Alegria (Praça da Alegria, n.º 56, num prédio já desaparecido), o Café Luso (no n.º 27 da Avenida da Liberdade, de onde passou em 01/11/1939 para o n.º 131 da mesma Avenida e ainda mais tarde, para a Travessa da Queimada, n.º 8), o Café Mondego (Rua da Barroca, 124), o Retiro dos Marialvas (Rua da Barroca, 122 a 126), a Adega da Lucília (Rua da Barroca, 54) antes de se chamar O Faia e o Solar do Marceneiro (ao fundo da Calçada de Carriche).

No final de 1944 apadrinhou a estreia artística de Deolinda Rodrigues e cerca de 7 anos depois,  após 1951, de acordo com o estudioso Eduardo Sucena retirou-se do fado, para casa de uma irmã e faleceu nessa mesma década em Leça do Bailio.

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Maria Alice e Third no Festival de Arte Urbana de Lisboa – MURO’19

(Foto: © Bruno Cunha, 2019 |DPC |DMC |CML )

A Rua Maria Alice tem ao longo de sete prédios, a intervenção de Third no MURO’19 – Festival de Arte Urbana de Lisboa, para narrar em pintura a história de Glória Mendes Leal de Carvalho, a fadista Maria Alice e a primeira a gravar um disco em Portugal, que desde o ano 2000 está perpetuada como topónimo da Freguesia do Lumiar.

Já o artista Third  é Nuno Príncipe Palhas, nascido em Vila Nova de Gaia em 1979, e que cedo revelou uma paixão pela cultura hip hop e a partir de 1996 se dedicou à pintura mural, a par do seu trabalho de designer têxtil para uma marca de streetwear. Expressa-se hoje através da arte urbana e da ilustração, com um estilo reconhecível pelo seu realismo, quer na forte presença dos retratos, como por exemplo a sua Carmen Miranda, quer nas estruturas tridimensionais que cria num hábil jogo de luz e sombra, sejam criaturas fantásticas ou robóticas.

De forma resumida, destaque-se que pintou obras em Águeda com o Colectivo Rua, um dragão para o Estádio do Dragão, participou no Festival de Arte Mural de Cascais, Festival de Murals i Art Rural a Penelles ( Catalunha -Espanha), Festival Sebastianas de Paços de Ferreira, o Míscaros – Festival do Cogumelo (Alcaide – Fundão), o mural inspirado na poesia de José Régio para a GAU na Calçada da Glória (em 2015),  para o Parque do Corgo (Vila Real) ou o Tons da Primavera de Viseu. Ainda recentemente expôs na 60-62 Art Gallery do Porto e ainda este ano vai participar na Exposição CAIS Urbana.

Maria Alice foi o nome artístico de Glória Mendes Leal de Carvalho (Figueira da Foz/01.09.1904 – 13.02.1996/Lisboa), a cantora de voz fina, maviosa e castiça  que foi muito popular na década de 30 do século XX  a ponto de ter gravados vários discos na editora Valentim de Carvalho. Foi também a segunda mulher do editor Valentim de Carvalho que aliás foi quem lhe escolheu o nome artístico, fazendo uso do nome da sua primeira mulher.

Desde os 3 anos de idade que Glória residia em Lisboa e em 1928 estreou-se numa Festa do Fado da Velha Guarda, no retiro Ferro de Engomar, na Estrada de Benfica. Continuou a cantar em Lisboa, em retiros, festas de beneficência, esperas de toiros, bem como integrou duas digressões ao Brasil. Os seus maiores sucessos foram Fado TristePerseguiçãoCrueldadeFado da TraiçãoFado da PerdidaFado-TangoA Voz do PovoA Minha SinaHumildadeVida Triste ou Esse Olhar Dá-me Tristeza. Retirou-se da carreira artística após o seu casamento com Valentim de Carvalho, nos anos quarenta do século XX.

