O General Sem Medo na toponímia de Lisboa

Humberto Delgado que ganhou o epíteto de General Sem Medo, muito por no decorrer da sua candidatura presidencial em 1958, ter afirmado em relação a Salazar «Obviamente, demito-o!», está perpetuado desde 1979 na toponímia de Lisboa, primeiro como Praça General Humberto Delgado e desde o final de 1990, como Praça Marechal Humberto Delgado, considerando a sua promoção póstuma na carreira militar.

Logo após o 25 de Abril foram vários os pedidos para homenagear Humberto Delgado na toponímia de Lisboa, somando 8 sugestões antes da decisão definitiva. Um deles, analisado na reunião da Comissão Municipal de Toponímia de  20 dezembro de 1974, sugeria que o seu nome fosse  dado à Avenida Dom Carlos Primeiro. Essa mesma carta solicitava que a Rua Agostinho Lourenço passasse a Manuel Rodrigues da Silva,  a Avenida Sidónio Pais fosse a Avenida Doutor Afonso Costa, a Rua António Maria Cardoso tivesse antes o nome de José Dias Coelho  – escultor assassinado pela PIDE -, a Rua General Sinel de Cordes ficasse como Rua Alves Redol (o que sucedeu mesmo) , a Praça do Príncipe Real levasse antes o nome de Aquilino Ribeiro, a  Rua Quirino da Fonseca passasse a  Soeiro Pereira Gomes, a Rua de São Lázaro voltasse ao topónimo republicano de Rua Vinte de Abril, a Praça do Areeiro fosse antes Praça Presidente Salvador Allende e que o Largo de Santos ficasse como Largo Ribeiro Santos (tendo sido antes escolhida a Calçada para Calçada Ribeiro Santos).

A 5 de março de 1975, a Comissão Municipal de Toponímia analisou o pedido da Comissão Executiva de Lisboa de Homenagem ao General Humberto Delgado para que fosse consagrado na toponímia de Lisboa e  a Comissão deu parecer favorável, propondo mesmo que «ao arruamento designado por Rua A no plano de urbanização da Quinta dos Condes de Carnide – Unor 36 – seja atribuído o topónimo  Avenida General Humberto Delgado/1906 – 1965». Todavia, tal não se concretizou pelo que mais tarde, pelo Edital municipal de 23/02/1978, esse arruamento foi designado Avenida do Colégio Militar, curiosamente a instituição de que Humberto Delgado fora aluno. Pode supor-se que não se tenha considerado o arruamento condigno para o efeito, considerando que cerca de 4 meses depois, por cartas da Comissão Nacional de Homenagem ao General Humberto Delgado, bem como das Juntas de Freguesia do Alto do Pina, de São João e de Santa Engrácia, foi solicitado à edilidade lisboeta que o nome de Humberto Delgado fosse atribuído à Praça do Areeiro, a que a Comissão Municipal de Toponímia, de acordo com a Ata da reunião de 22 de julho de 1975, respondeu que «Conforme já foi esclarecido pelo presidente da Comissão, aguarde-se o parecer do M.F.A.»