Esta Rua Maria Alice,  que liga a Rua Maria do Carmo Torres à Avenida David Mourão Ferreira, nasceu do Edital municipal de 5 de julho de 2000, ao mesmo tempo que a Rua Maria José da Guia e a Rua Maria do Carmo Torres no Bairro da Cruz Vermelha. Este bairro conhecido popularmente como Bairro das Marias, recebeu mais estes três topónimos marianos, todos de fadistas, todos por sugestão de Appio Sottomayor enquanto membro da Comissão Municipal de Toponímia de Lisboa. Aliás, a designação popular do Bairro resultava da sua toponímia comportar apenas Marias, fosse através dos nomes próprios das senhoras da Secção Auxiliar Feminina da Cruz Vermelha – de cuja iniciativa foram angariados os fundos que permitiram a construção do Bairro Municipal da Cruz Vermelha-, fosse de jogos de nomes como a Rua das Duas Marias, a Rua das Três Marias, a Rua das Quatro Marias, a Rua das Cinco Marias e o Largo das Seis Marias. Na década de oitenta do séc. XX, foi também atribuída no local a Rua Maria Albertina.

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A Rua Maria José da Guia, Tamara Alves e Ozearv no MURO’19

A 3ª edição do Festival de Arte Urbana de Lisboa, o MURO’19, na proximidade da Rua Maria José da Guia, junta Tamara Alves e Ozearv numa intervenção artística conjunta no muro do estacionamento, ligando assim a arte urbana à música presente na toponímia local. Tamara Alves & Ozearv realizarão também um workshop no local.

Tamara Alves, nascida em 1983 é uma artista multifacetada que se exprime da pintura à  ilustração, das tatuagens à arte mural urbana, com o denominador comum de uma visão erótica de um corpo contemporâneo com limites expandidos: sem órgãos, uma paixão bruta, um devir animal. Desde o ano 2000 que participa em diversos projetos, exposições individuais e coletivas, afirmando-se como uma das mulheres mais conhecidas da arte urbana.

José Carvalho, nascido em 1980, é o nome civil do artista Ozearv, licenciado em Artes Plásticas pela Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha. Desde 1996 que tem integrado diversos projetos individuais e coletivos, políticos e humanitários, como membro da primeira geração de artistas de arte urbana portugueses. O seu trabalho para a arte mural procura o espaço, o movimento e a cor das cidades e os seus contrastes, através de técnicas que vão do aerosol ao stencil, da ilustração à fotografia, para «preencher o branco que existe no dia-a-dia de cada um de nós». Já em 2017, na 2ª edição do MURO, integrou o «Incursões pela Arte» em que pintou com os alunos da Escola Básica de Marvila.

A Rua Maria José da Guia,  que liga a Rua Pedro Queirós Pereira à Rua Maria Carlota, nasceu do Edital municipal de 5 de julho de 2000, junto com a Rua Maria Alice e a Rua Maria do Carmo Torres no Bairro da Cruz Vermelha. Este bairro conhecido popularmente como Bairro das Marias, recebeu mais estes três topónimos marianos, todos de fadistas, todos por sugestão de Appio Sottomayor enquanto membro da Comissão Municipal de Toponímia de Lisboa.

Maria José da Guia

Maria José dos Santos Guia de Freitas (Angola/16.10. 1929 – 02.09.1992/Espanha) que usou o nome artístico de Maria José da Guia, ficou famosa no Fado na década de quarenta do século XX. Aos quatros anos foi morar para Alfama e aí começou a cantar, tendo  até sido mascote da Marcha de Alfama. A sua carteira profissional data de 1944 e a sua voz sustentava-se num corpo vestido de negro e xaile traçado.

Maria José da Guia cantou em várias casas de fado do Bairro Alto e de Alfama, tendo integrado os elencos do Café Luso, do Retiro da Severa, do Faia ou da Adega Machado. Celebrizou fados como Lisboa Antiga – com letra de José Galhardo e música de Raúl Ferrão -, Casa Portuguesa ( letra de Gustavo de Matos Sequeira e Reinaldo Ferreira com música de Artur Fonseca), Grão de Arroz ( letra e música de Belo Marques), Sempre que Lisboa Canta ( letra de Aníbal Nazaré e música de Carlos Rocha), Bairro Divino (letra e música de Álvaro Duarte Simões), Ciúme duma Verdade (letra de Fernando Peres e música de Jaime Santos, Victor Ramos e Santos Moreira),  Fado da Minha Saudade ( letra de Fernando Peres e música de Francisco José Marques), Um Golpe de Vento (letra de Linhares Barbosa e música de Nuno Meireles) ou o fado Severa ou a Marcha dos Centenários (letra de Norberto de Araújo e música de Raúl Ferrão).

No Fado, Maria José da Guia foi madrinha artística de Ada de Castro mas também passou pela rádio e televisão, assim como participou em várias revistas dos Teatros Maria Vitória, Variedades e ABC, no Parque Mayer, para além de ter cantado no filme O Homem do Dia (1958) de Henrique Campos. Na vida pessoal, Maria José da Guia casou com Amadeu José de Freitas, profissional do relato desportivo nos jornais, na rádio e na televisão, com quem teve dois filhos.

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NBC e Adriana de Vecchi: dois músicos no MURO’19

(Foto: ©NBC- Natural Blake Colour)

De origem são-tomense e italiana, NBC e Adriana de Vecchi são dois músicos presentes – pela música e pela toponímia – no MURO’19- Festival de Arte Urbana, que de 23 a 26 de maio vai decorrer na Freguesia do Lumiar.

NBC é o nome artístico de Timóteo Deus Santos, natural de São Tomé e Príncipe onde nasceu em 17 outubro de 1974, que já conta com 20 anos de carreira e que no Festival da Canção 2019 vimos a defender Igual a Ti.

Este cantor e escritor de canções veio com a família para Portugal em 1980 – tendo residido em Enxará dos Cavaleiros, Sobral de Monte Agraço e Torres Vedras – e aqui desenvolveu a sua carreira como um dos fundadores do hip-hop português nos anos 90, tendo com o seu irmão BlackMastah criado Filhos de um Deus Menor para o Oeiras Rap 94 da Antena 3 enquanto como NBC  tornou possíveis os já clássicos «Especial» com Regula ou «Chelas» com Sam The Kid.

Conhecido pela sua garra em palco e com influências do groove, do funk, do rock,  soul e blues, a discografia de NBC  soma os álbuns Afro-Dísiaco (2003), Maturidade (2008), o EP  Epidemia (2013) e Toda a Gente Pode Ser Tudo (2017), que foi eleito pela Antena 3 como um dos discos desse ano. Nas duas décadas da sua carreira assinou ainda colaborações com New Max, Orelha Negra, Dealema,, Mundo Segundo, Bob da Rage Sense, Sir Scratch, Grognation, Time for T., Zimun, Dino d’Santiago, DJ Ride ou Gatupreto. Esteve com os GNR no Rock in Rio Lisboa’ 2006 e em 2014 no Meo Out Jazz, Super Bock Super Rock, Meo Sudoeste e no Vodafone Mexefest. Também participou no filme Fados de Carlos Saura e no Do Desassossego.

A origem do nome NBC deriva do rei bíblico de Israel, Nabucodonosor, mas que posteriormente foi assumido como Natural Black Color.

adriana-de-vecchiJá Adriana de Vecchi (Viana do Castelo/14.09.1896 – 1995), nasceu em Portugal filha de mãe italiana e de pai português e foi educada em Itália a partir dos 2 anos, tendo estudado piano e violoncelo no Conservatório de Turim, para além de ter concluído o curso de Pedagogia pelo método da educadora Maria Montessori.

A Rua Adriana de Vecchi, que liga a Rua Shegundo Galarza à Rua Ferrer Trindade,  foi atribuída por Edital Municipal de 15/12/2003, o mesmo Edital que na mesma zona atribuiu mais 6 topónimos ligados à música –  Rua Luís Piçarra, Rua Nóbrega e Sousa, Rua Belo Marques, Rua Shegundo Galarza, Rua Tomás Del Negro e Rua Arminda Correia –, tendo todos estes arruamentos mais a Alameda da Música tido uma cerimónia de inauguração no dia 1 de Outubro de 2004,  formando um Bairro da Música nesta zona da cidade.

Violoncelista como o seu marido Fernando Costa, que conheceu em Lisboa, criou a Fundação Musical Amigos das Crianças,  em 29 de junho de 1953, com o apoio de Sofia Abecassis, que disponibilizou salas da sua residência no nº 97 da Rua Saraiva de Carvalho para o efeito, depois de ouvir a conferência de Adriana «O Ensino da Música na infância e a sua projecção no futuro», no Museu João de Deus, em 15 de junho desse ano. A escola começou com aulas de violoncelo dadas por Adriana de Vecchi, aulas de piano por Abreu Mota, aulas de violino por Lamy Reis e aulas de Canto Coral por Jaime Silva. Adriana criou ainda material didático para ensino de música a crianças em idade pré-escolar pelo que esta escola desempenhou um papel pioneiro em Portugal no ensino da música desde a infância. Também foi a partir dela que se gerou a Orquestra Juvenil de Instrumentos de Arco da FMAC, dirigida por Fernando Costa, da qual saíram na década de 60 os primeiros jovens para os quadros da Orquestra Sinfónica da Emissora Nacional, enquanto outros alunos integraram a Orquestra Gulbenkian e a Orquestra Sinfónica Portuguesa.