Em 1976, já na vigência da segunda Comissão Municipal de Toponímia pós- 25 de Abril, a reunião de 15 de junho de 1976 esclarece que «A Comissão entende que, em princípio, servirá condignamente para o efeito, a actual Praça do Aeroporto, conhecida vulgarmente por Praceta do Relógio, até porque, tratando-se de uma figura da Aviação, o nome do General Humberto Delgado ficará bem homenageado nas imediações do aeroporto. Todavia, convirá que a decisão definitiva mereça o consenso da Comissão de Homenagem, pelo que deverá pedir-se a comparência de alguns membros desta, à próxima reunião da Comissão, que terá lugar em 29 do corrente mês, só após o que será emitido parecer definitivo.» No dia definido, compareceram 5 membros da Comissão Executiva da Homenagem Nacional ao General Humberto Delgado, a saber, Dr. Abranches Ferrão, Drª Alcina Bastos, Daniel Pires Lourenço, Dr. Duarte Vidal e José Moreira da Assunção. O vogal da Comissão Municipal de Toponímia José Augusto-França «pronunciou-se desfavoravelmente quanto à pretendida alteração do topónimo Praça do Areeiro, por considerar tratar-se de uma nomenclatura que designa um sítio de Lisboa bastante tradicional que nenhuma razão de ordem política justifica que seja alterada, pese embora a muita consideração que lhe merece a figura do falecido General Humberto Delgado». A Comissão Municipal de Toponímia apresentou também a sugestão da Comissão Administrativa do Concelho de Oeiras para que fosse usada para o efeito a Praça Dom Manuel Primeiro, situada em Algés, nos limites dos concelhos de Lisboa e Oeiras, assim como uma avenida situada no prolongamento da Avenida João Vinte e Um que partindo da Praça do Areeiro segue para Nascente – pelo Edital de 30 de dezembro desse ano passou a ser a Avenida Afonso Costa -,  e também a Praça do Chile. No entanto, a «Comissão Executiva da Homenagem recusou todas as sugestões apresentadas, alegando para tanto que o General Humberto Delgado, como percursor do Vinte e Cinco de Abril, bem merece que o seu nome seja consagrado numa praça do centro da cidade ou zona de grande densidade populacional, até porque se pretende que esse local possa vir a servir para comícios ou concentrações. Recordou, a propósito, que a Comissão Administrativa do concelho do Porto não teve relutância em dar o nome do General Delgado à antiga Praça do Município e que, seguindo sua opinião, nada impediria que a cidade de Lisboa procedesse de idêntico modo. Assim entendo, apresentarem como única alternativa aceitável, de preferência a Praça do Município, ou então, a Praça do Areeiro». A Comissão Municipal de Toponímia de Lisboa acabou por emitir, por unanimidade, parecer de que «Como tradicionais que são, nenhuma razão de ordem política justifica que se alterem os topónimos Praça do Município ou Praça do Areeiro. Como contrapartida, sugere-se que o nome do General Humberto Delgado seja atribuído, em primeira alternativa, à avenida que constitui prolongamento da Avenida João Vinte e Um [hoje Avenida Afonso Costa ] e que partindo da Praça do Areeiro segue para Nascente e, em segunda alternativa, ao Largo dos Caminhos de Ferro, situado em frente da Estação de Santa Apolónia, local que está historicamente ligado à campanha presidencial de 1958».

E assim, Humberto da Silva Delgado (Torres Novas – Brogueira/05.05.1906 – 13.02.1965/Villanueva del Fresno -Espanha), que foi assassinado por um comando da PIDE liderado por Rosa Casaco,  chegou à toponímia de Lisboa através do Edital municipal de Edital de 02/02/1979, como Praça General Humberto Delgado no antigo Largo de Sete Rios, nas freguesias de São Domingos de Benfica , Campolide e Avenidas Novas, após o parecer favorável do Estado-Maior General das Forças Armadas. Em 5 de outubro de 1990, sendo nomeado a título póstumo, Marechal da Força Aérea, e os seus restos mortais trasladados para o Panteão Nacional, foi depois também o topónimo foi alterado para Praça Marechal Humberto Delgado, através do Edital municipal de 13 de dezembro de 1990, tendo ainda a Câmara Municipal de Lisboa promovido uma cerimónia de inauguração das novas placas toponímicas em 18/01/1991, na qual usaram da palavra o vereador Anselmo Aníbal e Fernando Piteira Santos, em representação da Comissão Municipal de Toponímia.

Recentemente, em maio de 2016, Humberto Delgado que esteve ligado desde a primeira hora à criação do primeiro aeroporto civil em Portugal, foi ainda homenageado com a atribuição do seu nome a esse Aeroporto: o de Lisboa.