A Fundação criada por Adriana de Vecchi designa-se hoje Academia Musical dos Amigos das Crianças e tem sede no 1.º andar do n.º 19 da Rua Dom Luís I, tendo já editado três discos – Canções Tradicionais PortuguesasCantar o Natal e Clássicos Madeirenses –, assim como publicado a partitura do Quarteto em Lá menor de Fernando Costa e um livro sobre a Nova Técnica de Contrabaixo, de Álvaro Silva.

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Surma de Leiria e Arminda Correia de Lagos no MURO’19

MURO’19, que vai decorrer de 23 a 26 de maio no Lumiar, está subordinado ao tema da Música, tal como a toponímia local, criando nesta 3ª edição do Festival de Arte Urbana de Lisboa também uma dimensão sonora mas preservando o contexto de  experimentação e inovação, que assim permitem coexistirem no espaço do mesmo Festival a cantora lírica do Bairro da Música, Arminda Correia, natural de Lagos, com a representante de música alternativa Surma, natural de Leiria.

De Leiria para o mundo, surge a filha de Maria Umbelino e Pedro Umbelino, nascida em 26 de dezembro de 1994, Débora Umbelino, que é o nome do registo civil da artista Surma que ainda este ano vimos defender Pugna no Festival da Canção. Usa as teclas, os samplers, as cordas, loop stations e o instrumento da sua voz através de uma fonética sem palavras que ela denomina «surmês», criando sonoridades que fogem do jazz para o post-rock, da electrónica para o noise, em atmosferas experimentais que já atraíram público em palcos holandeses, norte-americanos, italianos ou islandeses.

A singular Surma começou em 2015 e com a  editora de Leiria Omnichord Records estreou-se com  o single  Maasai, em 2016, para no ano seguinte ser a vez do álbum Antwerpen (lançado em 13/10/2017), nomeado para melhor disco europeu do ano e cujo single de apresentação do álbum – Hemma -, foi nomeado para melhor canção nacional nos prémios da Sociedade Portuguesa de Autores em 2017. O seu nome artístico é o de uma tribo da Etiópia e resultou da preferência desta One Woman Band por documentários.

De outra localidade portuguesa, de Lagos, veio Arminda Nunes Correia (Lagos/26.12.1903 – 21.09.1988/Lisboa), para Lisboa para concluir os cursos de Canto e Piano no Conservatório Nacional. A partir daí distinguiu-se na interpretação de «lieder» alemães e ficou perpetuada na Rua A da Malha 3 do Alto do Lumiar pelo Edital municipal de 15/12/2003 e oficialmente inaugurada no Dia Mundial da Música de 2004, junto com mais outros  7 arruamentos com nomes de cantores, instrumentistas e maestros – Luís Piçarra, Adriana de Vecchi, Tomás Del Negro, Nóbrega e Sousa, Shegundo Galarza e Belo Marques – e uma Alameda da Música, criando assim pela primeira vez na cidade de Lisboa um Bairro com topónimos dedicados à Música.

Arminda Correia estreou-se como cantora lírica em 1927, no palco do São Carlos, na estreia absoluta de três óperas de Rui Coelho. Foi uma notável intérprete de autores portugueses, muito valorizada pelos seus dotes de dicção e raro timbre de voz, tanto  na interpretação de «lieder» alemães e franceses como em canções tradicionais portuguesas, harmonizadas por Francisco de Lacerda ou Fernando Lopes Graça. Foi galardoada com  o prémio Luísa Todi (1943) e, em 1959, gravou no Reino Unido Canções Populares Portuguesas acompanhadas ao piano por Fernando Lopes Graça. Na  sua carreira de cantora merecem ainda destaque a sua interpretação de  Beatitudes de César Franck, de Crisfal (em português) no Teatro D. Maria II, da Paixão Segundo São Mateus de Bach no São Carlos, a gravação que executou de canções portuguesas a convite do Musée de la parole et du geste, os inúmeros recitais para a Emissora Nacional – com canções tradicionais portuguesas recolhidas por Francisco Lacerda  – nos anos 40 do século XX e concertos um pouco por todo o país.

A esta carreira lírica Arminda Correia somou ainda 14 anos de professora de solfejo e de canto, em quatro locais: Instituto de Música de Coimbra, Liceu Feminino de Coimbra, Academia de Amadores de Música e Conservatório Nacional.

(Foto: © Hugo Domingues)

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Tó Trips e Tomás del Negro no MURO’19

Tó Trips
(Foto: © Mónica de Sousa, 2018)

Tó Trips e Tomás del Negro, o autor do álbum Guitarra Makaka e o divulgador de música em concertos públicos na Lisboa da passagem do séc. XIX para o XX, encontram-se este ano no espaço do Festival de Arte Urbana de Lisboa que neste MURO’19 junta à vertente da arte urbana a sonoridade de música inspirada pela toponímia do local.

Tó Trips do imaginário alternativo musical nacional é convidado do MURO’19 que decorrerá de 23 a 26 de maio. Já como cidadão António Manuel Antunes foi estudante do Liceu Dom Pedro V e da Escola de Artes António Arroio e nesse percurso gerou os Amen Sacristi – que estiveram em dois concursos de música moderna no Rock Rendez Vous -, os Santa Maria Gasolina em Teu Ventre! e os Lulu Blind com Jorge Ferraz. Oficialmente desde 2003, partilha com Pedro Gonçalves os Dead Combo, banda nascida a partir de um convite de Henrique Amaro da Antena 3 para gravarem um tema de homenagem a Carlos Paredes. A discografia a solo de Tó Trips soma Guitarra 66 (2010) e Guitarra Makaka: Danças A Um Deus Desconhecido (2015).

 

Tomás Del Negro, foi um solista de trompa e compositor que se distinguiu na passagem do séc. XIX para o XX através de concertos públicos que promoveu em Lisboa para divulgar música. Desde a publicação do Edital  municipal de 15 de dezembro de 2003 é um topónimo do Lumiar.  Sugerido pela  Comissão para a Comemoração do 150º Aniversário do Maestro Tomás Del Negro este topónimo teve inauguração oficial no Dia Mundial da Música de 2004, em conjunto com outros 7 topónimos da mesma área temática: a Alameda da Música , a Rua Adriana de Vecchi, a Rua Arminda Correia, a Rua Belo Marques, a Rua Nóbrega e Sousa e a Rua Shegundo Galarza.

Joaquim Thomaz del Negro (Lisboa/05.06.1850 – 12.02.1933/Lisboa), oriundo de uma família italiana que cultivava a arte musical e estava estabelecida no alto comércio de Lisboa desde finais do séc. XVIII, nasceu na então freguesia de Santos-O-Velho e foi batizado  na Igreja  de Nossa Senhora do Loreto, vulgarmente conhecida como Igreja dos Italianos. Del Negro foi solista de trompa do Teatro Real de São Carlos (até 1878 e depois de 1890) e na Capela e Teatro Real de Madrid (de 1879 a 1889), compositor de música sacra, de câmara, para piano, para trompa, para banda filarmónica, empresário teatral e musical e ainda, o promotor de concertos públicos de música sinfónica e de câmara, em que deu a conhecer pela primeira vez ao público de Lisboa obras de grandes compositores como Beethoven, Haydn, Mendelssohn, Wagner, Weber, Glimka e Saint-Saens, divulgação essa que reforçou com artigos de divulgação musical em jornais da especialidade.

Del Negro foi também dirigente da Associação Música 24 de Junho, fundada por Santos Pinto, professor de trompa no Conservatório Nacional de Música de Lisboa durante 27 anos, diretor musical e coproprietário de O Álbum-Jornal de Música para Piano (1869-1871), diretor musical de O Mundo Artístico – Gazeta Musical de Lisboa (1883) e colaborador e crítico musical de inúmeros jornais e revistas como a Perfis artísticos, sob o pseudónimo de Ruy Blas. Acrescente-se a sua função de empresário e diretor musical dos Teatros D. Afonso,  Carlos Alberto, Real de S. João e Príncipe Real, todos no  Porto, bem como do Teatro da Trindade, em Lisboa.

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A Rua do cantor lírico Dom Francisco de Sousa Coutinho ou Chico Redondo

Freguesia de Alvalade
(Foto: Google Maps editada pelo NT do DPC/ Planta: Sérgio Dias| NT do DPC) )

Por sugestão de Durval Pires de Lima, membro da Comissão Municipal de Toponímia  ficou o cantor lírico Dom Francisco de Paula de Sousa Coutinho, conhecido como Chico Redondo, inscrito na toponímia de Alvalade, junto à Rua Guilhermina Suggia, a partir da publicação do Edital municipal de 20 de outubro de 1955.

Na reunião da Comissão Municipal de Toponímia de 26 de fevereiro de 1951, conforme se pode ler na ata da reunião, «Para efeito da denominação de novos arruamentos no Bairro de Alvalade, o Excelentíssimo Senhor doutor [Durval] Pires de Lima, indicou os seguintes nomes, além dos irmãos Andrade e de Luísa Todi : Dom Francisco de Sousa Coutinho (Chico Redondo), filho do Conde de Redondo e Marquês Borba – barítono; José Rosa, que cantou muito em Itália e morreu em Milão, onde está sepultado – Tenor; Alfredo Gazul, medíocre tenor, e Maria de Arneiro, medíocre soprano.» Assim, o Edital camarário de 20 de outubro de 1955 tornou Dom Francisco de Sousa Coutinho o topónimo da Rua 56 do Sítio de Alvalade, ao mesmo tempo que nas  ruas em seu redor ficaram mais nomes ligados ao meio musical, como a violoncelista Guilhermina Suggia, os irmãos cantores líricos António e Francisco Andrade e ainda, o mestre de filarmónicas Rodrigues Cordeiro.

O alfacinha Francisco de Paula de Portugal de Sousa Coutinho (Lisboa/11.12.1867 – 14.08.1924/Lisboa), filho do 3º marquês de Borba, D. Fernando de Sousa Coutinho, foi um barítono que se estreou como cantor lírico no Teatro de S. João (do Porto) e cuja interpretação do Falstaff de Verdi assombrou inúmeras plateias, nacionais e estrangeiras.

Segundo o Eng.° Júlio Eduardo dos Santos ( na Olisipo, Set-Dez de 1970), era  «conhecido na vida boémia da sua cidade natal [Lisboa] por Chico Redondo, o que bem se adaptava à sua alta linhagem, dos Condes de Redondo e Marqueses de Borba, e igualmente à sua figura, pois pesava cento e vinte quilos ou talvez mais …».

A sua primeira apresentação em público registou-se numa récita de amadores, no Teatro de S. João do Porto quando este se chamava Teatro do Príncipe Real, em 1888, interpretando o papel de Valentim do Fausto e foi tal o sucesso que resolveu aperfeiçoar-se na arte do canto, para o que partiu para Milão, acompanhado de um Carlos Lopes que era primeiro baixo e seguindo o conselho do seu primeiro professor, o  tenor Alfredo Gazul. De Itália partiu para França, onde permaneceu alguns anos, a estudar no Conservatório parisiense.

Em 1896 assinou contrato com a Ópera de Berlim, onde se estreou em fevereiro de 1897, na ópera Os Palhaços , de Ruggero Leoncavallo e foi um sucesso, mesmo se o seu maior  êxito foi a interpretação do Falstaff, de Verdi. Sousa Coutinho foi particularmente acarinhado na Alemanha, bastas vezes referido como «célebre barítono da ópera de Berlim» e o professor G. F. Berlein modelou o seu busto na personagem de Sir John Falstaff. Deu também numerosos concertos na Alemanha, Holanda, Suécia, Dinamarca, Polónia, Estados Unidos da América  ( Washington e Nova Iorque) e Brasil.

Em 1899, o conhecido Chico Redondo era a principal figura da pequena companhia de ópera que se apresentou no antigo Teatro D. Amélia ( depois República e mais tarde, São Luiz), sendo nesse contexto que também se apresentou na ópera Palhaços e em um ato do Fausto que eram o reportório dessa companhia. Pouco tempo depois, cantou-se Palhaços no Coliseu dos Recreios, numa das companhias de ópera que habitualmente lá se exibiam e Francisco Sousa Coutinho foi substituir o barítono Carbonell no papel de Tonio.

Nos últimos anos da sua vida Francisco de Sousa Coutinho deu aulas de canto em Lisboa e manifestou uma enorme paixão por cozinhar.  Foi internado na Casa de Saúde do Telhal em 1923, onde veio a falecer no ano seguinte, ficando sepultado no jazigo de família nos Prazeres.

Embora tendo recusado o título de marquês de Valença, Dom Francisco de Sousa Coutinho aceitou ser agraciado com o hábito de Cristo pelo rei Dom Luís e está também presente na toponímia de São Domingos de Rana.

Capa da Ilustração Portuguesa de 10 de dezembro de 1906